Na sessão solene do 51.º aniversário do 25 de Abril e dos 50 anos das primeiras eleições livres, para a Assembleia Constituinte, os discursos dos partidos ficam marcados por apelos ao voto e alertas sobre as ameaças à democracia. A sessão terminou às 12 horas. Depois do hino nacional ouviu-se "Grândola, Vila Morena".
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Teresa Morais pede “prioridade absoluta” à erradicação da violência doméstica
A vice-presidente da Assembleia da República do PSD, Teresa Morais, pediu “prioridade absoluta” à erradicação da violência doméstica e alertou para novos riscos para as democracias criados pelas redes sociais, num discurso aplaudido várias vezes pela esquerda.
Teresa Morais considerou que se a democracia está hoje consolidada, também é “ainda imperfeita”.
“E se há matéria em que a sua imperfeição se manifesta, é nas desigualdades várias que resistem na sociedade portuguesa, e em particular a que ainda mantém as mulheres em níveis inferiores de participação política e decisão económica, e de maior vulnerabilidade à violência doméstica, cuja erradicação deve ser considerada uma prioridade absoluta, que do que resto o Governo já assumiu”, afirmou, considerando-o mesmo “um objetivo civilizacional”.
Por outro lado, Teresa Morais alertou que a democracia deve ser cuidada e defendida “de riscos tradicionais e de novos perigos que podem minar o regime democrático”.
“Está à nossa frente um mundo ficcionado e enganoso, que relativiza o que é essencial e cria uma realidade alternativa. As redes sociais, com o potencial que têm de comunicação, estão a tornar-se um risco para as democracias, pelo veículo de manipulação do pensamento e da vontade em que estão a transformar-se”, avisou.
Sem qualquer referência às eleições antecipadas de 18 de maio, Teresa Morais defendeu que uma democracia madura, salvaguardando a liberdade de expressão, “não deve permitir que se divulguem e partilhem, impunemente, crimes que lesam direitos fundamentais, como a integridade física, a autodeterminação sexual ou mesmo a vida, sobrecarregando insuportavelmente a vítima com uma nova forma de agressão”.
Pedro Nuno: “Hoje o povo sai à rua enquanto o Governo fica à janela”
De cravo na lapela, Pedro Nuno Santos assumiu a responsabilidade de discursar pelo PS na sessão solene comemorativa do 25 de Abril, no parlamento, e começou por acusar o executivo de “desvalorização da data maior da democracia portuguesa”, afirmando: “hoje o povo sai à rua, enquanto o governo fica à janela”.
“51 anos depois, a democracia portuguesa vive um paradoxo entre uma maior exigência de transparência e um sentimento de desilusão”, sintetizou.
Na opinião do líder do PS, a democracia é “mais exigente do que alguma vez foi” e sujeita “os políticos a um maior escrutínio” do que em qualquer outro momento da história.
“Este imperativo democrático de maior transparência é incompatível com comportamentos de opacidade e de ocultação. Convive mal com condutas de dissimulação e de vitimização. E, sobretudo, torna insuportável a constante chantagem e infantilização dos portugueses”, criticou, numa referência implícita ao primeiro-ministro, Luís Montenegro.
Para Pedro Nuno Santos, está enganado quem acha que “os portugueses não ligam ou desconsideram a seriedade e a transparência de quem os governa”.
“Esta desilusão gera descrença num projeto democrático coletivo, e contribui para o crescimento de um individualismo exacerbado”, alertou.
Para Pedro Nuno Santos, “responder às promessas e aos desafios” deixados pela revolução de Abril é “saber como lidar com este sentimento de desilusão”.
A resposta, segundo o líder do PS, não está nas soluções “das diferentes direitas”, admitindo que os dois projetos da direita “são diferentes”, mas considerando que se “tocam e alimentam um ao outro”.
Chega diz que democracia transformou “corrupção fechada numa corrupção aberta”
O presidente do Chega, André Ventura, defendeu que, embora o Governo tenha prometido “combater a corrupção”, a perceção desse crime aumentou e que os portugueses não confiam nos seus governantes.
“Tornámo-nos um país em que os portugueses sabem e sentem que têm uma classe política corrupta ou corrompida, capaz de vender os seus interesses de decisão do país por interesses que são de terceiros. E era isto o que Abril deveria ter resolvido. Porque se é verdade, como dizia o deputado António Filipe, que foram anos e anos de corrupção, o que dizer dos 50 que lhes seguiram? Que a uma corrupção fechada transformou numa corrupção aberta”, atirou.
Ventura acrescentou que a uma “corrupção sem impunidade” seguiu-se uma “em que os condenados e os criminosos andam livremente pelo país a gozar com o dinheiro e a gozar com aquilo que fizeram”.
O líder do Chega começou o seu discurso por lembrar Celeste Caeiro, alegando que a mulher que distribuiu os cravos pelos militares “morreu abandonada na urgência de um hospital à espera de ser atendida”. Para Ventura, Celeste é um “exemplo das Celestes do país inteiro” que “morrem nas urgências”, enquanto “chegam a um posto dos correios e veem tudo a sacar subsídios menos eles e os seus filhos”.
O líder do Chega abordou ainda as críticas às forças de segurança para lembrar o assassinato de um jovem em Braga, acrescentando que, quando um caso como esse acontece, “ninguém mexe uma palha neste país para o defender”.
Sobre imigração, Ventura alegou que a chegada migrantes está relacionada com o aumento do número de mulheres violadas, assediadas ou de crimes contra crianças, prometendo combate a esse tipo de práticas.
Ventura lembrou também os retornados das antigas colónias, bem como os combatentes portugueses da guerra colonial, acrescentando que, enquanto o Chega estiver no parlamento, o país “nunca pagará um cêntimo de indemnização a nenhuma antiga colónia deste país”.
No fim, André Ventura citou Salgueiro Maia para dizer que o “25 de Abril não se celebra, o 25 de Abril cumpre-se”, afirmando que o Chega é que irá cumprir o propósito da revolução.
Mortágua critica Governo por adiar celebrações do “dia mais feliz”
“Hoje, dia 25 de Abril, celebramos os 51 anos da Revolução, porque a democracia tem de saber a data em que nasceu. Que o Governo de Portugal esteja disposto a adiar as comemorações do 25, é só a triste confirmação que nem o dia mais feliz consegue iluminar todo o futuro de um povo”, criticou a coordenadora do BE, Mariana Mortágua.
Agradeceu depois aos capitães de Abril, alguns sentados na tribuna: “Cumpriram a vossa missão, agora é a nossa vez. Este é o tempo que nos calhou viver”.
Na opinião da bloquista, “depois de quebrar promessas e devastar o legado de gerações, o capitalismo saiu da sua crise mostrando o que vale, rindo-se da desigualdade e dividindo povos”, gerando políticos como Donald Trump, Javier Milei, Georgia Meloni, Viktor Órban.
“Eles levantam a motosserra para dizer quem está primeiro e quem fica para trás, decidem as palavras que se gritam e as que são para apagar e escolhem que mortes são legítimas”, apontou.
Mortágua não esqueceu o conflito na Faixa de Gaza, afirmando que “o genocídio iniciado por Israel na Palestina” já matou mais 17 mil pessoas, e a “indiferença da Europa perante o crime a que assiste em direto prova que a política dos novos fascismos faz caminho”.
“Quando olhamos para gente como nós e não nos reconhecemos, não foram eles que perderam a humanidade, fomos nós. E é por isso que Gaza é a fronteira da humanidade”, sublinhou.
Mortágua deixou ainda uma questão: “De que serve adiar as comemorações do 25 de Abril se as palavras de Francisco são tão cinicamente ignoradas? As últimas que disse, denunciando o delírio da guerra, e especialmente as pronunciadas em Lisboa - 'todos, todos, todos'. Incluindo os sobreviventes da Palestina, as pessoas ciganas, as mulheres, os migrantes”.
IL considera que há valores de Abril por cumprir e pede mudança
O presidente da IL considerou que “parte do que Abril prometia, ainda está tão longe de se cumprir”, e defendeu que é necessária uma mudança nas próximas eleições para um “Portugal mais liberal".
“Chegámos a meio século de democracia e afinal, parte do que Abril prometia, ainda está tão longe de se cumprir”, afirmou Rui Rocha na sessão solene do 25 de Abril na Assembleia da República, em que pediu "um Portugal mais liberal".
O líder da IL disse que, 51 anos depois do 25 de Abril de 1974, existe hoje “liberdade política, de expressão, de imprensa, religiosa”.
“Avançámos muito nestes 50 anos. Mas também é verdade que ainda temos um longo caminho a percorrer”, referiu.
Rui Rocha elencou vários setores em que considerou haver atualmente problemas em Portugal, como a saúde, “onde há portugueses que podem escolher o seu médico” e outros que “não têm recursos para pagar do seu bolso a liberdade de escolher”.
Na habitação, prosseguiu, apesar de haver proclamações de que “é um bem essencial”, há “cada vez mais portugueses” a enfrentarem “a escassez criada por décadas de intervencionismo, burocracia, regulamentos infindáveis e carga fiscal injusta”.
O líder da IL criticou ainda que, na educação, seja a morada a determinar que escola pública podem frequentar os alunos e considerou que Portugal tem revelado “não ser para jovens”, com mais de 20% desempregados e muitos “com dificuldade em sair de casa dos pais”.
Depois destas críticas, Rui Rocha defendeu que “a mudança é urgente e necessária”.
PCP avisa que democracia está “sob ameaça” mas tem “força suficiente” para derrotar inimigos
O deputado do PCP António Filipe avisou que a democracia “está sob ameaça dos que tentam denegrir as suas conquistas”, mas manifestou-se convicto de que terá “força suficiente para derrotar os seus inimigos”.
António Filipe reconheceu que, “para muitos portugueses”, o momento atual pode ser de “desencanto, de deceção e de descrença”.
“Desencanto com o incumprimento de promessas feitas e com o defraudar de expectativas criadas. Deceção com uma ação governativa distante das promessas feitas e insensível às reais preocupações das pessoas. Descrença em relação a uma prática política que não contribui para a resolução dos problemas do povo e do país”, enumerou.
De cravo vermelho na lapela, António Filipe avisou que “a democracia está hoje sob a ameaça dos que tentam denegrir as suas conquistas”.
“Mas a luta de muitas décadas do povo português pela liberdade e a democracia, as transformações progressistas conquistadas na Revolução de Abril, a capacidade de luta já demonstrada em numerosas situações pelos trabalhadores e pelas populações em defesa dos seus direitos, e a vitalidade com que a afirmação dos valores de Abril se encontra presente nas novas gerações, são razões de confiança em que a democracia portuguesa tem força suficiente para derrotar os seus inimigos”, sustentou.
Para António Filipe, “está nas mãos do povo e na sua ação a realização dessa vida melhor que Abril iniciou” e que está “nos antípodas de uma direita retrógrada, obscurantista e profundamente reacionária”.
Livre afirma que a celebração “não se adia” e apela ao voto num “momento ameaçador”
A porta-voz do Livre Isabel Mendes Lopes rejeitou adiamentos da celebração da revolução do 25 de Abril de 1974 e apelou ao voto, considerando que o país vive um “momento ameaçador”.
“A celebração do 25 de Abril não se cancela, não se adia. A liberdade não se festeja com reservas, muito pelo contrario, festeja-se de forma plena juntos e juntas”, defendeu a também líder parlamentar do Livre.
“Nesta altura em que tanto à nossa volta parece tão ameaçador, é mesmo importante termos noção do momento que estamos a viver. O momento é mesmo ameaçador. A História mostra-nos como é tão fácil cair em ditadura, como é fácil quem quer usar o poder para si tomar conta do poder, mesmo quando os sinais estão todos lá”, alertou.
A líder do Livre salientou que “os sinais estão todos aí”, dentro e fora de Portugal, enumerando “o discurso de ódio, o atacar das instituições democráticas, o descrédito da política, o ataque a imprensa e aos jornalistas, a descrença da ciência, a promiscuidade entre poder político e homens com fortunas maiores do que muitos países”.
“Votem como se a nossa vida e liberdade dependessem disso, porque na verdade, dependem”, apelou.
CDS-PP pede que portugueses “não deixem estabilidade na mão das oposições”
O líder parlamentar do CDS-PP apelou hoje aos portugueses para “não deixarem a estabilidade nas mãos das oposições” nas legislativas e recordou o voto contra do partido à Constituição em 1976 como “um hino à liberdade”.
Paulo Núncio começou por evocar o Papa Francisco e o seu “testemunho luminoso”, passando depois ao entusiasmo dos portugueses com as primeiras eleições livres. “É bom lembrar que houve quem não quisesse que as eleições se realizassem; houve quem apelasse à abstenção e quem impedisse partidos políticos de concorrerem”, disse, considerando que ficou à vista nas urnas que “o povo queria uma democracia europeia e ocidental, e não queria uma tutela político-militar no regime democrático”.
O dirigente democrata-cristão salientou que “o CDS esteve em risco de não concorrer às eleições da Assembleia Constituinte”.
“Como são as terceiras eleições em quatro anos, há quem tema o regresso à instabilidade crónica da 1.ª República. A AD pede aos portugueses para não deixarem a estabilidade nas mãos das oposições que se entenderam para derrubar, mas não para construir”, afirmou.
PAN sublinha necessidade de renovar esperança na democracia
A porta-voz do PAN defendeu a necessidade de renovar a esperança na democracia nos 50 anos das primeiras eleições livres em Portugal e em véspera de legislativas antecipadas.
“Há 50 anos, o projeto democrático cimentou-se com as primeiras eleições livres. Neste ano em que somos chamados novamente às urnas, sabemos que os portugueses estão cansados da instabilidade política que tem deixado as suas vidas em suspenso”, disse Inês Sousa Real.
Num discurso na sessão solene comemorativa do 25 de Abril, no parlamento, a porta-voz do PAN sublinhou a necessidade de “renovar no espírito das pessoas a esperança na democracia”, impedindo que “desapareça da memória coletiva um tempo não assim tão distante em que vivemos em ditadura”.