Projeto CARE, da APAV, só tem financiamento até final do ano. Todos os meses, instituição apoia 29 novas vítimas, mas número é apenas a ponta do icebergue.
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O projeto CARE, da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV), apoiou, em seis anos, mais de 2100 crianças e jovens vítimas de violência sexual. Ajudou ainda 206 familiares e amigos das vítimas a superar situações traumáticas. Mas todo o projeto poderá terminar no final deste ano se a instituição não encontrar uma nova fonte de sustentação.
"O atual financiamento termina em dezembro e não vamos conseguir garantir o programa nos moldes atuais. Se não houver alternativa, teremos de reequacionar a dimensão da equipa e, com menos técnicos, haverá menos vítimas apoiadas", avisa a responsável do CARE, Carla Ferreira. "Temos a expetativa que este novo Governo seja sensível a esta questão fundamental", complementa.
Meninas são o alvo preferencial
O Programa CARE começou, em 2016, com quatro pólos e apenas com a contribuição monetária da Fundação Calouste Gulbenkian. Nos anos seguintes, passou a contar com fundos da Iniciativa Portugal e Inovação Social e cerca de 150 mil euros anuais para pagar os ordenados de mais de uma dezena de técnicos, deslocações e instalações de dez pólos espalhados pelo país.
Foi esta estrutura que apoiou, todos os meses, 29 novas vítimas. 80% delas eram do sexo feminino e 772 tinham entre 14 e 17 anos. Quase 60% foram crianças alvo de abusos sexuais e mais de 6% foram mesmo violadas.
Os dados da APAV mostram que mais de 55 das vítimas sinalizadas foram alvo de crimes de forma continuada. "Estes números não retratam a realidade, porque há muitas cifras negras. São apenas a ponta do iceberg", alerta Carla Ferreira.
Crimes em contexto familiar
O relatório da APAV mostra que 51% dos crimes foram cometidos em contexto familiar, por pais (17,5%), padrasto/madrasta (12%) tio/tia (5,8%) e também por avós (4,8%). E mesmo quando os os abusos sexuais acontecem fora da família, o autor do crime - que em mais de 90% dos casos é um homem - é uma pessoa conhecida da vítima.
Dos casos acompanhados pelos técnicos, apenas 75,7% foram denunciadas às autoridades policiais ou aos tribunais. Um número alcançado apenas com as denúncias (12,8%) da APAV.
"Todos os anos temos mais vítimas sinalizadas. Primeiro, porque há uma maior sensibilidade para perceber o que é a violência sexual e, depois, porque há mais denúncias. Os números deste balanço provam a pertinência deste projeto", refere Carla Ferreira. "Esta é uma luta que nunca acabará", finaliza a responsável pelo Projeto CARE.