Ordem da classe apela à participação da sociedade na discussão para o investimento previsto no Plano de Recuperação e Resiliência.
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"A arquitetura é a identidade de um país" e o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) - o maior pacote de estímulos alguma vez financiado pelo orçamento da União Europeia, num total de 1,8 biliões de euros, dos quais cerca de 50 mil milhões vêm para Portugal a fundo perdido - reconhece-o, uma vez que prevê que 60% do investimento necessita de arquitetos, sublinha, ao JN, Paula Santos, vice-presidente da Ordem dos Arquitetos (OA), que se tem batido por uma participação alargada da sociedade para esta discussão.
Logo na primeira versão do PRR, a OA notou a ausência da área da Cultura, do Património Arquitetónico e do Património Intelectual, contrapondo a introdução de uma componente que incentive a reconstrução do Património Arquitetónico reforçando a resiliência territorial, um "ativo da maior importância para o desenvolvimento económico, que assume particular importância no interior do país".
Também foi sugerido um programa de manutenção de edifícios no âmbito da reabilitação urbana, que permita "tornar o parque edificado mais resiliente", para combater a pobreza energética no país. A OA alertou ainda para a necessidade de "criar uma Plataforma Única Eletrónica que permita a tramitação dos processos referentes às operações urbanísticas, baseada em princípios iguais para todo o território nacional".
Paula Santos insiste na premissa que levou a lista encabeçada por Gonçalo Byrne a ganhar as últimas eleições na Ordem. "Precisamos de ter voz e precisamos de proximidade, para que sociedade seja mais participativa." Perseguindo esse objetivo, a OA foi dividida em sete secções regionais, incluindo as ilhas.
Outro das metas que quer cumprir é o da sustentabilidade da construção e do projeto, contribuindo para as metas das alterações climáticas e do pacto ecológico europeu que define normas de qualidade da construção e sustentabilidade. Para que tal seja possível, defende a arquiteta, "não pode continuar a vigorar a lei perpetuada pelo Estado nos concursos públicos, em que ganha aquele que tiver o projeto com o preço mais baixo". Um comportamento que, de resto, tem sido mimetizado pelos privados.
"A tabela de honorários de projeto (arquitetura e especialidades) deixou de ser aplicada, em 2008, com o Código dos Contratos Públicos. A contratação pelo preço mais baixo, possibilidade de contratação prevista no decreto-lei, não serve a qualidade do projeto e edificado, logo não serve o Estado e o setor público", assegura.
Menos que imobiliárias
Portugal é o segundo país do Mundo com mais arquitetos per capita, mas isso não é sinónimo de boa saúde, apesar de termos "dois Pritzker e uma arquitetura altamente reconhecida e qualificada", diz. "Se na Suíça um projeto vale entre 16 a 20% da obra, em Portugal o conjunto de arquitetos e especialistas ganha menos do que os 5% das imobiliárias."
Neste momento, existem três colégios: Gestão e Fiscalização de obra, Património e Urbanismo e várias comissões técnicas, entre as quais a Comissão Técnica de Habitação e a Comissão Técnica de Sustentabilidade, estas duas criadas já este ano.
Os municípios terão um papel fundamental nesta agilização, mas Paula Santos ressalva que as cidades do "Porto e Lisboa são realidades completamente distintas do resto do país". O facto de as obras terem um financiamento repentino obriga a que "haja uma discussão muito grande, porque se este dinheiro não for bem investido agora, o Estado estará a comprar um problema". Neste caso, os prazos previstos são também um problema, uma vez que, nota, "só um milagre poderá fazer com que tenhamos tudo pronto até 2026. E há muita pobreza em termos de alojamento, especialmente no interior do país".
Legislação
Edificações urbanas
Paula Santos considera que o regulamento geral das edificações urbanas (RGEU), originalmente datado de agosto de 1951, é obsoleto. "Tem sofrido inúmeras alterações, mas mantendo no essencial restrições e constrangimentos à construção que são já obsoletos, especialmente quando verificamos que todas as tipologias de construção têm que ser mais flexíveis para se adaptarem a circunstâncias diversificadas, como a pandemia, ou as novas formas de associação familiar e comunitária."
Arquitetura e Paisagem
A Política Nacional de Arquitetura e Paisagem (PNAP) necessita de dotação orçamental e de estrutura funcional para poder contribuir com ações e intervenções de caráter público. A Resolução de Conselho de Ministros n.º 45/2015 de 4 de julho aprovou a Política Nacional de Arquitetura e Paisagem, dando cumprimento aos compromissos internacionais assumidos por Portugal no quadro da valorização da arquitetura, da paisagem e do património cultural e visando promover a qualidade e o conhecimento do ambiente natural e construído como fator estratégico na promoção do bem-estar e da qualidade de vida dos cidadãos e da sua participação no espaço público.
A importância da qualidade da arquitetura e da paisagem para o desenvolvimento sustentável encontra-se reconhecida na Constituição.