Associação de vítimas de abuso na Igreja critica métodos de intimidação do grupo Vita
O porta-voz da associação Coração Silenciado, António Grosso, criticou hoje os métodos de "intimidação e intromissão" do grupo Vita no processo de averiguação às vítimas de abuso sexual por membros da igreja portuguesa.
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Em conferência de imprensa em frente à Assembleia da República, António Grosso criticou a opacidade do processo de averiguação dos crimes, as condições de "intimidação e intromissão" das entrevistas às vítimas e responsabilizou o Estado pela falta de acompanhamentos dos menores, criticando a existência de prescrição dos crimes de abuso sexual.
"O que é mais condenável é a revitimização; nós entrámos para essas entrevistas apenas com a roupa do corpo, era proibido levar telemóvel, era proibido levar papel e caneta, não tínhamos como tomar notas de nada do que dizíamos, enquanto eles tomavam nota de tudo", disse António Grosso, lamentando que várias pessoas tenham sido obrigadas a reviver os traumas do passado.
"Houve perguntas muito abusivas, sobretudo para as vítimas mulheres", disse, considerando que durante as entrevistas as pessoas foram "apertadas e espremidas para testar a verosimilhança" entre o que aconteceu e o que estava a ser contado na entrevista conduzida pela comissão da Igreja que está a avaliar os relatos das vítimas.
De janeiro a julho, criticou o porta-voz da associação, "houve um processo de revitimização por parte do grupo Vita e das comissões de instruções, sublinhe-se a palavra instrução, como se nós fôssemos os arguidos de um processo, enquanto os abusadores são deixados tranquilos, ao passo que nós somos chamados pela segunda e terceira e quarta vez a uma comissão que nos entrevistou durante duas, três, quatro, oito horas divididas por dois dias, para escalpelizar todos os detalhes da nossa vida".
Foto: Manuel de Almeida / Lusa
Para além da crítica à forma intrusiva como foram feitas as entrevistas, António Grosso criticou também que o Estado português mantenha, no ordenamento jurídico, a figura da prescrição para estes crimes.
"A Igreja, no seu regulamento de compensações financeiras, por nossa forte pressão, já abandonou a figura da prescrição, mas o trauma não prescreve e o sofrimento continua", salientou, considerando que o Estado devia seguir o exemplo.
"A lei diz que a partir de determinado momento, os abusadores podem ser inocentados, isto é um atentado, é uma provocação, é absurdo e ridículo porque quanto a vítima finalmente quebra o silêncio e vai acusar o abusador, o abusador já está abençoado pela lei, já prescreveu o seu crime, o que não faz sentido absolutamente nenhum", afirmou, lembrando que muitas vítimas demoram décadas até conseguirem falar sobre este tema.
O protesto desta tarde em Lisboa acontece um dia depois de a Conferência Episcopal Portuguesa ter anunciado que validou até ao momento 77 dos 84 pedidos de compensação financeira recebidos e que a comissão de fixação de compensações vai entrar em funcionamento ainda durante este mês de setembro.