A pensar nos idosos acamados, sem retaguarda familiar, isolados, sem transportes e até mesmo sem telemóvel ou capacidade de ler as mensagens para agendamento da vacinação, há dezenas de autarquias, juntas de freguesia e agrupamentos de centros de saúde a fazerem das tripas coração para que ninguém fique excluído do processo de imunização contra a covid-19.
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Ir buscar os idosos a casa para os levar até aos centros de vacinação - muitos deles em pavilhões, nos centros das cidades -, tem sido uma das medidas mais comuns adotadas por municípios do Norte ao Sul do país. Em alguns casos, são os próprios autarcas que estão a dar o corpo às balas, outros disponibilizam autocarros ou fazem acordos com empresas de táxi.
Há quem tenha criado "call centers" para fazer o agendamento da vacinação, mas também instituições e juntas de freguesia prontas para ir bater às portas de utentes que não têm meios de comunicação ou apresentam moradas já desatualizadas nos registos do centro de saúde. Desde que se iniciou o processo de vacinação para idosos com 80 ou mais anos e para pessoas acima dos 50 anos com doenças graves, o Ministério da Saúde diz que foram enviadas 4336 mensagens de agendamento, mas apenas metade das pessoas (2288) respondeu.
A Junta está na linha da frente a dar apoio à população
Texto: Ana Peixoto Fernandes
Arlindo Meira, 87 anos, ex-militar do Exército, viúvo, residente em São Romão de Neiva, Viana do Castelo, anda ansioso por causa da vacinação contra a covid-19. Com o processo já em marcha, desde a semana passada, no Centro de Vacinação de Viana do Castelo, o antigo primeiro-sargento ligou ao presidente de Junta, Manuel Salgueiro, para esclarecer quando poderá ser vacinado.
"Liguei para saber como é que vai ser. Tenho receio da covid-19 e tomo precauções, mas tomar a vacina talvez seja um alívio. Fica-se mais confortável", disse o militar, comentando: "Isto é uma guerra e, de todas as que passei, talvez seja a de que tenho mais medo".
Após o telefonema, o autarca visitou o freguês em casa para o tranquilizar e explicar que, caso necessite, a Junta faculta transporte numa carrinha de nove lugares para o Centro de Vacinação, instalado na Meadela. "Então, já foi contactado pelo médico? Ainda não? Há poucas vacinas sabe, mas já estão a começar a chamar as pessoas", disse-lhe Manuel Salgueiro, 64 anos, que já se habituou a dar a mão aos mais velhos.
População envelhecida
"A população é muito envelhecida, carece de apoio e a junta de freguesia está na linha da frente nesse sentido", afirma, comentando: "Sempre que é possível, vou a casa das pessoas para responder a qualquer pedido que me façam. Acho que para as juntas de freguesia, independentemente de termos de pavimentar caminhos e tapar buracos, a área social é muito importante".
A vacinação dos maiores de 80 anos e pessoas com mais de 50 com saúde débil, exige de novo a intervenção da autarquia. No concelho de Viana, todas as juntas foram convocadas para dar apoio na comunicação e no transporte. "As pessoas vão ser contactadas pelo médico de família e, caso não consiga, liga-nos e nós fazemos as diligências para as contactar. Ninguém ficará sem tomar a vacina por falta de transporte", adianta.
O casal António Barbosa e Amélia Salgueiro, de 85 e 83 anos, também contactou a autarquia. A mulher já sofreu um AVC e receia tanto a covid-19 como a vacina.
"Tenho medo. Vou à sorte. Há de ser o que Deus quiser, mas, pronto, nós sempre temos de morrer, porque andamos aqui de passagem. Ninguém fica cá", desabafa Amélia.
Call center na Lousã orienta pessoas para serem imunizadas
Texto: João Pedro Campos
Cecília e Anabela são duas funcionárias da Câmara Municipal da Lousã que estão escaladas para telefonar aos idosos do concelho que estão na lista para ser vacinados. Estão instaladas numa sala, devidamente assinalada como "call center", no Parque Municipal de Exposições da Lousã, onde está a decorrer a vacinação.
"São duas assistentes operacionais do município que são supervisionadas por um técnico superior", explica o chefe de gabinete do presidente da Câmara Municipal da Lousã, João Santos.
O trabalho das duas funcionárias é feito sobretudo nas primeiras horas da manhã dos dias de vacinação, entre as nove e as 11 horas. Confirmam os contactos que estão na base de dados, insistem em ligar para as pessoas, confirmam a sua ida ao local e verificam se precisam de transporte para se deslocarem até ao Parque Municipal de Exposições. "Temos viaturas da Câmara disponíveis para ir buscar as pessoas para o caso de elas necessitarem. Se não atenderem o telefone, aí sim, deslocamo-nos presencialmente a casa delas", completa João Santos, acrescentando que esta última fase é feita em articulação com as juntas de freguesia e outros parceiros da Rede Social do concelho.
Vacinação a bom ritmo
Para já, o sistema colocado em prática pela Câmara Municipal da Lousã tem funcionado sem grandes sobressaltos. Nesta fase, de vacinação das pessoas com mais de 80 anos ou com mais de 50 com doenças associadas, já foram vacinadas 360 pessoas no concelho, de entre cerca de 1300 pessoas nesta situação que irão ser inoculadas até ao final do processo. "O avançar deste número está dependente das vacinas que vierem. Temos o sistema todo montado para a vacinação, assim que elas cheguem, vamos tratando da inoculação das pessoas", descreve João Santos.
Para além dos idosos, foram já vacinados no concelho 47 bombeiros, sendo que, esta semana, será a vez da GNR, em que também serão perto de 50 elementos.
O call center serve como um complemento às outras formas de avisar os utentes relativamente ao dia em que devem tomar a vacina. Entende a autarquia que, em pessoas dessas idades, o aviso por mensagens telefónicas (SMS) poderia não ser o mais eficaz.