Cerca de quatro dezenas de investigadores precários concentraram-se, esta terça-feira, em frente à Assembleia da República, numa manifestação contra a precariedade na ciência e exgindo um maior financiamento por parte do Governo.
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O protesto decorreu enquanto, na Comissão Parlamentar de Educação e Ciência, a ministra da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Elvira Fortunato, era ouvida pelos deputados sobre a precariedade da ciência no Ensino Superior e sobre a situação do setor.
De acordo com um documento distribuído na manifestação, os investigadores pedem que seja garantida a manutenção do financiamento para o emprego científico de doutorados (Lei 57/2017 e Programa de Estímulo ao Emprego Científico) que ao abrigo de uma “norma transitória” permitiu contratar 5799 doutorados para o exercício de atividades de investigação cientifica e 1046 em contratos de bolsas pós-doutorais. Os investigadores garantem que 90% destes contratos terminarão nos próximos 3 anos e pedem que o Governo mantenha o financiamento para o emprego de doutorados
Ana Lourenço e Carla Pimentel, duas investigadoras do Centro de Estudos Florestais, em Lisboa, fazem parte dos doutorados que conseguiram um contrato através da dita “norma transitória” e dizem que “ao fim de décadas a trabalhar e anos a estudar", não têm certezas sobre o seu futuro "quando os contratos acabarem”.
Os participantes na concentração pedem também que seja garantido o permanente financiamento para a contratação para a carreira de investigação cientifica, a revogação do Estatuto de Bolseiro de Investigação - que em vez de bolsas tenham contratos de trabalho -, a contratação efetiva de trabalhadores que, apesar de exercerem funções de caráter permanente, trabalham com contratos a prazo, bolsas, ou recibos verdes, e a contratação efetiva de docentes convidados.
Luís Alvez, 65 anos, é investigador há 36 anos e espera reformar-se em 2024, mas juntou-se à concentração porque acredita que a sua geração “está a sair e não há passagem de testemunho se toda a gente for embora”. Garante que a precariedade do setor não é apelativa para novos investigadores.
Os manifestantes criticam o baixo financiamento crónico das Instituições de Ensino Superior e Ciências, afirmando no documento que “as transferências orçamentais são insuficientes para garantir condições de trabalho adequadas (…) e fazer face à gestão corrente destas instituições", defendendo um aumento das transferências do Orçamento de Estado.
A última de sete exigências é a gestão democrática das instituições, “possibilitando a construção de uma academia de ensino e de formação humanística e onde a reflexão crítica desempenhe um papel central”, diz o manifesto onde se lê que “a aplicação do Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior (RJIES) desresponsabilizou o Estado, proporcionou uma centralização excessiva da gestão e governança institucional (…). Estas alterações promoveram uma instrumentalização do ensino e da produção do conhecimento”.
Segundo Susana Santos, membro do Sindicato Nacional do Ensino Superior (SNESUP), a luta contra a precariedade no setor da investigação científica remonta ao tempo do ex-ministro de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Mariano Gago, que instituiu o que é agora a Fundação para a Ciência e Tecnologia, "quando se percebeu que Portugal era dos países europeus com menor número de doutorados e muita fragilidade ao nível da investigação, com bolsas para a conclusão de mestrados e doutoramentos. A partir daí o sistema foi-se robustecendo, criando-se centros de investigação em todas as áreas cientificas”.
Estas manifestações em defesa da ciência começaram em 2022 e a 16 de maio de 2023 realizou-se a maior manifestação contra a precariedade na ciência que reuniu 2 mil investigadores bolseiros, entre a Reitoria da Universidade de Lisboa e o Ministério da Ciência. A FENPROF e a SNESUP garantem que estas manifestações irão continuar e que em setembro e outubro voltarão a reunir-se.