Dentro de três a quatro meses, o Serviço Nacional de Saúde (SNS) poderá enfrentar uma nova "pandemia", desta vez causada não por um vírus, mas por sobrecarga das listas de espera para cirurgia, alertaram vários cirurgiões num debate sobre o impacto da covid-19 na atividade cirúrgica.
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Segunda-feira, a maioria dos hospitais retomou parte da atividade programada, suspensa desde meados de março. Há novas regras para ir ao hospitais, desde medição da temperatura, respeito pelos horários programados e limitação do acesso dos acompanhantes.
Ainda não se conhece a dimensão do que aí vem - com a suspensão de consultas e exames, os diagnósticos estão por fazer -, mas os cirurgiões esperam um "boom" de doentes com indicação cirúrgica nos próximos meses. Só em março, ficaram por fazer 9000 cirurgias e 500 mil consultas em hospitais e centros de saúde. Há quem diga que o desafio do SNS será ainda maior do que o da covid-19.
"Em média, temos 3000 inscritos para cirurgia por mês e prevemos que passe a 4500", disse Leonor Manaças, coordenadora de Gestão do Bloco Operatório do Centro Hospitalar Lisboa Central, num webinar da Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares.
Para Gil Gonçalves, presidente da Sociedade Portuguesa de Cirurgia, este é o momento do SNS planear a resposta aos doentes para não ter de usar o setor privado e social, sem que os recursos públicos estejam devidamente aproveitados.
O recurso ao setor privado para debelar as listas de espera acumuladas durante o combate à covid-19 é uma solução já admitida pela ministra da Saúde, mas que não agrada a todos. Desde logo, ao Bloco de Esquerda que ontem propôs um plano de recuperação da atividade programada no SNS, que assenta em mais financiamento e recursos.
Acompanhantes à porta
Ontem foi o dia em que a maioria dos hospitais retomou gradualmente a atividade. No S. João, o mais afetado do país pela pandemia e onde a redução da atividade programada não urgente atingiu os 40%, prepara-se um aumento progressivo da atividade ao longo do mês, com prioridade para as situações mais graves. Entre outras medidas, vai continuar a ser dada atenção especial às consultas por telefone e telemedicina, as marcações vão ser espaçadas entre as 8 e as 20 horas, para reduzir os picos de procura e o acesso dos acompanhantes será limitado, com exceção dos utentes com necessidades especiais.
No Hospital de Gaia, onde a redução das consultas foi de 50% e das cirurgias de 77%, retomou parte da atividade, com respeito pelas medidas impostas.