Todos os dias, o secretário de Estado do Planeamento, José Mendes, escreve sobre a viagem de Bragança a Sagres de bicicleta.
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Etapa: Faro - Armação de Pêra (60 km)
Na penúltima jornada do Portugal Diagonal, a rota rodou para poente e pintou-se de azul. A cada pedalada, três constantes do meu lado esquerdo.
A primeira era o sol, que no hemisfério Norte faz questão de se passear a Sul. Quente, como gosta de ser para baixo do Tejo, ia-me acariciando a face, intermediado apenas pela brisa, que também disse presente. A segunda constante era o mar, sempre imenso, salpicado aqui e ali por veleiros de gente mais que remediada. A avaliar pelos episódios de espuma no topo das ondas, o vento estaria sudoeste.
Colado ao mar, estava o céu. A terceira constante. São como gémeos. Próximos, da mesma cor, mas com tonalidades diferentes. A separá-los, uma linha de horizonte ocasionalmente perturbada pela silhueta de um navio. Este imenso azul, a refletir a luz do sol, é a imagem de marca do Algarve. Adoramos. Nós e os outros.
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Estando prestes a cortar o país do canto nordeste ao canto noroeste, pergunto-me se existe uma imagem de marca transversal ao território. Olho à volta. O mar não, porque não existe no interior. O céu também não, porque não é só nosso. Vejo um reclame vermelho, a anunciar um café. Mais adiante, do outro lado da estrada, um snack-bar. Ah! E uma pastelaria logo colada. Soa uma campainha no meu cérebro. Cafés! É isso. Temos estabelecimentos destes em todo o lado. Nalguns troços da N2, são às dúzias por cada quilómetro. Tudo é motivo para dar nome a um café. A estrada, a curva, a rampa, a descida, a árvore, a freguesia, a garagem, a bomba, o moinho, a falésia, o monte... e por aí fora.
Agora que tememos os espaços fechados, frequentamos mais as esplanadas. Veem-se pessoas a saborear o seu café, a aviar uns finos, a engolir de penálti um bagaço. É uma delícia. A acompanhar a bebida, nada de livros ou de jornais. Só palavras trocadas numa oralidade que apenas é desafiada pela necessidade de mastigar algum sólido, nem que seja um tremoço.
No outro dia, depois de umas boas duas horas a pedalar para adiantar serviço, resolvo parar para encher de água e acalmar o ritmo cardíaco. Levanto os olhos e lá estava. Taberna do Cansado.