A suspensão de um voo da TAP entre o Rio de Janeiro e Lisboa, no sábado, devido à recusa em transportar, na cabina, um cão de assistência de uma criança que não se encontrava a bordo, provocou prejuízos à companhia aérea portuguesa, que teve de disponibilizar alojamento e viagens alternativas aos passageiros.
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O avião, com capacidade para 298 passageiros, não partiu do Aeroporto Internacional do Rio de Janeiro-Galeão, no Brasil, porque a tripulação rejeitou cumprir uma decisão judicial que ordenava o embarque na cabina de um labrador retriever, com cerca de 35 quilos, de assistência emocional a Alice, uma menina autista de 12 anos, que já se encontra em Portugal há um mês e meio. A ordem emitida por um tribunal brasileiro surgiu após o cão já ter sido impedido, pela mesma companhia aérea, de voar ao lado da criança, a 8 de abril. Na altura, a família acabou por viajar na mesma sem Tedy, mas levou o caso à Justiça. Segundo a família, o cão tem como função amenizar as crises da criança, uma autista não-verbal com episódios de agressividade e ansiedade.
No sábado, a irmã mais velha de Alice deslocou-se com Tedy ao aeroporto do Rio de Janeiro, munida da providência cautelar do juiz brasileiro, com o objetivo de embarcar para Portugal, mas foi "barrada" pela TAP. O "braço de ferro" entre a mulher e a companhia aérea prolongou-se e levou a Polícia Federal a multar um gerente da empresa portuguesa por desobediência. O voo foi cancelado e Hayanne ficou em terra. Com Tedy.
Numa nota a que o JN teve acesso, a TAP garante que cumpriu as normas necessárias para assegurar a sua "prioridade número um": a segurança dos passageiros e tripulação. No entender da companhia aérea, o animal não só não cumpria as regras para viajar na cabina, entre as quais a apresentação de um certificado de treino emitido por uma instituição reconhecida, como a pessoa que necessitava do acompanhado não se encontrava a bordo. A situação é desmentida pela família brasileira.
Transporte "colocaria em risco a segurança a bordo"
A companhia também informa que "foram dadas alternativas de transporte para o animal, que não foram aceites pelo tutor". "A TAP lamenta a situação, que lhe é totalmente alheia, mas reforçamos que jamais poremos em risco a segurança dos nossos passageiros e tripulantes, nem mesmo por ordem judicial", vinca a companhia aérea, considerando que a ordem judicial de autoridades brasileiras "violaria o Manual de Operações de Voo da TAP Air Portugal, aprovado pelas autoridades competentes portuguesas" e "colocaria em risco a segurança a bordo".
Ao JN, fonte da empresa admitiu que a situação provocou prejuízos à TAP, que foi obrigada a garantir alojamento aos passageiros que o necessitaram e a disponibilizar voos na mesma companhia ou em outras, não avançando, porém, com valores. Alguns passageiros foram encaixados no voo seguinte, previsto para cinco horas depois daquele que foi cancelado, que acabou por só descolar já durante a madrugada de domingo.
De acordo com o portal brasileiro G1, a família mudou-se no mês passado para Portugal, já que o pai, médico, veio trabalhar para Lisboa. Segundo Ricardo Sá, a criança "estava na expectativa da chegada" de Tedy e "teve outra crise". A família garante que vai voltar à Justiça.
No site da TAP, a companhia aérea detalha as regras para viajar com animais de assistência, especificando que os cães devem apresentar, entre outros documentos, um certificado de treino emitido por uma instituição reconhecida, um passaporte emitido por um veterinário que confirme a identificação e a vacinação, entre outros. "O transporte dos cães de assistência é, regra geral, feito na cabina. No entanto, existem exceções em que, por questões de segurança, podem ter que viajar no porão (pelo seu tamanho, por exemplo). Nestes casos, são aceites no porão gratuitamente, mas requerem a utilização de um contentor adequado para o transporte, o qual deve ser garantido por si", explica a empresa.
A Organização Mundial de Aviação Civil não tem regulamentação específica sobre cães nos voos, sendo as regras definidas pelas companhias aéreas.
PAN exige explicações ao Governo
O caso, noticiado amplamentos pelos órgãos de comunicação social portugueses e brasileiros, levou o PAN a exigir, nesta segunda-feira, explicações ao Governo. O partido de Inês Sousa Real deu entrada, na Assembleia da República, de um requerimento dirigido ao Ministério das Infraestuturas e da Habitação para que "assuma uma posição clara sobre a conduta da TAP no cancelamento de um voo por recusar embarcar um animal de suporte emocional".
“Para o PAN, é inadmissível que se coloque desta forma em causa o bem-estar de uma criança de 12 anos com necessidades especiais – diagnosticada com autismo. O PAN quer saber se o Governo teve conhecimento desta recusa da TAP, especialmente quando sabemos que toda a documentação sobre o animal que iria prestar apoio terapêutico estava válida e completa sob ordem judicial brasileira” alerta a porta-voz do partido, em comunicado, defendendo a criação de um regime jurídico digno em contexto de transporte aéreo para animais de companhia.