Quando Isabel tinha os 34 anos que hoje tem Ana Sofia, já contava três filhos. Hoje, com 38, é mãe de quatro. Todos rapazes. O mais novo nasceu vai para três semanas. Sofia ainda não tem, mas quer ter. Chegar à fasquia de Isabel é que está fora dos planos.
Corpo do artigo
Isabel Fernandes vive em Carrazeda de Ansiães, um dos concelhos do país com maior número médio de filhos por mulher em idade fértil (1,42), segundo dados da Pordata relativos a 2017. A média nacional é de 1,37. Ana Sofia Teixeira vive em Murça, onde só se chega aos 0,96.
São dois concelhos vizinhos com uma realidade socioeconómica semelhante: cerca de 5500 habitantes cada um (em 31 de dezembro de 2017, de acordo com a Pordata), população envelhecida, economia assente essencialmente no setor primário e, atualmente, bem servidos de acessos rodoviários. Como se explica esta diferença?
Os dois autarcas não têm respostas que a justifiquem. Estão convencidos que dependem de muitas variáveis. O de Murça, Mário Artur Lopes, entende que "são números voláteis e que no ano seguinte podem ser totalmente diferentes sem razões muito sustentadas". Ao de Carrazeda de Ansiães, João Gonçalves, ocorre que a média acima da fasquia nacional pode refletir "maior confiança dos casais no futuro do concelho".
Só dois filhos
Mário Artur pode contar que em breve terá mais um habitante no concelho, cujos pais querem continuar a lá viver. Nélson Correia, 35 anos, casado com Ana Sofia há um ano, deu continuidade ao negócio de serralharia que, juntamente com o irmão, herdou do pai. "Clientes não faltam", pelo que sair da sua terra não lhe passa pela cabeça. Sofia está a trabalhar no posto de turismo e no centro escolar da vila. Nascida e criada no concelho, quer permanecer.
Mas o máximo com que pretendem contribuir são dois filhos. "A conta certa". "Claro que eu gostava de ter muitos mais", sorri Nélson, "mas a vida não está para isso". Ana Sofia quer que aconteça "o mais rápido possível". Facilita ter ali "retaguarda familiar" e "mais facilidade para ver o filho durante o dia". Para além disso, há "atividades extracurriculares e campos de férias grátis" e o concelho oferece "boas condições" para ali continuar. "Temos autoestrada à porta e é fácil ir a todo o lado, o custo de vida é baixo e a qualidade é boa", garante.
É fixe ter outro irmão
Isabel foi mãe pouco tempo depois de casar com João Carlos Fernandes, 44 anos, que se dedica à reparação de eletrodomésticos. Queriam muito ter um filho e nasceu João Pedro, que hoje tem quase 18 anos. "Depois foram uns atrás dos outros", sorri ele. Três anos após veio o Filipe, que tem 15, e não tardou a nascer Gonçalo, atualmente com 11. E agora, "uma surpresa divina", o quarto, o Dinis, que vai fazer três semanas. "É fixe ter outro irmão", confessa Gonçalo. A próxima é uma menina? "Ai não, não, já chega! Se tivéssemos mais apoios... talvez", confessa Isabel, que gere uma loja de pronto a vestir e desporto.
Quando o Gonçalo nasceu, em 2008, receberam da Câmara de Carrazeda 7500 euros. Era o "prémio" dado na altura aquando do nascimento do terceiro filho, 2500 por cada um. "Ele não veio por causa do dinheiro, mas, claro, aproveitou-se", recorda João Carlos. Atualmente continua a haver um apoio financeiro à natalidade: 500 euros para o primeiro filho, 1000 para o segundo, 1500 para o terceiro e 1000 por cada um dos seguintes.
"Medidas populistas"
Em Murça, durante a década de 2000 até se premiaram os matrimónios com dois mil euros e o nascimento de filhos com 750. Medidas do Executivo socialista de então que envolveram algumas centenas de milhares de euros. Ajudou a minimizar o primeiro impacto financeiro do aumento da família, mas não evitou a perda populacional.
Hoje já não há subsídios à natalidade. O social-democrata Mário Artur Lopes acabou com eles porque não simpatiza com "medidas populistas". Não lhe parece que "alguém vá ter filhos só porque existe um apoio de mil ou dois mil euros". Preferiu "resolver problemas prementes da população com maiores dificuldades". "Temos de nos preocupar em dar qualidade de vida verdadeira às pessoas e não distribuir cheques para fazer fotografias", frisa, especificando: "É melhor saber se a criança tem condições de habitabilidade, se é bem alimentada ou se é bem transportada para a escola. Só poderão surgir mais pessoas se virem que se vive bem no concelho".