Manuel Castro Almeida nasceu em Escapães, na Feira, há 66 anos, mas cedo se mudou para São João da Madeira, onde foi autarca 12 anos. Tirou Direito em Coimbra, teve vários cargos no PSD, foi secretário de Estado de Cavaco Silva e de Passos Coelho. Agora é ministro Adjunto e da Coesão Territorial.
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Já se pode dizer que o PRR não vai corrigir os atrasos estruturais da economia portuguesa?
Não vai corrigir os atrasos estruturais da economia, mas vai dar um contributo para diminuir esses atrasos. Eu tenho, desde há muito tempo, uma grande esperança nas agendas mobilizadoras. Também tenho que reconhecer que a sua implementação não foi muito feliz.
Com a inflação, não vamos ter que gastar mais do orçamento para aproveitar as verbas do PRR?
É verdade que alguns projetos foram subdimensionados. Por exemplo, para fazer as mesmas 26 mil casas vai ser preciso mais dinheiro. E aí o Orçamento do Estado vai ter que complementar. Também é preciso saber se há capacidade para construir. Nalgumas zonas, há o risco de poder haver dificuldades em encontrar capacidade de executar tanta obra.
O anterior Governo disse que faltavam cinco metas para se pedir o quinto cheque do PRR. Quando é que vai pedir?
Estamos concentrados em apresentar o quinto pedido dentro de um mês. Foi o prazo que o primeiro-ministro estabeleceu. Das 42 reformas necessárias para o quinto pagamento, havia 15 que estavam realizadas. Havia 27 por realizar.
Estas cinco metas de que o primeiro-ministro anterior falou são o quê?
Eram, se quiser, as mais difíceis. Mas de facto havia 27 por realizar, só 15 estavam realizadas.
É exequível?
Vai ser muito difícil, muito à tangente, com grande dificuldade no que respeita à barragem do Pisão, mas vamos apresentar o quinto pedido dentro do prazo, é para isso que estamos a trabalhar.
O que é que está mais comprometido?
A preocupação global é que temos menos do que metade do tempo para executar os 80% que faltam. O meu objetivo mais imediato é, no fim do ano, atingir 40% de execução do PRR. É um objetivo muito ambicioso.
E no Portugal 2030?
O Portugal 2030 obriga-nos a executar cerca de 3100 milhões de euros no final de 2025 e o nosso objetivo é executar 4500 milhões. Isso significará atingir 20% de execução, ou muito próximo, em dezembro de 2025.
Que obras estão mais atrasadas?
Há uma grande preocupação com o Metropolitano de Lisboa, que está a ajustar o programa para que possamos fazer uma pequena reformulação no PRR de forma a não perder dinheiro. Se não fizermos quatro estações, vamos fazer duas financiadas pelo PRR. As obras não vão deixar de ser feitas, a origem do financiamento é que pode ser alterada.
O PT2030 pode corrigir as assimetrias criadas pelo PRR?
No PRR, a opção do Governo anterior foi trazer para Lisboa uma grande concentração de fundos.
O PRR inclinou mais o país para o Litoral?
O PRR inclinou mais, sem dúvida. Não foi um instrumento de diminuição de assimetrias de desenvolvimento regional. Esse instrumento é o PT2030.
O que vai mudar face aos alertas do Ministério Público sobre riscos no controlo interno do PRR?
Uma das primeiras medidas que este Governo tomou, logo na segunda semana, foi alargar o quadro de inspetores de terreno da Agência para o Desenvolvimento e Coesão. Em Portugal, temos uma prática de nos dedicarmos muito a fiscalizar papéis. Os papéis podem não detetar muitas coisas, abusos e fraudes que o terreno deteta. Do nosso lado, há tolerância zero para a fraude.
A descentralização é para manter?
A descentralização é um belo princípio. Portugal ainda é um país muito centralizado, mas foram dados passos importantes no último Governo. A nossa ideia é consolidar o processo de descentralização que foi feito e dar passos, avanços, nessa matéria.
Quer reforçar as competências das câmaras?
Algumas pessoas acham que os autarcas são uns despesistas descontrolados, mas as câmaras são um exemplo para o Estado. Hoje, dois terços das câmaras pagam as faturas a menos de 20 dias. E 40% pagam a menos de 10 dias. Apenas 6% pagam a mais de 90 dias.
E executam melhor?
Quem está mais bem colocado para encontrar a boa solução é quem está mais próximo do problema. Esta é a regra, é este o princípio da subsidiariedade e é o princípio da descentralização. Portugal tem ainda um grande caminho a fazer, porque nós somos um Estado muito centralizado, muito napoleónico, e temos vícios de centralismo muito enraizados.
Vai reforçar as verbas das câmaras para pagar os informáticos das escolas?
Tem que ser feito em articulação e negociação com a ANMP. Passando a ser um encargo dos municípios, é preciso que a mochila financeira equivalente leve também o dinheiro suficiente.
No próximo ano letivo?
Não sei se vai ser possível, creio que estamos já demasiado em cima da hora.
Faz sentido que as câmaras alarguem o horário dos centros de saúde, como reivindicam?
Encaro como uma boa medida. Deve ser uma decisão local, vejo com muito bons olhos.
Conseguiu convencer os ministros da Agricultura e da Cultura sobre o reforço das CCDR ou a hierarquia do Governo resolveu o problema?
Não, aqui não há hierarquia do Governo. Tem que se encontrar uma solução equilibrada. Temos que garantir que o ministro da Agricultura, no caso concreto, tenha instrumentos para executar a sua política em todo o território.
As CCDR são obstáculos?
Não são obstáculos, agora temos que arranjar mecanismos de interação, de forma a que o ministro tenha capacidade e autoridade para conseguir aplicar a sua política em todo o território nacional.
Gostava que o referendo da regionalização avançasse neste mandato?
Quem define as prioridades do Governo e o ritmo de execução é o primeiro-ministro. Quem não aceitar estes princípios não deve ir para o Governo.
Isso quer dizer que está afastado o referendo?
O primeiro-ministro disse que não é uma prioridade, aqui tem a minha posição.
É preciso alterar a Lei das Finanças Locais?
Tem que ser alterada a bem de um saudável princípio de independência e de previsibilidade nas finanças locais. É um exercício difícil que vai ter que ser feito com a ANMP. É uma prioridade, vamos fazê-lo, mas ainda não começamos o trabalho.
Será para 2025?
Acho improvável, não é uma emergência nacional. Tem que ser feito, mas com muita cautela, rigor, cuidado e propósito.