O antigo primeiro-ministro e presidente da República, Aníbal Cavaco Silva, considera que levar a cabo uma "verdadeira remodelação ministerial" é "a tarefa mais difícil em termos pessoais" para um primeiro-ministro. Cavaco lançou esta sexta-feira, em Lisboa, o seu livro sobre o tema.
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A intervenção do antigo governante no Grémio Literário foi sobretudo analítica - e, por isso, menos crítica do Governo do que de costume. Perante uma plateia de cheia de personalidades sociais-democratas, Cavaco Silva frisou que o objetivo da sua obra, denominada "O primeiro-ministro e a arte de governar", é expor aquele que, no seu entender, é o "comportamento ótimo" de um primeiro-ministro - por muito que esse ideal seja impossível de atingir "na sua plenitude".
"Se tivesse de escolher a tarefa mais difícil em termos pessoais para um primeiro-ministro, escolheria a realização, com sucesso, de uma verdadeira remodelação ministerial", afirmou Cavaco Silva.
"A substituição de três, quatro ou cinco ministros de uma assentada exige sangue frio sigilo, preparação e execução meticulosas", frisou. Considerando que "apanhar a comunicação social e o país político de surpresa é o ideal", defendeu que as duas "verdadeiras remodelações" que impulsionou enquanto chefe do Governo cumpriram esse requisito.
Ainda assim, Cavaco acabou por dar um raro - e indireto - desconto ao atual Governo: "Reconheço que, nos tempos atuais de agressividade mediática e de novas tecnologias de informação, é muito mais difícil alcançar este ideal", referiu.
António Costa, recorde-se, tem sido criticado - inclusive pelo próprio Cavaco - por retardar as remodelações dos seus Governos. A manutenção de João Galamba, em particular, motivou inúmeras críticas da Esquerda à Direita, bem como o desagrado do presidente da República.
Durão Barroso: "Por favor, continue a incomodar quem fica nervoso consigo"
Cavaco também afirmou que a sua análise poderá gerar divergências de outros investigadores de ciência política do mundo atual. Isto porque, para o social-democrata, o modelo de primeiro-ministro bem-sucedido no séc.XXI é aquele que consegue "iludir os eleitores" através da atribuição de "benefícios diretos, de curto prazo e de fácil percepção", cujos custos se façam sentir apenas num futuro "distante".
Com esta obra, Cavaco disse ter procurado contribuir "para melhorar a compreensão da responsabilidade do primeiro-ministro português", bem como para a "avaliação do desempenho das suas funções".
O livro foi apresentado por Durão Barroso, também ele antigo primeiro-ministro. Criticando "uma certa Esquerda" por querer decretar "a morte cívica" de Cavaco, Durão lançou um repto ao anfitrião: "Por favor, continue a incomodar os que ficam nervosos consigo antes sequer de o ouvir falar".
Num dia em que Cavaco não comentou - pelo menos de forma direta - a política nacional, coube a Durão Barroso fazer os ataques mais explícitos: "Por que razão alguns querem decretar a morte cívica do prof. Cavaco Silva? Não é só inveja: temos uma certa Esquerda muito dogmática, sectária, intolerante, preconceituosa e que se acha dona do regime", atirou.
No lançamento do livro estiveram nomes como o líder do PSD, Luís Montenegro, ou o presidente da Câmara de Lisboa, Carlos Moedas. Também marcaram presença muitos ex-governantes sociais-democratas, como Manuela Ferreira Leite, Eduardo Catroga, Marques Mendes ou Mira Amaral. Algumas figuras de outros partidos, como a deputada Carla Castro, da IL, estiveram igualmente na cerimónia.