Ainda no rescaldo do lançamento do seu novo livro, Cavaco Silva assumiu que não fez “tudo perfeito” e que cometeu “alguns erros”. O ex-presidente da República lembrou ainda as reformas mais impopulares que tomou e explicou, novamente, as razões para a exoneração de um ministro.
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“Com certeza que cometi alguns erros, porque, como disse, fui aprendendo”, confessou numa entrevista publicada esta sexta-feira no Jornal Nascer do Sol. E acrescentou: “Eu não fiz tudo perfeito, como é óbvio”.
Segundo o antigo primeiro-ministro, um chefe de Governo não deve ter o foco de “ganhar as eleições” e, argumentou, que o objetivo deve ser “conseguir para o país progresso económico, social, cultural, ambiental, numa perspetiva de médio e longo prazo, tendo em conta as gerações futuras”. “Foi isso que eu fiz”, congratulou-se.
Nesse sentido, Cavaco lembrou as reformas mais difíceis e impopulares que teve de tomar - como a “introdução das propinas nos estudantes universitários” -, bem como a habilidade política necessária para “explicar aos portugueses a necessidade de fazer reformas estruturais”, identificando as que fez.
“Por exemplo, a reforma substancial e muito importante que foi a reforma fiscal. Apesar de a oposição toda dizer que os portugueses iam pagar mais impostos, eu tinha de ter a habilidade de explicar aos portugueses que era fundamental para o futuro do país. E deixei muitas vezes de lado esse objetivo”, referiu.
Combater a emigração jovem e envolver privados na habitação
Na entrevista ao Nascer do Sol, Cavaco Silva lembrou que há matérias importantes que devem ser resolvidas para garantir melhores condições às gerações futuras. “Combater aquilo que se passa neste momento, que é a emigração dos jovens licenciados de talento e de espírito inovador que vão para o estrangeiro, ganhar três vezes mais do que aquilo que ganham em Portugal. Reforçar o capital físico produtivo, o que significa investimentos a fazer no presente, para que no futuro a produtividade seja maior”, apontou.
Também o problema da habitação mereceu reparos do ex-chefe de Governo e antigo presidente da República. Cavaco diz que “não haverá solução para o problema da habitação em Portugal se não for dada confiança aos investidores privados. É fundamental que haja uma oferta pública de habitação, mas sem uma oferta vinda do setor privado, nós, daqui a quatro, cinco anos, estaremos a discutir da mesma forma que discutimos hoje a falta de habitação”, alertou.
Cavaco diz ainda que para sustentar o “aumento do consumo privado” é importante apostar nas “exportações”, realçando que “só à custa do turismo” o país não vai “aumentar a sua competitividade”.
O ex-presidente da República voltou a referir que a “falta de bom senso”, “atitudes mentirosas” e “linguagem que reflete falta de boa educação”, são razões suficientes para um primeiro-ministro propor a exoneração de um ministro ao presidente da República.
“Nessas condições, [o primeiro-ministro] tem de esquecer todas as ligações pessoais, todo o bom relacionamento que tem ou que teve com esse ministro e tem de propor ao presidente da República a sua exoneração”, explicou.
Cavaco Silva lançou, há uma semana, o livro “O Primeiro-Ministro e a arte de governar” onde deixou vincadas estas linhas de pensamento. Agora, revelou que o livro já estava pensado “há quase 20 anos”, só não foi anteriormente publicado porque tinha de “prestar contas aos portugueses”, explicou aludindo às funções políticas que exerceu – primeiro em São Bento, como primeiro-ministro e, depois, no Palácio de Belém, enquanto presidente da República.