Dificuldade em identificar limites dá origem a hectares de áreas sobrepostas. Instituto dos Registos e Notariado vai criar comissão para resolver conflitos.
Corpo do artigo
Há centenas de hectares de terrenos sobrepostos nos cadastros, porque várias pessoas reclamam a mesma área, na totalidade ou em parte, na altura em que fazem a georreferenciação no BUPi-Balcão Único do Prédio, a plataforma dirigida aos proprietários de prédios rústicos e mistos. O problema foi admitido por Carla Mendonça, coordenadora do BUPi, que reconheceu ao JN que "há algumas situações de sobreposição", mas que a maioria resulta "de erros de desenho", sublinhando que "não é fácil os proprietários fazerem sobre uma fotomapa o desenho da propriedade".
A responsável assegura que uma boa parte dos casos "não é provocado, pois resulta de dificuldades em identificar a propriedade ou os seus limites (estremas)". Os gestores do BUPi estão atentos a estes constrangimentos e procuram soluções.
"Estamos a perceber que estas sobreposições resultam de erros de desenho, mas já estamos a trabalhar para encontrar mecanismos para tratamento destas sobreposições, que passam por uma comissão administrativa de interesses, presidida pelo IRN (Instituto dos Registos e Notariado) que, nestas situações em que se vierem a confirmar que temos, efetivamente, conflitos de estremas, tentarão harmonizar entre as partes esses problemas de propriedade", adiantou Carla Mendonça ao JN.
plataforma tem problemas
Estes e outros constrangimentos associados às falhas de acesso ao BUPi são apontados por Hernâni Dias, presidente da Câmara Municipal de Bragança, que denunciou que a plataforma permite "a qualquer cidadão ver os terrenos que já estão georreferenciados" o que, segundo o autarca, dá origem a dois tipos de problema. "Primeiro, se o munícipe verifica que um seu terreno está georreferenciado por outro cidadão, vai pedir explicações ao balcão, mas este não tem responsabilidade de gerir o conflito. Por outro, possibilita que pessoas menos sérias possam aproveitar-se desta circunstância quando sabem que determinado proprietário não georreferenciou um terreno, podendo fazê-lo como sendo dele. Isto terá que ser corrigido para que não sucedam constrangimentos recorrentes", disse Hernâni Dias.
O autarca aponta ainda dificuldades no acesso à plataforma, que demora entre 10 e 15 minutos, e as quebras no sistema, que não permitem o trabalho contínuo e levam a atrasos.
Durante uma sessão esta semana, Hernâni Dias criticou também a "alegada gratuitidade" do RGG que, em algumas situações, tem sido posta em causa. "O munícipe vai à conservatória do Registo Predial, onde não lhe fazem o trabalho, e é encaminhado para notários privados", criticou.
Lançado em 2017, como projeto-piloto em 10 concelhos, o BUPi, é uma das 164 medidas do Programa de Valorização do Interior. Conta já com 139 municípios aderentes, mas até ao fim de junho serão 153, e mais de 500 mil registos RGG. Só este ano foram feitos 250 mil.
A primeira fase termina no final de 2023. O projeto tem continuidade assegurada até 2026 graças a um financiamento de 29 milhões de euros, ao abrigo do Plano de Recuperação e Resiliência.
Números
90% dos municípios a norte do Tejo
sem cadastro de propriedade rústica. Cobrem uma área superior a 37 mil km2, representam mais de 8,2 milhões de matrizes rústicas e uma população que ultrapassa os 4,2 milhões de pessoas.
83 mil promotores
recorreram ao BUPi Até maio foram finalizados 67 139 processos de registo, com uma média diária de três mil. Há 753 técnicos ativos no conjunto dos 139 municípios que aderiram a este serviço.
Perguntas
Como é que se faz a georreferenciação de um prédio?
Para fazer o registo de um prédio rústico, primeiro é preciso definir a sua localização exata. Só depois é possível inscrevê-lo no registo predial ou atualizar os registos se já existirem. O processo pode ser feito no Balcão Único do Prédio (BUPi), uma plataforma eletrónica que serve de contacto entre o proprietário e os vários serviços públicos (Fisco, Instituto dos Registos e Notariado, Direção-Geral do Território ou Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas).
E se não houver registo?
Nesse caso, será preciso obter primeiro a representação gráfica georreferenciada do prédio. A georreferenciação é a identificação de um terreno através de coordenadas geográficas, que permitem saber a sua localização exata e defini-la num mapa. Definidas as estremas, será possível fazer um desenho do prédio, o chamado polígono.
Onde fica registado?
A informação é carregada no BUPi, que dispõe de suporte cartográfico. A este processo chama-se cadastro simplificado. O Estado fica a saber de quem é o terreno e o proprietário fica com o seu registo completo. Até ao final de 2023, o Governo prevê que esteja georreferenciada 90% da área dos municípios aderentes.