A manifestação de votos no Chega é transversal ao país do ponto de vista geográfico, etário, de classe ou género. Os especialistas explicam que o crescimento resulta da desilusão com os partidos tradicionais, conquistando abstencionistas e não só, através do mundo virtual, com causas fraturantes para eles.
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O discurso da extrema-direita moderna é sobre o “Estado social que os partidos da Direita dita democrática e o PS foram, através do subfinanciamento, destruindo ao longo do tempo”, atesta Bruno Madeira, historiador e docente da Universidade do Minho, especialista em assuntos da extrema-direita.
O crescimento do Chega “é transversal”, ou seja, não abrange apenas um segmento específico da sociedade, e aproveita o modelo individualista das sociedades: “Facilmente é explorável pelos discursos que nos dizem que os nossos problemas individuais têm que ver com alguém”.
Depois, não é exclusivo português. “Tem havido um processo de gradual viragem à Direita em todo o Mundo”, identifica Bruno Madeira, citando casos como os da Índia, Filipinas e Argentina, além dos já conhecidos Estados Unidos e na União Europeia.
Em parte, isto é resultado da “evolução cultural e civilizacional que não soube acomodar uma parte dos cidadãos” e os afastou quando cresceu “a promoção dos direitos para grupos que tinham até aqui direitos limitados”, como as mulheres ou os homossexuais. Reagem, agora, ao que chamam de “woke”.
Até agora, uma parte destes eleitores era abstencionista. Estavam desalinhados com os valores dos partidos ditos tradicionais, mas não os puniam nas urnas. Agora, isso pode ter mudado, assinala Patrícia Silva, doutorada em Ciência Política e professora da Universidade de Aveiro.
A docente realça que há temas que falam diretamente para este eleitorado. “A integridade na política, a corrupção, a imigração” são assuntos no centro da mensagem do Chega, que fala de cátedra, pois nunca governou e “não tem telhados de vidro”.
Redes sociais são a selva
A juntar a tudo isto há a forma de comunicar, sobretudo nas redes sociais. Patrícia Silva assinala que “há uma profusão da mensagem do Chega pela via das redes sociais que os outros partidos não estão a conseguir”. Bruno Madeira concorda: “Estamos a falar de um conjunto de jovens que não se identificam se calhar tanto a André Ventura, mas com aqueles que aparecem associados”.
Os “associados” são alguns dos influencers mais seguidos do TikTok e do Instagram, “como é o caso do Tiago Grila, do Numeiro, do Tiago Paiva e de muitos outros que são seguidos por centenas de milhares de miúdos”. Eles dizem aos mais novos, aos homens, que o problema está “na sociedade, nas mulheres, na ideologia woke e na Esquerda em geral”.
São alvos comuns também os jornalistas, acusados de esconder esta realidade securitária que só o Chega e os seus apoiantes contam, contra factos e contra a verdade.