
Sistemas inteligentes de rega, que têm em conta as condições climatéricas , reforçam a eficiência
Arquivo JN
Aproveitar soluções de base natural, recorrer às novas tecnologias, incentivar mudanças de comportamentos e procurar novas fontes. Afinal, a gestão eficiente da água está no centro das preocupações de muitas cidades, que há anos procuram implementar mudanças. Da troca de relvados, aos sistemas de rega inteligentes, há um manancial de opções a explorar.
Dos contactos feitos pelo JN Urbano, sobressaem ações como a troca de relvados por prados de sequeiro (dispensam rega), instalação de sistemas inteligentes de rega que têm em conta as condições climatéricas, plantação de árvores pouco exigentes em termos hídricos e aproveitamento da água das chuvas.
Em Guimarães, que lidera a rede de Cidades "CApt2 - Circularidade da Água por Todos e Para Todos", a opção por prados de sequeiro já atinge 100 hectares em diversos parques (80 em resultado de substituições desde 2017 e 20 em novos espaços). No Parque da Cidade, esta substituição gradual permitiu, entre 2019 e 2021, "uma poupança de água de cerca de 70%", especifica Carlos Ribeiro, diretor do Laboratório da Paisagem.
No Porto, recorre-se "às águas dos lagos para a rega de grandes extensões" nos parques urbanos, uma entre múltiplas ações, já que a Autarquia tem uma "abordagem holística e persistente no que diz respeito à poupança", vinca o vice-presidente, Filipe Araújo.
Contadores inteligentes detetam ugas
Em Águeda, conta o edil Jorge Almeida, que há anos que se aproveita a captação não potável da Várzea para rega de espaços verdes na cidade, como o Parque da Alta Vila, e a rede de incêndios. Os "contadores inteligentes" que monitorizam edifícios permitiram detetar, no ano passado, 11 fugas. Uma num tubo no jardim da Escola Fernando Caldeira "poderia ter gasto 145 m2 de água durante um mês" e um passador de rega no estádio municipal, que foi "aberto indevidamente", "poderia ter consumido 620 m2 de água", contabiliza a Autarquia aguedense.
Em Cascais, das ações que constam do "Plano de Uso Inteligente da Água" destaque para o "aproveitamento de águas subterrâneas e pluviais para a rega". O "Parque Marechal Carmona e Quinta da Alagoa utilizam já fontes hídricas alternativas à rega e o objetivo é que sejam autossuficientes", revela a Câmara. Este ano avança um investimento de 100 mil euros que visa a reconstrução dos antigos aquedutos e tanques do Parque Urbano da Quinta da Alagoa. O objetivo é aproveitar a água subterrânea para rega e abastecimento dos sanitários públicos, poupando 10 mil m3 de água potável/ano.
Em Loulé, por exemplo, procura-se, entre outras coisas, implementar um "sistema para reutilização de cerca de 50 m3 diários de água das Piscinas de Quarteira" para rega e lavagem de pavimentos, que permitirá "reduzir diariamente o consumo de água potável equivalente ao de 300 pessoas", conta Manuela Moreira da Silva, professora que dirige o mestrado em Ciclo Urbano da Água na Universidade do Algarve (UAlg) e é investigadora nos centros CIMA e CEiiA. Também no Jardim das Comunidades em Almancil estão a surgir projetos, em colaboração com o Instituto Superior de Engenharia da UAlg.
Gaia foi pioneira no desenho de cidades sensíveis à água
Portugal não parece ficar atrás numa preocupação que é global. Poças Martins, docente da Universidade do Porto, consultor internacional de água e presidente da Ordem dos Engenheiros - Região Norte, revela que cidades em todo o Mundo "têm desenvolvido um conjunto de metodologias no âmbito do Water Sensitive Urban Design, ou seja, o desenho das cidades sensíveis à água". Gaia, destaca, "foi pioneira desse conceito em 1997", tendo-se seguido o Porto. Mas ainda há margem para fazer muito mais.
O uso eficiente da água em zonas urbanas não dispensa a "necessidade urgente de se renovar grande parte das redes de distribuição da água em baixa, que frequentemente apresentam condutas e depósitos já em mau estado de conservação", geradoras de grandes desperdícios, aponta Moreira da Silva.
A empresa municipal Águas e Energia do Porto é uma das que têm procurado mudar este panorama, tendo, em 2021, atingido "o valor mais baixo de sempre da água não faturada (perdas) com um resultado abaixo dos 14,9%, quando em 2006 ascendia a mais de 54% e era condição insustentável", revela a Câmara. Neste período, as múltiplas ações permitiram reduzir "mais de 200 mil milhões de litros de água que outrora era perdida", acrescenta.
Há lugar e razões para introduzir nos regulamentos algumas melhorias
O foco de Matosinhos na eficiência, refere a Câmara, fez com que hoje haja "valores de perdas nas redes de apenas 12%, que contrastam com a média nacional próxima dos 30%".
A eficiência hídrica nos edifícios também é importante e tem sido "alvo de numerosos estudos por parte da Associação Nacional para a Qualidade nas Instalações Prediais", que tem "sistematizado informação fidedigna sobre a nossa realidade nacional e proposto soluções técnicas para as instalações e equipamentos, incluindo dispositivos redutores de caudal", refere ainda a docente da UAlg, que defende a necessidade de "recolher o histórico dos dados reais dos diversos usos da água nos municípios".
Graças ao desenvolvimento de novas tecnologias, já existem sistemas que permitem reaproveitar água dos banhos para as sanitas, entre outras formas de evitar desperdícios no edificado, mas a sua implementação em novas construções ainda fica, por enquanto, "demasiado ao critério" dos promotores, lamenta Poças Martins, sublinhando que "há lugar e razões para introduzir nos regulamentos algumas melhorias". Uma parte considerável da água gasta nos edifícios e outros espaços citadinos "não tem de ser potável".
Os dois especialistas alertam, ainda, para a necessidade de se apostar na educação para mudar comportamentos da população e procurar novas origens de água.
As alternativas poderão passar por processos de dessalinização e tratamento da água das ETAR, havendo já projetos em curso em Portugal, nomeadamente no Algarve.
