Em Março de 1975, fui convidado a visitar a Polónia comunista. Foi em Cracóvia que arrisquei dizer aos meus anfitriões que gostaria de visitar o santuário de Chestokowa.
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Tive o privilégio de ser acompanhado por um padre polaco, ex-prisioneiro do campo de concentração de Auschewitz. O que mais me impressionou foram as suas memórias e a sua aversão aos delatores. Garantia-me que na Polónia os delatores semeavam desconfiança até entre familiares e amigos, tornando as relações humanas e sociais sufocantes. Havia filhos que acusavam pais e irmãos que se denunciavam uns aos outros para que os acusadores caíssem nas graças do regime. Fiquei enojado contra a delação, que, em Portugal, era prática de "bufos" ao serviço da PIDE.
Tenho anos de jornalismo bastantes para saber que a violação do segredo de justiça, antes de ser imputada a jornalistas, deve ser creditada a funcionários judiciais, magistrados do Ministério Público, juízes de instrução, arguidos ou advogados. Quando os jornalistas intervêm, deveriam ter o cuidado de investigar as fontes, em particular os denunciantes que se dizem vítimas. Não foi assim com o caso do cónego Ferreira dos Santos, do Porto. É grave que se negue tão impunemente a presunção de inocência.
Já me enoja a obsessão da campanha que não cuida de separar o justo do pecador. Os padres perversos devem ser julgados, mas não nos façam crer que têm o exclusivo da pedofilia, que é, como se sabe, transversal a diferentes estratos sociais e leva na sua enxurrada solteiros e casados. Exige a reflexão de todos nós, sem fazermos de alguns os únicos bodes expiatórios.
