A comissão independente que investiga os abusos sexuais de crianças dentro da Igreja Católica tem sentido dificuldades para recolher testemunhos no "país profundo" e vai pedir ajuda a todas as autarquias. Ao JN, o coordenador da comissão, Pedro Strecht, fez um "grande apelo" para que também outras instituições locais divulguem a mensagem. À entrada para o segundo mês de trabalho, a comissão recebeu 218 testemunhos, revelou
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"Sentimos que ainda precisamos de chegar mais ao que as pessoas chamam o país profundo", admitiu Pedro Strecht, esta quinta-feira. Em concreto, o pedopsiquiatra referiu-se a "gente que ainda não usa as tecnologias no dia-a-dia ou que não tem acesso a elas" e que, nesse sentido, se enquadra "nas margens" da sociedade.
O coordenador da comissão tem esperança de conseguir mais relatos de abusos vindos do interior do país. "Estamos a fazer um apelo muito grande e vamos fazê-lo ainda melhor junto das Câmaras Municipais, pedindo suporte a jornais e rádios locais, instituições e coletividades", frisou. "São elas que, no fundo, estão mais próximas das pessoas".
Pedro Strecht afirmou não ter números concretos sobre como têm chegado os testemunhos, mas revelou que "a grande maioria" das vítimas recorre à página online darvozaosilencio.org.
Embora o questionário seja anónimo, há quem queira revelar-se aos membros da comissão: "Muitas pessoas fizeram questão de nos enviar um e-mail a dar o nome, o contacto e a disponibilizarem-se para tirar dúvidas", referiu o médico.
Segundo um comunicado do grupo de peritos, os relatos recebidos vêm de pessoas nascidas entre 1933 e 2006 (entre 89 e 16 anos de idade). Há "bastantes" a querer contar a sua história de forma presencial, revelou Strecht: "Umas chegam sozinhas, outras acompanhadas por familiares. Para algumas, é mesmo o primeiro momento de revelação daquilo por que passaram".
Pedro Strecht, que falou à margem da apresentação do seu livro "Harmonia", em Lisboa, refere que a comissão ainda não está na fase de cruzar os relatos com os dados dos arquivos da Igreja. Mas o acesso a estes "não será complicado", acredita. "Procuramos todos o mesmo fim: tentar perceber o que aconteceu no passado para prevenirmos um bocadinho melhor o futuro".