Dos 10 mil brasileiros que chegaram à cidade de Braga nos últimos três anos, centenas já abriram empresas, maioritariamente no setor da restauração. Estética, beleza, marketing e comunicação são outras apostas fortes de uma comunidade que saiu do país em busca de segurança.
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Cris Mota, 40 anos, tinha tudo para vingar no Brasil. Ganhou um famoso concurso de culinária (Hell"s Kitchen), era reconhecida, e um restaurante em São Paulo, onde vivia, seria sucesso quase garantido. Faltava-lhe, contudo, "segurança" para trabalhar no país que a viu nascer. Foi por isso que, no ano passado, decidiu viajar para Portugal, com a mulher, Camila, para procurar o melhor lugar para viver e abrir o seu restaurante. Escolheu Braga e, há três meses, abriu o Vilarejo. É só um, entre centenas de negócios com sotaque brasileiro, que apareceram na cidade dos arcebispos à conta da vaga de imigração que, nos últimos três anos, trouxe mais 10 mil pessoas à região minhota.
Para se perceber a dimensão do empreendedorismo desta comunidade, o diretor-geral da Associação Comercial de Braga (ACB), Rui Marques, dá nota que, este ano, 25% dos novos associados são empresários brasileiros. A restauração é, "destacadamente", o setor onde apostam mais, seguindo-se as áreas da estética, beleza e consultoria em marketing e comunicação.
Marcelo Souza, que chegou a Braga no ano passado, encontrou no Centro Histórico dois espaços para investir. A pastelaria de inspiração alemã Pretzel - que, entretanto, deixou o conceito e funciona como restaurante de comida tradicional - e a loja Nut"Braga, onde o creme de chocolate e avelãs Nutella é rei. "Vim para Portugal com a ideia de investir", frisa o ex-investigador da área da tecnologia, com 48 anos, que ainda passou um período em Lisboa até descobrir Braga e ser atraído pelo "poder turístico". "A Câmara investe em propaganda, no marketing, turismo, festas e eventos importantes. E é menos agitada que Lisboa", elogia o empresário, para justificar a aposta nestes negócios e a mudança da capital para o Minho, de onde já não se vê a sair.
Seria muito mais fácil abrir um restaurante em São Paulo, mas preferi começar do zero, aqui
Também Cris Mota e Camila Alencar pretendem manter a morada na cidade. "Quando pegamos no carro para conhecer Portugal, nem íamos passar em Braga, mas acabamos por visitar, por estar próximo do Porto. Era feriado, estava quase tudo fechado, mas mesmo assim adorámos", conta Camila, que deixou, temporariamente, a Medicina para se dedicar ao Vilarejo, junto à Sé de Braga. "Em 30 anos, foi a primeira vez que saí à meia-noite, parei na rua para conversar com os amigos, com computador e o telemóvel na mão a mostrar fotos. Fiquei emocionada e liguei à minha mãe. Nunca tinha vivido isto", recorda. Cris Mota também partilha a alegria de não precisar de contratar um segurança para fazer o fecho do restaurante, como aconteceria no Brasil. "Seria muito mais fácil abrir um restaurante em São Paulo, para atrair o público. Mas preferi começar do zero, aqui", atesta a chef de cozinha.
Mais afastada do centro, junto ao parque desportivo da Rodovia, Gabriela, com 45 anos, e Carlos Silva, 46, encontraram a loja ideal para abrir o Atelier das Delícias. A mulher trabalhava com moda e decoração, mas depressa percebeu que, em Braga, "nessa área já havia muita oferta". "Também vimos a pastelaria convencional, mas seria mais uma. Então, decidimos abrir uma pequena loja com doces e culinária brasileira", elucida Gabriela, agora, dedicada à pastelaria.
A segurança como trunfo
O casal chegou em janeiro do ano passado, atraído pela qualidade de vida que os compatriotas mostram nas redes sociais. "Pensámos entre Setúbal e Braga. Mas na Internet havia muito pouca informação sobre Setúbal e, sobre Braga, achei uma youtuber com muitas informações. Considerámos ser mais seguro", relata a empresária, satisfeita com a aposta e com o negócio, que já pensa expandir.
Crescer profissionalmente também faz parte dos planos de Ângelo Epifânio, um profissional de marketing, com 44 anos. Depois de passar três anos entre Almada e Chaves, foi na freguesia de Nogueira, em Braga, que encontrou, há um ano, um salão de cabeleireiro para investir, com a mulher. "As brasileiras que chegam a Portugal têm dificuldade de se adaptar aos serviços dos portugueses. Os cabelos são diferentes e os produtos", explica, sublinhando que o seu espaço já conquista gente do Porto, Póvoa de Varzim, Esposende e até já teve uma cliente "que veio de propósito de França para tratar o cabelo".
Para o diretor-geral da ACB não há dúvidas: "Os brasileiros são uma comunidade importante, quer pela força de trabalho que acrescentaram à cidade quer enquanto comunidade de consumidores, porque são muitos e tendencialmente a crescer. São uma comunidade que não se acomoda e tem este espírito empreendedor".