O processo de escolhas para o Internato Médico 2022 terminou esta segunda-feira, com dois recordes: foram preenchidas 1883 vagas, mas 161 ficaram por ocupar, das quais 71 são de Medicina Geral e Familiar. Para o bastonário da Ordem dos Médicos, há evidente "desinteresse" dos jovens médicos pela formação especializada no Serviço Nacional de Saúde e "um sinal vermelhíssimo" à atuação do Ministério e do Governo.
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Esta segunda-feira, a Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS) informou, em comunicado, que o processo de escolhas para o Internato Médico 2022 - o período de formação necessário para os médicos obterem a especialidade - terminou com 1883 vagas ocupadas, "o maior número de sempre".
O comunicado não adianta, porém, quantas vagas a mais foram ocupadas relativamente ao ano anterior, nem quantas ficaram por preencher.
De acordo com informação consultada pelo JN, foram, de facto, preenchidas mais 12 vagas do que em 2021 (1871). Mas houve também um recorde de vagas que ninguém quis (161), um número ainda mais expressivo do que o do ano anterior (50), a primeira vez em que ficaram vagas de formação especializada por ocupar.
A diferença entre o número de inscritos no processo de escolhas (2321) e o número de vagas ocupadas (1883) dá 438. O que significa que mais de quatro centenas de jovens com o curso de Medicina optaram, por razões várias, por não fazer a especialidade este ano.
"Bluff" ou "sinal vermelhíssimo"
Para o bastonário da Ordem dos Médicos das duas, uma: "ou houve um enorme bluff nos últimos anos sobre a falta de vagas para formação especializada ou temos aqui um sinal vermelhíssimo ao papel do Ministério da Saúde, e do Governo em concreto, nesta área".
Miguel Guimarães recorda que a Ordem dos Médicos tem vindo, a cada ano, a identificar mais capacidades formativas para dar oportunidade a todos os que terminam o curso de Medicina de fazerem a formação especializada. Se no passado, ficavam 100% preenchidas e sobravam candidatos, agora sobram vagas. Porquê?
O bastonário entende que este é mais um sinal do que está a acontecer no Serviço Nacional de Saúde (SNS). "Todos os dias saem médicos com experiência, os concursos ficam com 40% de vagas por ocupar, os médicos em idade de reforma já não querem ficar mais tempo e agora os jovens médicos também não querem entrar na especialidade", resume Miguel Guimarães, considerando que tudo está relacionado com a falta de valorização do trabalho dos médicos no SNS.
O comunicado da ACSS apresenta uma visão menos negra: "No total, 222 jovens médicos que não tinham escolhido especialidade nos anos anteriores optaram, agora, por regressar ao SNS e escolheram uma das vagas disponíveis". Tal número, refere o organismo tutelado pelo Ministério da Saúde, "compensou os que, podendo fazer a sua escolha pela primeira vez, não o fizeram".
71 vagas de Medicina Geral e Familiar por preencher
Na mesma nota, a ACSS refere que seis das 48 especialidades não ocuparam 100% das vagas, sem indicar quais são.
Uma delas é Medicina Geral e Familiar, que preencheu 503 vagas de um total de 574.
Em resposta ao JN, a ACSS acrescentou que as outras especialidades com vagas por preencher são Medicina Interna (61), Imunohemoterapia (9), Patologia Clínica (7), Saúde Pública (5) e Farmacologia Clínica (2).
No comunicado, a ACSS realça "o número de colocados em Pediatria (102), mais do dobro do valor registado em 2012 (47), e em Ginecologia-Obstetrícia (53), onde se verificou um aumento de 10% face ao ano transato".
E acrescenta que "nos últimos dez anos, as colocações nas especialidades de Psiquiatria (72) e de Psiquiatria da infância e da adolescência (14) aumentaram 62%, evidenciando o progressivo investimento na prestação de cuidados de saúde mental aos portugueses e na capacitação do SNS".
Os 1883 médicos que escolheram a área de especialização neste processo começam a formação a 1 de janeiro de 2023.