O Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida (CNECV) aponta vários problemas à terceira proposta de regulamentação da gestação de substituição, apresentada pelo Ministério da Saúde, como não haver um prazo limite para a entrega do bebé ou obrigar a mulher a explicar porque é que não foi mãe antes.
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Num parecer divulgado esta segunda-feira, o organismo presidido por Maria do Céu Patrão Neve sublinha a necessidade de maximizar a proteção da criança nascida de “barriga de aluguer” e considera “eticamente censurável a demissão das obrigações do Estado de regular matérias que se relacionam com o Direito de Família”. Fala num "significativa involução do ponto de vista ético” e num "articulado legal formal”.
As maiores críticas vão para a possibilidade de uma mulher, que ainda não tenha sido mãe, poder ser “barriga de aluguer” desde que indique as “concretas circunstâncias que o impediram”. “Tratar-se-á de um lapso do legislador uma vez que nenhuma mulher pode ser chamada a justificar o facto de não ser mãe”, referem os conselheiros. Nas propostas anteriores, era referido que a gestante não podia ter mais de 44 anos e que teria de já ter sido mãe.
O CNECV reafirma a necessidade de estabelecimento de um prazo razoável para o exercício do direito de arrependimento, por parte da gestante, quanto à entrega da criança aos beneficiários e progenitores biológicos. A nova regulamentação não avança uma data para a grávida de substituição “entregar” o bebé à família biológica, apontado como único critério as “condições físicas e psíquicas adequadas”. Os conselheiros entendem que, ao não estabelecer um prazo, a lei deixa a criança e os pais “totalmente desprotegidos”.
A determinação da identidade e das relações familiares, designadamente de parentesco da criança, é outra das preocupações. O bebé só pode ser registado no Registo Civil com o nome de dois pais e, na proposta anterior, no caso de a gestante renunciar ao acordo e quiser ficar com o bebé, pode fazê-lo, mas os beneficiários que tenham contribuído com gâmetas “podem exigir à gestante que um dos seus nomes” faça parte do assento de nascimento.
Na nova proposta, segundo o Conselho, não é certo que o companheiro (ou companheira) da grávida não possa registar a criança como sendo sua filha, afastando quem doou “material genético”.
“Gera incerteza e insegurança”
De acordo com o CNECV, a proposta de regulamentação da gestação de substituição apresentada tornou-se “um mero processo administrativo” que “gera incerteza e insegurança para as partes envolvidas”.
“Por esquecimento de proteção”, o CNECV alega que a nova sugestão de alteração ignora “o superior interesse da criança nascida por gestação de substituição” na relação com os pais biológicos no caso da gestante desistir de entregar o bebé.