Espetáculos em direto na Internet e videochamadas entre amigos substituíram as festas presenciais. Inquérito ao uso de substâncias no confinamento mostra forte quebra nos jovens abaixo dos 25 anos.
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O consumo de drogas em festas online disparou durante o confinamento e já é o segundo maior contexto em que se usam substâncias psicotrópicas, a seguir ao consumo solitário. Com as discotecas e as festas de música eletrónica proibidas, os grupos de amigos que se juntavam duas ou três vezes por mês em raves presenciais utilizam, agora, plataformas como o Twitch, o Facebook ou o Instagram para partilharem o que estão a consumir enquanto ouvem sons como techno, trance e derivados.
Um inquérito realizado pela associação Kosmicare, durante o primeiro confinamento, a 538 pessoas, demonstra que houve "uma diminuição abrupta do consumo com amigos em espaços abertos e em festas ou festivais", ao passo que aumentou muito o consumo em contextos virtuais como videochamadas ou festas online.
Entre os inquiridos, apenas 3,4% consumiam droga em videochamadas com os amigos antes da pandemia, mas durante o confinamento este número aumentou para 26,1%. Já o consumo com amigos em raves online subiu de 5,8% para 16,2%. O uso solitário também subiu de 27,8% para 39,6%.
Por oposição, o consumo em casa com amigos baixou de 48,8% para 17,6%, na rua com amigos passou de 52,7% para 7,2% e com amigos em festas ao ar livre baixou de 57,5% para uns residuais 3,1%.
"Há várias plataformas que organizam festivais, coletivos de DJ que têm várias coisas em streaming que podem ser como discotecas", constata Helena Valente, da Kosmicare, associação fundada em 2016 para coordenar projetos de investigação e intervenção na área de redução de riscos em ambientes recreativos.
Nessas discotecas virtuais, acrescenta, "as pessoas podem estar todas a ouvir música num mesmo momento e, às vezes, existem chats em que as pessoas podem estar a comentar sobre a música ou sobre o que estão a consumir".
partilham o que fazem
No Facebook, Twitch ou Instagram, a maioria das páginas ligadas a amantes da música techno ou trance têm espetáculos que aconteceram ao vivo, geralmente visualizados por milhares de pessoas que comentam de forma mais ou menos explícita o que estão a consumir. "Fumo, cheiro e bato com os dois pés", pode ler-se na sala de conversa de um DJ set de trance. "Isto é bom, mas com sal [cocaína] é melhor", lê-se num dos diretos de um dos DJ mais conhecidos de Portugal na área da eletrónica. "Uma gelatina [LSD] depois da janta vinha que nem ginjas", lê-se ainda noutro direto de um DJ nacional de trance.
Outro fenómeno detetado pela Kosmicare no inquérito foi a forte quebra no consumo por parte de jovens entre os 18 e os 25 anos. Esta foi a única faixa etária em que diminuiu o consumo de álcool e drogas, o que se explica pela ausência de contextos recreativos fora de casa, justifica Helena Valente: "Estamos a falar de uma população de estudantes ou trabalhadores em início de carreira, em que muitos ainda moram com os pais e não consomem em casa".