No primeiro trimestre deste ano, gastos aumentaram 11,4% à custa da subida dos custos com pessoal e com medicamentos. Resultados preocupam, mas não surpreendem.
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A despesa do Serviço Nacional de Saúde (SNS) continua a crescer a um ritmo descontrolado. No primeiro trimestre do ano aumentou 11,4%, o que corresponde a mais 394 milhões de euros face ao período homólogo. Os custos com pessoal, inflacionados pelas valorizações remuneratórias e pelos incentivos pagos aos profissionais de saúde, e os gastos com medicamentos são os principais responsáveis pelo acréscimo da despesa. Os resultados não surpreendem, mas preocupam.
A última síntese de execução orçamental da Direção-Geral do Orçamento (DGO), relativa a março, permite um olhar sobre o trimestre e coloca novamente as contas do SNS no vermelho. O saldo do SNS situou-se em 199,6 milhões de euros negativos, uma deterioração de 212 milhões de euros face ao mesmo período do ano passado.
No relatório, a DGO detalha que o aumento da despesa (11,4%) é influenciado pela subida dos custos com pessoal (13,5%) e com fornecimentos e serviços externos (9%). A despesa com pessoal reflete a execução de medidas como “as valorizações remuneratórias aplicadas aos trabalhadores em funções públicas; os incentivos às equipas das Unidades de Saúde Familiar modelo B; a alteração da estrutura remuneratória da carreira especial médica, a nova carreira especial de Técnico Auxiliar de Saúde; e a atribuição de um suplemento remuneratório aos médicos para assegurar o funcionamento dos serviços de urgência”.
Do lado dos fornecimentos e serviços externos, há um aumento da despesa com produtos das farmácias (11,9%), produtos farmacêuticos (8,2%), por aumento da atividade assistencial, e encargos com serviços especializados (14,1%), que incluem os prestadores de serviços médicos e de enfermagem para assegurar as urgências e a resposta à atividade assistencial, nota a DGO.
Na última década, o orçamento do SNS quase duplicou, passando de cerca de nove mil milhões de euros em 2015 para quase 17 mil milhões em 2025, mas nunca foi suficiente para cobrir as despesas. Suborçamentação? Ineficiência? Há várias teorias e a culpa não morre solteira.
Registo de “bar aberto”
O ex-ministro da Saúde Adalberto Campos Fernandes fala num “efeito de arrastamento” e reparte as responsabilidades pelos governos que no período pós-pandemia não introduziram mecanismos de controlo da despesa da Saúde. “Era uma tempestade que se anunciava, ando a dizer isto há dois ou três anos”, recorda o médico, considerando que depois da pandemia entrámos em “registo de bar aberto”.
Falhou a regulação do acesso ao medicamento e a negociação de custos com as farmacêuticas, faltou controlo da eficiência das unidades de saúde, sobrou “experimentalismo acrítico”, cujo expoente foi a criação “precipitada” das Unidades Locais de Saúde (ULS), em especial as universitárias. “Há uma enorme mancha de ineficiência na gestão e a criação de monstros burocráticos não ajuda”, sinaliza.
O representante dos administradores hospitalares discorda. “Não há evidência que a criação das ULS tenha prejudicado a eficiência”, diz Xavier Barreto. Aliás, diz, os estudos mostram que a articulação de cuidados tende a ser mais eficiente. E este aumento da despesa “não é culpa das ULS, tem a ver com o aumento dos custos com pessoal e medicamentos”. Eram custos previsíveis e Xavier Barreto lamenta que o orçamento de 2025 não os tenha contemplado, obrigando os hospitais a acumularem dívida.
Questionado pelo JN, o Ministério da Saúde optou por não responder.