Portugueses que estão em Wuhan poderão ser isolados assim que chegarem a Portugal. DGS defende estratégia montada. Contágio sem sintomas cria maior incerteza.
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O alastrar do novo coronavírus levou a uma corrida às máscaras de proteção, sobretudo por pessoas orientais que as querem enviar para os países de origem. Perante a apreensão gerada pela doença, os hospitais de São João, no Porto, e Curry Cabral e Estefânia, em Lisboa, prepararam planos de contingência, caso o vírus chegue a Portugal. Esta terça-feira, a doença propagava-se a grande velocidade na China, a ponto de Bruxelas acionar o Mecanismo de Proteção Civil para repatriar os europeus que estão em Wuhan, a cidade mais afetada.
A corrida às máscaras de proteção está a esgotar os stocks das farmácias, confirmou a associação do setor. O JN contactou oito (no Porto, Braga, Guimarães e Lisboa) e todas tiveram maior procura. Há portugueses a comprar, mas a maioria são cidadãos orientais, para as enviar para os países de origem. "Um senhor de Hong Kong comprou em Portugal porque a família não conseguia adquiri-las lá", disse um responsável da Farmácia Henriques, no Porto.
Os fornecedores não estão a dar vazão à procura e há já locais sem as máscaras mais baratas. "O que há disponível tem preços mais elevados", assinalou Conceição Machado, da Farmácia Estação, no Porto.
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Não há qualquer caso suspeito de infeção pelo coronavírus em Portugal, mas o país está a preparar-se. No caso dos portugueses a repatriar, a Direção-Geral de Saúde (DGS) vai avaliar o nível de risco de cada um, à chegada a Portugal.
Para já, a medida mais gravosa é o isolamento social, em que a pessoa fica em casa durante os 14 dias de incubação do vírus. Foi este o sistema seguido na gripe A, com sucesso, disse Graça Freitas, diretora-geral de Saúde. Se o vírus alastrar, o protocolo será adaptado.
Cartazes para hospitais
No Porto, o Hospital de São João "implementou um plano de contingência específico", que passa pela "definição de circuitos de doentes e procedimentos de prevenção e controlo de infeção", disse fonte oficial. Se algum infetado chegar às urgências, os serviços já conhecem os critérios de sinalização de casos suspeitos. E para direcionar os doentes serão afixados cartazes nos hospitais, disse Graça Freitas, à RTP3.
O JN contactou os hospitais Curry Cabral e Estefânia, mas não teve resposta em tempo útil. Os três são os hospitais de referência para vírus deste tipo desde a epidemia da gripe A.
Contágio sem sintomas
As medidas tomadas por Portugal são as corretas, garante Filipe Froes, que encabeça um gabinete de crise da Ordem dos Médicos: "Estamos na fase de contenção e controlo". O protocolo prevê medidas mais musculadas, mas não devem ser tomadas antes do tempo, para não esgotar os recursos existentes, adiantou.
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Na Europa, em todo os casos confirmados, a pessoa foi contagiada por alguém que tenha estado na China, e Portugal tem "a vantagem" de não ter voos diretos para aquele país. Mas a possibilidade de contágio por alguém ainda sem sintomas da doença, como aconteceu na Alemanha, é o "maior fator de incerteza", admite Graça Freitas. A boa notícia é que o reduzido número de casos confirmados na Europa indicia que esta não é a forma de contágio mais frequente.
Dois aviões da UE vão à China mas só um pode trazer portugueses
Um de dois primeiros aviões enviados pela União Europeia (UE), para repatriar cidadãos europeus de Wuhan, chega esta quarta-feira à China, mas só irá trazer franceses a bordo. Há um segundo voo depois de amanhã. Porém, o Governo português não garante que os cerca de 20 cidadãos nacionais, que estão na região onde eclodiu a epidemia, possam ser já retirados por essa aeronave.
O Mecanismo Europeu de Proteção Civil (MPCU, em sigla inglesa) anunciou, ontem, que os aviões rumarão à China após um pedido da França. Tendo em conta que o MPCU só atua após a ativação por um dos estados-membros, com o qual dividirá os custos das viagens, a primeira aeronave trará unicamente 250 franceses.
Ao JN, Balazs Ujvari, porta-voz do comissário da Gestão de Crises, adiantou que "ainda não há uma lista de nacionalidades de quem virá no segundo voo", estimando em cerca de cem o número de lugares disponíveis. "Os portugueses devem requerer a vinda nesse avião", disse.
Queixas de portugueses
Questionados pelo JN, a Direção-Geral de Saúde, a Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil e os ministérios da Saúde e Administração Interna remeteram para os Negócios Estrangeiros (MNE) explicações sobre a estratégia que está a ser articulada entre todas estas entidades.
O MNE, liderado por Santos Silva, disse que se "encontram a ser definidos em Bruxelas e em Pequim, em sede de coordenação entre os estados-membros da UE, os preparativos para uma operação de evacuação coordenada entre vários países europeus".
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Santos Silva adiantou no Parlamento, na segunda-feira, que 14 portugueses manifestaram vontade de sair de Wuhan. Ontem, André Vitorino, que vive em Guangzhou, deu voz à revolta dos conterrâneos. "A comunicação não está a chegar rapidamente. Temos de estar constantemente a fazer uma tradução de mandarim para português para tentarmos perceber como está o caso", apontou à Renascença.
Ao JN, o Governo desmentiu esta versão, garantindo que a informação esta a ser "disponibilizada aos cidadãos nacionais em língua portuguesa através da plataforma "We Chat"".
Na página da Internet da Embaixada de Portugal na China, o último aviso já data de domingo. Mas os serviços diplomáticos terão enviado uma nota aos portugueses de que estará a ser fretado um avião civil para os retirar.
Aos 14 portugueses poderão ainda juntar-se 13 cabo-verdianos que estudam em Wuhan. Cabo Verde lançou ontem um apelo a Portugal para que resgate os seus jovens.