Estima-se que todos os anos cerca de 100 mil pessoas tenham necessidade de cuidados paliativos, mas a resposta só chegará a cerca de metade e de forma desigual no país. Muitos morrem sem nunca ter experimentado estes serviços multidisciplinares e especializados que visam aliviar o sofrimento.
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Nos últimos meses, as carências acentuaram-se porque "não há estratégia, não há investimento na formação, não há monitorização do trabalho feito, não há incentivos" e os profissionais estão a sair para outros desafios onde são mais bem remunerados. A Comissão Nacional de Cuidados Paliativos está sem liderança há mais de um ano e embora a ministra da Saúde tenha afirmado em fevereiro que a nomeação ou renomeação desta equipa estava para breve, tal ainda não aconteceu. O JN questionou a tutela sobre esta nomeação, mas não obteve resposta em tempo útil.
A maioria das equipas não cumpre os rácios mínimos de médicos, enfermeiros e psicólogos, e há algumas que nem médico permanente têm. O retrato é feito por Catarina Pazes, presidente da APCP, que tem em mãos uma análise aos cuidados paliativos em Portugal.
O estudo, a ser ultimado, foi feito com base nas perceções das equipas, e identifica como uma das medidas mais urgentes o reforço e a qualificação dos recursos humanos, assim como a possibilidade de os profissionais progredirem na carreira. "Há equipas sem um médico a tempo inteiro, isto é muito grave", afirma a responsável, explicando que "o facto de existirem equipas não significa que estejamos a dar resposta".
Os cuidados paliativos são transversais aos cuidados primários, hospitalares e continuados. Mas “em todas as áreas há défice e em todas há dificuldade em perceber o que está a acontecer”, salienta Catarina Pazes. O BI dos Cuidados Paliativos, considerado uma ferramenta essencial para monitorizar as equipas e o trabalho, foi prometido pela ministra Marta Temido em 2020, mas nunca avançou.
Vão ganhar muito mais
Nos hospitais, prossegue a enfermeira, há equipas que só fazem algumas horas porque estão alocadas a outras funções. “Não basta dizer que o hospital tem equipa, é preciso perceber a resposta efetiva que existe”, insiste.
Nos caso das equipas comunitárias, que funcionam ao nível dos cuidados primários, “os médicos estão a sair para as unidades de saúde familiares e outros contextos mais apelativos”.
Manuel Barbosa, coordenador da Equipa Comunitária de Suporte em Cuidados Paliativos da ULS de São João, corrobora. “Não consigo ter médicos porque vão para as USF ganhar três vezes mais, porque recebem incentivos e podem progredir na carreira”, realça. A equipa que coordena dá resposta à população da Maia e de Valongo (ler texto ao lado), mas os rácios estão muito abaixo do adequado: são três médicos a tempo inteiro quando deveriam ser cinco, são quatro enfermeiros a fazer o trabalho de seis, e uma assistente social e uma psicóloga em vez de duas, respetivamente.
Receber incentivos
Para estancar as saídas, a associação defende que as equipas sejam reconhecidas como unidades funcionais para poderem evoluir num modelo semelhante ao das USF-B. Este modelo que funciona nos centros de saúde permite contratualizar objetivos e associa incentivos ao desempenho das equipas.
Outro passo importante para quem está no terreno é a criação da especialidade de medicina paliativa pela Ordem dos Médicos (atualmente há a competência em medicina paliativa). A especialidade garante a progressão na carreira e “assegura a qualidade da formação”.
Identidade
Multidisciplinar
As equipas de cuidados paliativos são constituídas no mínimo por médico, enfermeiro, psicólogo e assistente social. Podem ainda ter fisioterapeuta, terapeuta ocupacional nutricionista e assistente espiritual.
Diferentes respostas
Além das equipas comunitárias de suporte em cuidados paliativos, há as equipas intra-hospitalares (apoio aos doentes internados) e as unidades de cuidados paliativos (camas) que integram a rede de cuidados continuados.
Recursos na pediatria
Para a pediatria há 12 equipas de cuidados paliativos constituídas, mas nem todas têm o mínimo de profissionais a trabalhar em pleno.