Na comemoração do Dia Mundial da Dermatite Atópica, o JN falou com algumas das pessoas que mais contacto têm com esta realidade. Os sintomas visíveis e impeditivos de certas atividades causam o maior constrangimento na vida dos pacientes. Gastos elevados, stress, noites mal dormidas e quebras na produtividade são parte da vida diária de quem tem esta doença, que, por enquanto, ainda não tem cura.
Corpo do artigo
Na celebração do Dia Mundial da Dermatite Atópica, esta quarta-feira, dia 14, o número de portugueses e outras pessoas em todo o mundo que sofrem da doença é ainda incerto. Estima-se que cerca de 20% das crianças em Portugal sofram de dermatite atópica, percentagem mais expressiva do que nos adultos (entre 4% a 7% dos adultos) e os sintomas podem dificultar muito a vida dos seus pacientes.
Bruno Duarte, médico dermatologista no Hospital de Santo António dos Capuchos, em Lisboa, onde acompanha cerca de 200 pacientes com esta doença, explica que não ir à praia ou ao ginásio, usar mangas compridas o ano inteiro, tomar banhos de água fria para não irritar a pele e ser confrontado com lençóis sujos de sangue e comichão diárias são alguns dos desafios vividos no dia a dia por quem sofre de dermatite atópica.
Todos estes constrangimentos carregam consigo um peso psicológico difícil de suportar, sendo essa uma das faces mais "escondidas" de uma doença que vai muito para além da pele. Segundo Bruno Duarte, a dermatite atópica é "emocionalmente debilitante para doentes e familiares, sendo causa de exclusão social e absentismo social, laboral e escolar, noites mal dormidas, prejuízo do desempenho escolar e profissional e gastos económicos avultados em tratamentos e consultas".
Iva Reis, de 44 anos, desde os 4 que sofre de dermatite atópica. Ao JN, afirma que "a pior parte é realmente a questão dos olhares e dos comentários sobre a aparência, afetam muito a autoestima". Iva conta também que, ocasionalmente, perdia noites inteiras de sono e explica que, derivado desse problema, "a pessoa fica debilitada e o stress acaba por afetar a produtividade".
A doença pode manifestar-se de maneiras diferentes ao longo dos anos e nem todos os pacientes sofrem de maneira igual. O médico Bruno Duarte descreve que as crianças são afetadas, principalmente, na face enquanto joelhos, cotovelos, pescoço e mãos são as principais partes do corpo onde se manifesta nos adolescentes e adultos. Tendo crescido com a doença, Iva Reis confirma e confessa que, psicologicamente, sofreu bastante na adolescência com o agravar dos sintomas.
Avanços na investigação
A dermatite atópica não tem cura, mas Bruno Duarte entende que estamos perante uma "promissora (R)evolução terapêutica".
De acordo com o dermatologista, em manifestações mais leves da doença, os cuidados mais básicos como "uso regular de emolientes e de produtos de higiene adequados, bem como o uso proativo de anti-inflamatórios tópicos é uma estratégia habitualmente muito eficaz". Mas nos casos mais graves esses tratamentos não são suficientes.
Nesses, "é necessário intervir com tratamentos sistémicos e é neste campo que os avanços científicos e terapêuticos têm sido impressionantes". Sublinha a importância que o medicamento Dupilumab (o primeiro medicamento biotecnológico) representa para os pacientes de dermatite atópica e conta que já são perto de 150 os que beneficiam deste tratamento no Hospital de Santo António dos Capuchos.
Para além do Dupilumab, desde 2017, já foi aprovado mais um medicamento biotecnológico. "O presente e o futuro são muito promissores", observa Bruno Duarte.
Iva Reis foi uma das pacientes que experimentou diversos métodos diferentes à base de cremes, cortisona, comprimidos e medicamentos injetáveis até que se deparou com o Dupilumab, que toma há cerca de dois anos e revela que esta terapêutica conseguiu retirar-lhe todos os sintomas da doença.
Predisposição genética
Por ser uma das doenças mais debilitantes pela "elevada prevalência e impacto multidimensional que comporta para os seus doentes", a Associação Dermatite Atópica Portugal (ADERMAP), criada em 2018, disponibiliza apoio para quem mais precisa.
Em entrevista ao JN, Joana Camilo, presidente da associação, explica que estão a ser feitos esforços para informar o maior número possível de pacientes mas também pessoas que não sofrem de dermatite atópica. Um desses esforços passa pela criação de um diretório de especialistas que poderão ajudar a encontrar um médico dermatologista especializado perto da área de residência de cada paciente.
Esta é, aliás, uma das principais questões apontadas por Joana Camilo, que reconhece os bons cuidados e tratamentos que o SNS providencia em questões relacionadas com a dermatite atópica. Mas lamenta que as cidades mais interiores tenham falta de especialistas para responder às necessidades dos pacientes.
Os elevados encargos no orçamento familiar (nalguns casos superiores a 150 euros por mês por pessoa) são outra das realidades que a ADERMAP procura trazer à atenção do público. A predisposição genética da dermatite atópica pode levar a que mais do que um caso seja registado dentro de cada família, o que multiplica as despesas, já por si elevadas, com medicamentos, consultas e produtos de higiene especializados. Joana Camilo é um exemplo dessa realidade, com a sua mãe, ela própria e o seu filho a sofrerem de dermatite atópica.
Focada agora em melhorar a informação que se tem sobre a doença em Portugal, a associação pretende apoiar um estudo que determine a prevalência total da dermatite atópica no país e chegar a um número real de pacientes. Para tal, afirma estar em contacto permanente com hospitais e profissionais de saúde, que são também quem mais reencaminha associados para a ADERMAP.
As relações estabelecidas com entidades semelhantes noutros países, com especial destaque para Espanha, são outro exemplo dado pela presidente da associação quanto ao trabalho desenvolvido para melhor informar e sensibilizar a população geral sobre as complicações que a doença comporta.