Doentes e associações de diabéticos querem que o uso de bombas de insulina com automatismos seja alargado com comparticipação do SNS. Esta segunda-feira, Dia Mundial da Diabetes, o Governo avança com a criação de um grupo de trabalho para atualizar a estratégia de acesso.
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Susana Martins, 43 anos, vive com diabetes há 30 anos e tem de gastar muito dinheiro todos os meses para poder ser uma exceção neste problema. Em abril adquiriu uma bomba com automatismos (pâncreas artificial) para conseguir controlar melhor os níveis de açúcar no sangue e, assim, "ganhar qualidade de vida e liberdade". Mas teve de o fazer sem comparticipação do serviço público, pagando "mais de mil euros" pela bomba e assumindo todos os meses custos com consumíveis, como os cateteres, que ascendem a algumas centenas de euros.
24 883 pessoas tinham, até ontem, assinado a petição pelo "acesso aos sistemas híbridos de perfusão subcutânea contínua de insulina (bombas de insulina)
Já Catherine Santana e Luís Barroca, também diabéticos, têm bombas sem automatismos atribuídas pelo SNS e esperam poder evoluir para os equipamentos mais modernos, pois não têm como suportar a despesa. Catherine, que começou a usar bomba quando engravidou, assegura que, "quanto mais automatizada for a bomba, mais fácil é controlar os níveis" de açúcar no sangue. Luís, que antes da bomba fazia muitas hipoglicemias, anseia por ganhar ainda mais "qualidade de vida".
José Manuel Boavida, presidente da Associação Protetora dos Diabéticos de Portugal (ADDP), defende que deve ser facilitado o acesso a estas bombas com automatismos e, hoje, Dia Mundial da Diabetes, vai reunir-se com o ministro da Saúde e entregar na Assembleia da República uma petição com quase 25 mil assinaturas para reforçar esse pedido.
"Poupar dinheiro"
Neste momento, apenas umas "dezenas de jovens" terão as bombas com automatismos comparticipadas pelo SNS, mas é preciso alargar o uso pois ajudam "os doentes a manterem-se mais tempo dentro dos valores normais" de açúcar no sangue, diz Boavida. A APDP estima que existam em Portugal cerca de 30 mil diabéticos tipo 1, sendo que cerca de "um terço" terão "capacidade e condições" para usar esta bomba.
Os sistemas de bombas, que substituem procedimentos como as múltiplas injeções com canetas, "podem ser mais caros mas, se evitarmos a retinopatia, doenças cardíacas e outras complicações, estamos a poupar muito dinheiro", adianta Luísa Barros, coordenadora do grupo de estudos Diabetes Mellitus da Sociedade Portuguesa de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo.
Esta segunda-feira, o Ministério da Saúde publica em "Diário da República" um despacho que cria um Grupo de Trabalho para "atualizar a estratégia de acesso a tratamento com dispositivos de perfusão subcutânea contínua de insulina, conhecidos como bombas de insulina automáticas". Deverá apresentar, no prazo de 120 dias, uma proposta de atualização da estratégia de acesso e propor medidas para fomentar a igualdade no acesso aos novos dispositivos, especialmente entre crianças e jovens, "pelas melhorias significativas que os dispositivos de nova geração representam na qualidade de vida destas pessoas e também na maior segurança para famílias e cuidadores".
Ao JN, a Direção Geral de Saúde (DGS) indicou que, até 10 de novembro, havia 4.133 utentes com diabetes tipo 1 "registados como em tratamento com dispositivos de Perfusão Subcutânea Contínua de Insulina (PSCI) nos 25 Centros de Tratamento validados pela DGS, espalhados por todo o país". Em agosto "foram adjudicados os primeiros dispositivos híbridos e adesivos aos Centros de Tratamento, atualmente a ser colocados nos utentes", acrescenta.
A utilização dos dispositivos PSCI requer "um processo de formação, ensino e acompanhamento por parte dos utilizadores e cuidadores" e "os recursos dos Centros de Tratamento não são ilimitados", sublinha a DGS, explicando que "há uma capacidade máxima anual de colocação de dispositivos". "Assim sendo, a colocação/substituição destes novos dispositivos terá de ser realizada de uma forma faseada até termos todos os doentes que têm indicação clínica com acesso a este tipo de dispositivos".
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Tipos de diabetes
Na diabetes tipo 1, que pode surgir ainda na infância, o pâncreas deixa completamente de produzir insulina. Na tipo 2, mais frequente e muitas vezes resultado do estilo de vida, o organismo produz, mas é insuficiente. Há ainda a gestacional e outras, mas são mais raras.
Tratamentos
Podem-se fazer múltiplas administrações de insulina por dia, com uma caneta com agulha, após uma picada no dedo para ver o nível de glicose (açúcar) no sangue. As bombas administram a insulina por uma cânula, mas os doentes têm de a mudar de lugar periodicamente e indicar o que comem.
Outras doenças
Os diabéticos têm maior risco de contrair doença renal crónica. Segundo Edgar Almeida, presidente da Sociedade Portuguesa de Nefrologia, "em 2020, das 2101 pessoas que começaram a fazer diálise em Portugal, 722 tinham diabetes". É causa mais frequente de perda visual irreversível na população adulta nos países industrializados.