Manuela Melo estava em casa, no Porto, quando, a meio da noite, o telefone tocou. "Era uma amiga a dizer que havia uma movimentação de tropas em Lisboa. Ela não sabia bem do que se tratava, por isso liguei aos meus colegas jornalistas e fui logo para a RTP. O diretor, com ligações ao antigo regime, estava confuso e assustado", recorda.
Corpo do artigo
Jornalista na estação televisiva pública, assistiu à ocupação do canal. As tropas especiais de Lamego invadiram a RTP durante a tarde de 25 de Abril na tentativa de emitir um comunicado ao país, uma vez que a transmissão de Monsanto havia sido sabotada, impossibilitando emissões do Lumiar. "Lembro-me como se fosse hoje, foi inacreditável. Os militares entraram e, pacíficos, disseram-nos para não ficarmos aflitos", relembra.
Manuela Melo cresceu na vila de Vale de Cambra e assistiu a nítidas desigualdades sociais que hoje recorda: "Vi a exploração das pessoas, as injustiças que sofriam. O meu pai, resistente a Salazar, sempre me alertou e sensibilizou para isso".
Intimamente ligada à vida teatral, foram muitas as peças que viu serem censuradas ou nem chegarem a passar para o público. "No dia da estreia da Casa de Bernarda Alba, a PIDE invadiu o Teatro Experimental do Porto para retirar adereços e cartazes".
O essencial do programa do Movimento das Forças Armadas traduz-se nos "3 D": democratizar, descolonizar e desenvolver. Para Manuela Melo, "a descolonização fez--se, a democracia faz-se todos os dias e o desenvolvimento mais ou menos". "Os atuais problemas são culpa de recentes gerações de governos e cidadãos, a crise é difícil mas por nada voltar a 24 de abril de 1974".
A jornalista não imagina a sua vida sem a revolução e reforça que "as pessoas começaram a correr na rua, os carros paravam nas passadeiras, começámos a ver-nos como pessoas."