Pandemia está a agravar, também, conflitos parentais e a procura pelo serviço jurídico do Instituto de Apoio à Criança triplicou face ao ano de 2019.
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Se o exercício das responsabilidades parentais já não era pacífico, a pandemia veio agora dar-lhe escala, com os apelos ao serviço jurídico do Instituto de Apoio à Criança (IAC) a triplicarem face a 2019. Conflitos com crianças no seu centro, que cada vez mais procuram ajuda junto da Linha SOS Criança. A sinalização de situações de perigo também está em crescendo.
De acordo com dados facultados ao JN pelo IAC no primeiro semestre deste ano, o serviço jurídico do instituto recebeu 610 apelos, mais 43% face a período homólogo do ano passado e o triplo quando comparado com 2019. Daquele total, a maioria prende-se com questões relativas ao exercício das responsabilidades parentais (155) e sinalização de situações de perigo (82). "A pandemia deu o mote ao conflito parental, deitou achas para a fogueira", diz a coordenadora do serviço jurídico. Segundo Ana Perdigão, os confinamentos estão associados aos picos de procura. Mas, ainda agora, "outubro, subiu em flecha". A maioria dos pedidos, diz, prende-se com a "alteração do regime [de regulação] e o seu incumprimento".
Com uma luta entre progenitores. Ou porque "teve covid, ou porque tem os avós em casa, ou porque "tenho covid e não os vou buscar" e ficam lá eternamente", num sem-fim de argumentos, recorda. Também receberam contactos de pais, com guarda partilhada, que ligaram a perguntar se era juridicamente possível passar para alternância de 15 em 15 dias para protegerem os filhos do SARS-CoV-2. "O bem jurídico a proteger era a saúde", vinca.
Mas àquele serviço jurídico, gratuito, são reportados também pedidos de "técnicos, diretores de turma, psicólogos", sobretudo com "dúvidas jurídicas". Nestes primeiros seis meses, sinalizaram ou encaminharam 82 situações de perigo. "Face a 2019, é imenso".
"o elo mais fraco"
À linha SOS Criança, chegam, sobretudo, adolescentes deprimidos, revela o seu coordenador. "É preciso dizer isto muitas vezes: o elo mais fraco é sempre a criança. Quando a família não consegue filtrar as alterações que sofre, elas recaem na criança. Que se ressente do ponto de vista emocional, psicológico e social", desmonta Manuel Coutinho.
No primeiro semestre deste ano, aquela linha, gratuita e assegurada por psicólogos - o número de contacto é o 161 111 -, atendeu 997 chamadas numa média mensal de 166 atendimentos. A que se junta, "na retaguarda, uma equipa de psicólogos que faz atendimento presencial a estas crianças". No mesmo período, realizaram-se 1739 consultas, cerca de 145 por mês.
"É um serviço sempre a pulsar e cada vez mais um serviço de primeira necessidade", afirma o psicólogo. Chegam-lhe, sobretudo, "quadros depressivos, ansiosos, fóbicos, crianças com a saúde mental enfraquecida, a maioria adolescentes". Os menores que assim o necessitem têm, depois, apoio psicológico e social, numa tríade em que entram os pais. Porque, explica Manuel Coutinho, a Linha não "necessita de um adulto como intermediário". Da pandemia, resulta a evidência de que "trouxe muito stress e angústia, levando a muitas tensões familiares", concretiza ainda. Acrescida de "intolerância, de insegurança e de agressividade".
À lupa
Serviço de apoio às crianças para exporem os seus problemas e dúvidas, seja por telefone - 116 111 -, email, chat ou WhatsApp. O IAC disponibiliza, ainda, apoio jurídico, psicológico e jurídico.
Linha de apoio à criança desaparecida
Serviço no âmbito do desaparecimento de crianças em articulação com entidades competentes na investigação e entidades judiciais, através do número 116 000. No primeiro semestre deste ano, receberam 48 pedidos, 15 dos quais em abril passado.