Doentes com AVC ou enfarte adiaram pedidos de ajuda, sobretudo na primeira vaga da pandemia. Houve mais casos de paragem cardiorrespiratória.
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O Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM) recebeu mais pedidos de socorro por enfarte, acidente vascular cerebral (AVC) e paragem cardiorrespiratória, num ano com menor procura. Com o tempo entre o início dos sintomas e a chamada para o 112 a agravar-se. O impacto maior sentiu-se na primeira vaga da pandemia, quando o medo afastou milhares das urgências.
Apesar de, no ano passado, ter registado uma quebra de 13% no número de ocorrências, o INEM verificou um aumento dos pedidos de ajuda para casos mais graves. De acordo com os dados facultados ao JN, as ocorrências por paragem cardiorrespiratória subiram 12%, para um total de 21 997.
Também as vias verdes coronária e do AVC - que encaminham estes doentes para o hospital mais bem preparado para os receber - registaram um aumento da procura. Em 2020, os centros de orientação de doentes urgentes (CODU) do INEM acionaram a via verde coronária por 696 ocasiões e a do AVC por 4939.
Já o tempo médio entre o início de sintomas e a chamada para o 112 piorou. Nos enfartes, subiu para as 2.13 horas, mais 21 minutos face ao ano anterior. Nos AVC, chegou-se às 3.45 horas para chamar o INEM.
Os dados dos AVC não são totalmente comparáveis, uma vez que, em fevereiro de 2019, "os critérios de inclusão de doentes na Via Verde AVC passou de 6 para 24 horas desde o início dos sintomas", traduzindo-se num aumento "de doentes com critérios (...) e do tempo" médio, explica o INEM. Em 2019, aquele tempo estava nas 2.31 horas.
Pedidos de ajuda adiados
Ao JN, o responsável pelos CODU do INEM, António Táboas, destaca uma maior quebra da atividade na 1.ª vaga da pandemia, com as ocorrências a caírem 16% em abril. No que aos enfartes diz respeito, "verificou-se um adiamento dos pedidos de ajuda, provavelmente relacionado com o receio dos doentes em procurar ajuda hospitalar". Mesmo assim, o aumento do tempo médio não foi "significativo, cerca de mais 3% a 4%" na janela 2-12 horas para pedido de socorro. Situação agora normalizada, revela.
"As pessoas ficaram mais resguardadas em casa, tinham medo de serem infetadas, mas depois foi-se retomando", frisa o médico António Táboas. Os próprios diretores de serviço já tinham revelado estar a receber, através das vias verdes, doentes mais descompensados. "Com a covid, as pessoas chamaram o INEM pouco e mais tarde, chegando em pior estado, conduzindo a complicações", dizia, recentemente ao JN o cardiologista Filipe Macedo, do Hospital de S. João.
Para as paragens cardiorrespiratórias não há dados de tempo médio, até porque, explica o médico responsável pelos CODU do INEM, "em teoria, é relativamente rápido", a não ser que o doente esteja sozinho. Para o aumento destas ocorrências terá contribuído, admite António Táboas, a própria "covid, que tem esse efeito; bem como outras doenças, com os doentes mais tempo em casa sem pedir ajuda; e a vaga de calor". O certo é que, só quando forem conhecidas as causas de morte de 2020 se poderá perceber o que aconteceu em termos de mortalidade.
Pior no interior do país
Os dados da Via Verde Coronária permitem constatar que o tempo mais alto foi registado em distritos do interior, com Bragança a chegar às 6.27 horas e Vila Real às 4 horas. Nos AVC, Évora e Viana do Castelo tinham os piores tempos: 4.41 e 4.37 horas, respetivamente.
À lupa
Ligue para o 112
É um apelo do INEM. De todos os profissionais de saúde. Dor no peito de início súbito, com ou sem irradiação ao membro superior esquerdo, no caso de enfarte; ou falta de força num braço, boca ao lado ou dificuldade em falar, no AVC. São estes os sinais a estar atento. Sendo o caso, ligue para o 112. As primeiras horas são vitais.
Ocorrências covid
Em 2020, o INEM registou 12 629 ocorrências por covid, incluindo-se aqui a dispneia (falta de ar). A que se juntam 121 262 ocorrências por dispneia.