
Paciente com ECMO - máquina de suporte vital extracorporal que permite a substituição temporária das funções respiratória e circulatória
Leonel de Castro/Global Imagens/Global Imagens
Mais do que lesões pulmonares ou cardíacas - a maioria revelaram-se reversível - os doentes graves de covid-19, que necessitaram de internamento prolongado em Cuidados Intensivos ou em unidades de ECMO, debatem-se com sequelas neuropsicológicas. Nomeadamente, Stress Pós-Traumático. Em linha, aliás, com o que se verifica noutros pacientes de Intensivos.
Evidência apurada pelo Hospital de São João, no Porto, nas consultas de acompanhamento destes doentes após alta. Segundo explica ao JN o coordenador de Medicina Intensiva e do centro de ECMO daquela unidade hospitalar, "o que mais preocupa são as sequelas neuropsicológicas e o descondicionamento físico". Concretamente, revela Roberto Roncon, o "Stress Pós Traumático - é algo que não é infrequente".
Inerentes a internamento prolongado e em linha com o verificado pelo S. João nas consultas de acompanhamento de doentes de Intensivos por outras patologias que não covid. Quanto ao vírus, a maioria dos doentes graves, que necessitaram de Intensivos ou ECMO - máquina de suporte vital extracorporal que permite a substituição temporária das funções respiratória e circulatória -, reverteu as lesões pulmonares e cardíacas.
"Curiosamente, muitas vezes temos o doente pior do que os órgãos. Muitas vezes temos o coração e o pulmão com grande capacidade de recuperação, mas o descondicionamento físico, a necessidade de recuperação prolongada e a falta de estruturas familiares e sociais levam a problemas neuropsicológicos que condicionam mais a qualidade de vida". Processo acompanhado pelo hospital, com referenciação para Psiquiatria.
Do pulmão ao coração
Da "grande angústia" inicial, sem saber "se aquela forma de pneumonia era reversível", a segurança, hoje, "de que isso não é verdade". Sabemos mais da doença. Arma fulcral no combate médico. Hoje. Porque "não se sabe se daqui a cinco anos vamos ter uma doença nova", vinca o intensivista.
Dos cerca de 100 casos que o S. João acompanha, "são raros os que morreram após alta ou foram reinternados". A maioria "recupera o estado de saúde prévio". Segundo Roberto Roncon, "raramente têm sequelas covid cardíacas e as pulmonares são infrequentes".
Entre os raros, duas complicações. "Uma, muita rara, do fungo negro: tivemos casos, mas muito raros". Outra, adianta, "a pneumonia organizativa, em que passados um a três meses de debelar a pneumonia covid podem recrudescer os sintomas respiratórios para uma pneumonia imunológica".
Com mais evidência. "A pneumonia é potencialmente reversível, mas a própria intervenção pode agravar a lesão pulmonar". Falamos da ventilação invasiva e não invasiva, que podem "agravar a lesão provocada pela SARS CoV-2", podendo originar fibroses. Ou seja, podemos ter "alteração pulmonar não pela doença, mas pelo tratamento". Razão pela qual, sublinha, "o futuro é evitar a ventilação mecânica invasiva".
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Follow-up
O São João está a acompanhar cerca de 100 doentes covid de Cuidados Intensivos e ECMO. Três a seis meses após alta, "é feita uma avaliação global, em termos de qualidade de vida", numa articulação estreita com Pneumologia e Cardiologia.
Mortalidade variável
A taxa de mortalidade nos Cuidados Intensivos do Hospital de S. João "variou de onda para onda", entre os 15% a 20%. No Centro de Referência de ECMO, que recebeu quase 80 doentes de todos o país, oscilou entre 30% a 40%, sendo superior na 2.ª vaga.
