A vice-presidente da Sociedade Portuguesa de Diabetologia (SPD), Mariana Monteiro, defende os doentes diabéticos deveriam ser sinalizados como prioritários na dispensa de medicamentos pelas farmácias, depois de terem sido registadas ruturas em fármacos como o Ozempic.
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A auditoria do Infarmed sobre medicamentos antidiabéticos, entre eles o Ozempic, continua em curso, após terem sido registadas ruturas nos stocks das farmácias em Portugal. O fármaco formulado para o tratamento da diabetes tipo 2 tem sido usado também para a perda de peso. No entanto, apenas é comparticipado pelo SNS caso o doente tenha diabetes tipo 2 e um índice de massa corporal superior a 35.
Para Mariana Monteiro, é "essencial garantir que estes doentes [diabéticos] tenham acesso prioritário" na hora da compra dos medicamentos.
"Existem algumas farmácias que têm os seus clientes habituais e têm uma estrutura montada para que o medicamento não lhes falte", afirma a vice-presidente da Sociedade Portuguesa de Diabetologia. Porém, nos casos em que isso não acontece, pode haver utentes com "grandes períodos de descompensação" devido às ruturas nos stocks, o que "vai ter impacto na sua saúde".
Desta forma, a endocrinologista defende que os doentes com diabetes tipo 2, e partindo do pressuposto que têm uma "prescrição crónica" de um determinado medicamento, deveriam ser sinalizados como prioritários perante as farmácias, através dos sistemas informáticos a que estes estabelecimentos acedem. "Muitas vezes, os clientes habituais contactam a farmácia quando uma embalagem está terminar e evitam fazer o stock de medicação em casa", aponta.
"Enormes encargos financeiros"
Alguns vídeos na comunicação social, nos últimos meses, mostraram a venda ilegal de medicamentos como o Ozempic, em plena luz do dia, em Portugal. Devido às ruturas dos stocks dos medicamentos antidiabéticos, a vice-presidente da SPD admite que já foi questionada por doentes sobre a segurança de comprar os fármacos pela Internet. "É importante dizer às pessoas que não sabem o que estão a comprar e [essa compra no mercado negro] pode constituir um risco grave para a saúde. Existem várias contrafações", avisa.
Também José Manuel Boavida, presidente da Associação Protetora dos Diabéticos de Portugal (APDP), diz ter conhecimento de casos de pessoas interpeladas, à saída das farmácias, para comprar ilegalmente Ozempic, a preços mais competitivos do que nas farmácias. Sem comparticipação para a diabetes tipo 2, o preço chega aos 106,85 euros.
"Os doentes diabéticos têm enormes encargos financeiros mensais mesmo com a comparticipação. Geralmente não são doentes que só fazem o medicamento do semaglutido [princípio ativo do Ozempic], fazem múltiplos medicamentos orais e injetáveis e têm também de fazer a monitorização, que é dispendiosa", acrescenta Mariana Monteiro.
Sobre o mercado negro, o presidente do Colégio de Endocrinologia e Nutrição da Ordem dos Médicos refere que, "quando se compram medicamentos fora do circuito normal, não há garantia da sua qualidade ou segurança". "Há o sério risco de comprar 'gato por lebre' ou mesmo de colocar a vida em risco", sublinha Manuel Lemos. Para além da fiscalização das autoridades, o clínico adianta ser necessário sensibilizar as pessoas para o uso responsável e seguro dos medicamentos.
Inspeção a Mounjaro
A Inspeção-Geral das Atividades em Saúde (IGAS) abriu uma análise à comercialização ilegal do medicamento Mounjaro. O fármaco tem o princípio ativo tirzepatida e é usado para tratamento da diabetes tipo 2 e da obesidade. É vendido e prescrito em Portugal, mas não é comparticipado. O IGAS abriu a inspeção "face aos indícios de incumprimento de deveres gerais e especiais da profissão médica (...), bem como de preceitos deontológicos e exigências aplicáveis à prática de telemedicina, com reflexo na qualidade dos cuidados de saúde prestados".