
Houve anos em que a técnica resultou: repetir até à exaustão que as eleições autárquicas não têm leituras nacionais. Na última noite, não há forma de ignorar o impacto que os resultados vão ter na Oposição. Pedro Passos Coelho assumiu sem meias palavras que saberá tirar ilações da derrota urbana.
E se o risco de uma noite negra já estava anunciado, as contas finais superaram as piores expectativas. Em sentido contrário, Assunção Cristas ganhou um peso que se traduziu na simbólica ultrapassagem que fez ao PSD em Lisboa.
Mas não vale a pena a Esquerda consolar-se com a queda dos sociais-democratas. Será difícil que a noite eleitoral não tenha reflexos no jogo de forças que suporta o Governo.
O PCP sofreu uma derrota pesada. E se, num primeiro momento, os impactos na capacidade negocial no Orçamento do Estado para 2018 possam ser pouco relevantes, os comunistas não vão deixar de ler os sinais que apontam o PS como aquele que mais capitaliza com a solução governativa à Esquerda. Sendo o partido que parece perder com a "geringonça", o passo seguinte mais lógico é questionar a aliança parlamentar. E é na rua, onde está a força do PCP, na manutenção da paz social, que mais depressa se farão sentir os sinais.
À medida que se aproximarem as eleições legislativas, cada um dos parceiros precisará de ganhar identidade e afirmar-se junto do eleitorado. O PCP parece estar, mais do que qualquer outro, obrigado a distanciar-se do PS. A segunda metade do mandato poderá ser bem mais tempestuosa do que a primeira para António Costa. A economia ajuda, mas pode não chegar para agradar a todos.
Se a nível nacional António Costa sai reforçado, perdendo apenas massivamente no distrito de Braga, para único consolo de um PSD ruralizado, no Porto a derrota é inequívoca. Bem pode Manuel Pizarro responsabilizar Rui Moreira pelo divórcio em vésperas da ida a votos. A verdade é que os socialistas não tiveram capacidade sequer para evitar a maioria absoluta do independente. Moreira volta a ser coroado e parte para um novo mandato sem ter de procurar alianças. Marcando, também ele, no discurso de vitória, o tom local e nacional ao convocar para a derrota António Tavares, provedor da Misericórdia do Porto, Paulo Rangel e Rui Rio, os dois últimos que mais ou menos discretamente não se esquivam a disputar a liderança dos sociais-democratas.
Sem surpresas mas ainda assim surpreendente, Isaltino Morais arrancou em Oeiras um resultado avassalador. Num concelho urbano e qualificado, a escolha de um ex-autarca condenado por crimes cometidos no cargo é motivo de estudo. E seria um sinal preocupante se fosse acompanhado em igual sentido noutros concelhos. Não foi o caso. Gondomar e Matosinhos, só para falar nos mais expressivos, demonstraram que as populações têm as suas escolhas bem definidas.
