Viajar de avião não é novidade para as irmãs Francisca, 15 anos, e Inês Ponte, 11. Já "sozinhas é a segunda vez", conta a mais velha, enquanto a mãe termina o check-in. Vão passar uns dias com o pai a Estocolmo, na Suécia, onde vive. Uns minutos antes, outra criança despediu-se do pai para ir ter com a mãe a Paris.
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Longe da confusão dos outros postos de atendimento do Aeroporto de Lisboa, o balcão da Groundcare passa despercebido, mas por ali nunca passaram tantas crianças. Só no último ano, viajaram 22 mil sozinhas, a partir de Lisboa, com destino a várias partes do Mundo. No Porto, andou à volta das 3000 crianças. Há cada vez mais famílias separadas pelo fenómeno da emigração e as crianças viajam sozinhas para lhes fazer companhia.
Acompanhamento
Só no dia 18 de dezembro, o primeiro de férias escolares, o Groundcare assistiu 160 menores, em Lisboa. Este serviço da Groundforce acompanha pessoas entre os quatro e os 17 anos, que viajam sozinhas, desde o check-in até à porta de embarque e ao avião. À chegada, o acompanhamento é feito desde que aterram até que são entregues aos pais ou outro responsável legal. A maioria é portuguesa e vai visitar a família ao estrangeiro e as "restantes nacionalidades estão relacionadas com os estrangeiros residentes em Portugal", avança a Groundcare.
Viajar sem a companhia de um adulto nunca assustou as irmãs Francisca e Inês. E também não parece ser problema para Ariana, 10 anos. Ia passar a passagem de ano com os pais e os primos ao Funchal, pela segunda vez. "Não tenho medo, é divertido", diz despreocupada, sem nunca perder a concentração no telemóvel.
Desvia apenas o olhar do aparelho eletrónico para ouvir as indicações de Ana Barroca, assistente que a vai acompanhar. Depois de verificar que não tem líquidos na mochila, Ana coloca-lhe um cartão ao pescoço com os dados da viagem, um termo de responsabilidade, autorização parental, cartão de embarque e a cópia da etiqueta de bagagem. Assim que o procedimento acaba, é só passar pelo controlo de segurança, percorrer um longo corredor até à sala de embarque e esperar que chegue a hora da partida.
Ariana está calma e despede-se da tia, que a acompanhou até ao aeroporto, sem grandes alaridos, mas nem sempre é assim. "Há crianças mais agitadas e na despedida há mais lágrimas e momentos emotivos, é preciso alguma sensibilidade", explica Ana Barroca. Durante um ano, já acompanhou centenas e, embora não consiga lembrar-se de todas as nacionalidades, a assistente diz que sente maior presença de brasileiros, a maior comunidade estrangeira residente em Portugal. "Todas são diferentes e é essa interação, com crianças de várias culturas, que gosto mais", confessa.
O serviço de assistência a crianças que viajam desacompanhadas só recebeu o nome Groundcare em 2007, mas já era prestado às companhias aéreas. Nos últimos anos, o número de menores a viajar desta forma aumentou e é na altura das férias que se sente "um maior pico de utilização". Entre os dias 1 e 17 de dezembro, foram acompanhadas 942 crianças, em Lisboa, "entre partidas, transferências e chegadas", um número que se intensificou até ao Natal. Em dezembro último, "foram prestadas 1540 assistências".
Pontes
O mercado português é "o mais forte", mas "há pontes de vários continentes", avança Sofia Fernandes, responsável da comunicação da Groundforce Portugal.
"Isto é uma espécie de "hub" de crianças e adolescentes que vão passar uma temporada com a família que está longe", explica.
Neste rodopio, há histórias que ficam na memória. "Há situações caricatas, como a de uma criança que tinha um cartão de crédito "black" (sem limite) para fazer compras no aeroporto e de outra que tinha fobia a cães. Nunca tinha visto igual", recorda aquela responsável.
Saiba mais
Mais de 20 mil por ano
Só o ano passado, 22 mil crianças viajaram desacompanhadas através da Groundcare, na capital. Nos últimos quatro anos, o maior pico registou-se em 2017, com quase 25 mil menores a usufruírem deste serviço.
Pico no período de Natal
Desde o início do ano até 17 de dezembro de 2019, a Groundcare acompanhou 22 167 crianças a partir de Lisboa. Só entre os dias 1 e 17 de dezembro, foram acompanhadas 942 entre partidas, transferências e chegadas. No Porto, só em 2019 foram feitos 2700 acompanhamentos a menores.
Por todo o país
O serviço de acompanhamento a crianças que viajam desacompanhadas está disponível nos aeroportos de Lisboa, Porto, Faro, Funchal e Porto Santo, e é prestado pelas mais de 150 companhias aéreas da Groundforce Portugal.
Perguntas e respostas
Quem pode utilizar este serviço?
Todas as crianças, entre os quatro e os 17 anos, que viajam desacompanhadas a partir dos aeroportos de Lisboa, Porto, Faro, Funchal e Porto Santo. Este serviço foi criado e desenvolvido pela Groundforce Portugal.
Como usar o Groundcare?
Para as crianças usufruírem deste acompanhamento, os tutores legais devem contactar a companhia aérea na qual os menores irão viajar no momento da compra do bilhete. É obrigatória uma autorização parental.
Quais as companhias aéreas que fazem este acompanhamento?
Todas as companhias aéreas clientes da Groundforce Portugal, mediante pedido. Entre estas estão a TAP, Lufthansa, Sata, Emirates, Vueling, British Airways, Airfrance, entre outras.
Porque é que as crianças são as primeiras a entrar e as últimas a sair do avião?
As crianças são entregues à tripulação e ficam sob sua responsabilidade, razão pela qual entram logo no início do embarque e saem só no final.
Testemunhos
Francisca Ponte
Utilizadora do serviço
"Temos um atendimento especial. Colocam-nos uma fita e somos as primeiras a entrar e as últimas a sair do avião"
Patrícia Gonçalves
Mãe de Francisca e Inês
"Apesar das saudades, sinto-me tranquila em deixá-las ir sozinhas. É um serviço bastante seguro"
Ana Barroca
Funcionária Groundcare
"Hoje estou só com a Ariana, é a única que vai para o Funchal. Há pouco tempo, acompanhei oito ao mesmo tempo"