Programa Regressar registou mais de 1400 candidaturas em menos de um ano e já está a apoiar cerca de 800 pessoas. Voltam por motivos familiares e porque encontram oportunidades de trabalho que não tinham quando partiram.
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Saíram do país maioritariamente durante a última crise financeira, grande parte para o Norte e Centro da Europa, são jovens e quase metade é licenciada. É este o perfil dos que emigraram e estão a voltar, aproveitando para assentar a vida com as ajudas do Estado. O Programa Regressar já fez chegar ao Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP) mais de 1400 candidaturas, desde que arrancou em julho do ano passado, abrangendo mais de 3 mil pessoas, incluindo os agregados familiares.
De acordo com os dados do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, 65% dos candidatos abandonaram o país entre 2011 e 2015, 47% tinham concluído o ensino superior e 38% têm idades entre os 15 e os 34 anos. São sobretudo provenientes do Reino Unido (19%), de França (17%), da Suíça (15%), do Brasil (8%) e de Angola (6%), estando representados, no total, 63 países.
"É um comportamento expectável", considera Rui Pena Pires, sociólogo e coordenador do Observatório da Emigração: "Portugal está entre os três países da União Europeia com maior percentagem de retorno de emigrantes. E a emigração portuguesa que mais cresceu nos últimos anos foi a qualificada, que é a que regressa mais, porque tem mais oportunidades. Além disso, houve alguma recuperação económica e criação de emprego no país, o que também poderá ajudar a explicar as elevadas taxas de regresso".
Do universo das mais de 1400 candidaturas à Medida de Apoio ao Regresso de Emigrantes prevista no programa, cerca de 800 já estão a receber apoios e mais de 900 foram aprovadas ou estão em fase de cabimentação, cem das quais com uma majoração de 25% por se terem fixado no interior do país (recebem no máximo 7679 euros por agregado em vez de 7021 euros).
estabilidade chamou-os
São os casos de Ana Luísa Machado e de Joana Silva, que voltaram à cidade onde nasceram, Bragança e Arouca, respetivamente. Ambas foram para França recém-licenciadas e ambas voltaram, com o marido e as filhas, porque conseguiram o que as levou a emigrar: trabalho. "Não foi o apoio que nos fez voltar, mas porque vimos o país com outra estabilidade, com as perspetivas de emprego a aumentar. E também queria que as minhas filhas crescessem perto da família", conta Joana, de 32 anos, enfermeira.
Palavras que refletem os resultados do inquérito online aos beneficiários do programa, promovido pelo IEFP: 83% regressaram por motivos familiares ou porque encontraram oportunidades de trabalho.
No primeiro semestre de 2020, deram entrada no IEFP 802 candidaturas à Medida de Apoio ao Regresso de Emigrantes, mais 178 do que no segundo semestre de 2019, o que representa um aumento de quase 30%.
Rui Pena Pires diz que "este deverá ser o único movimento migratório que, eventualmente, se manterá em níveis elevados durante os próximos anos, porque, por causa da pandemia, todos os outros vão sofrer um abalo enorme, que já se está a sentir e será ainda mais visível no futuro".
Sem esta oportunidade de trabalho não teria regressado
Ana Luísa Machado voltou à terra natal, Bragança, com o marido e as filhas, depois de sete anos emigrada em França, onde tinha uma boa carreira.
Mudou-se para França em setembro de 2012, na companhia do marido. Tinham terminado o curso há pouco tempo e não havia forma de arranjar emprego em Portugal: "O país atravessava um período complicado, devido à crise económica. Tínhamos familiares a viver na região de Paris, o que também nos ajudou a tomar essa decisão. Arriscámos e correu bem. Posso dizer que a minha experiência de emigração só me valorizou, pessoal e profissionalmente".
Foi lá que, ao fim de três anos, Ana Luísa Machado, engenheira alimentar, conseguiu finalmente trabalhar na sua área, como assistente de qualidade agroalimentar numa empresa de extratos vegetais - foi o primeiro passo para poder voltar, confessa.
Até que tomou conhecimento da criação do MORE Colab - Laboratório Colaborativo Montanhas de Investigação, em Bragança, precisamente a cidade onde nasceu há 33 anos. Não hesitou: concorreu, foi à entrevista e acabou selecionada. "Tinha uma boa posição em Paris, tal como o meu marido. A situação profissional era boa, por isso, se não tivesse tido esta oportunidade de trabalho, não tinha regressado."
O objetivo foi sempre voltar, até porque Maria, a primeira filha, de quatro anos, preparava-se para entrar na escola primária e Benedita estava prestes a nascer.
"Queria que o crescimento delas fosse acompanhado de perto pela família, sempre achei isso muito importante para o seu desenvolvimento. A Maria só conheceu os avós através da internet, não queria que isso acontecesse com a Benedita. Além disso, em França, ficava caríssimo que nos tomassem conta das crianças, quase nem compensava o facto de lá estarmos."
Regressaram em junho de 2019, mas a candidatura ao Regressar só foi feita este ano, com a alteração da portaria que permitiu que sejam elegíveis não só os que assinem um contrato a termo, mas também os que tenham um vínculo com uma duração inicial de, pelo menos, seis meses.
É o caso de Ana Luísa, assim como dos três colegas do laboratório, também eles emigrantes regressados. "É uma boa ajuda? Claro que é, mas não é isso que incentiva um emigrante a voltar, mas o facto de ter uma oportunidade de trabalho. Mas reconheço que é um ótimo incentivo o facto de pagarmos apenas metade do IRS no ordenado. Como vim como quadro altamente qualificado e tenho um salário elevado, isso faz bastante diferença ao fim do mês."