Já foi pujante, mas viu a pandemia arrasar-lhe as perspetivas de crescimento e expansão. O mercado de escritórios desabou abruptamente nos últimos anos. Mas os meses recentes foram de um crescimento otimista, ainda que cauteloso, em particular nas grandes cidades.
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Depois de praticamente dois anos em que as movimentações de mercado caíram para mínimos históricos devido à pandemia, os escritórios voltaram a dar sinais de vida. Ténues ainda, segundo especialistas consultados pelo JN Urbano, mas reveladores de que as cidades, sobretudo Lisboa e Porto, voltaram a ser prioridade de empresas que querem expandir os seus espaços e oferecer modernidade e outras mais-valias aos seus trabalhadores.
O último trimestre de 2021 trouxe os primeiros impulsos positivos. "Foi desde então que o mercado de escritórios começou a subir, o que indica que vamos voltar aos números pré-pandemia", confirma Frederico Leitão de Sousa, responsável pelo Departamento de Escritórios da Savills. Esta consultora imobiliária elaborou um estudo, a que JN Urbano teve acesso, no qual, entre outras análises, previu as tendências de mercado para 2022. E as conclusões foram claras: Lisboa vai "manter-se no radar dos investidores internacionais" e no Porto a procura será "muito dinâmica".
Tal movimentação leva, porém, a um problema antigo que vem agora novamente ao de cima. "Faltam escritórios novos e de qualidade. Isto leva a que as rendas pedidas sejam elevadas, devido à escassa oferta", explica Frederico Leitão de Sousa.
A pandemia trouxe diversas alterações no próprio modo de trabalhar, como o teletrabalho, e é cedo para perceber como será o modelo depois de a normalidade regressar em pleno
Um outro estudo, este levado a cabo pela Imovirtual, deu conta que em 2021 a quebra na compra ou arrendamento de escritórios caiu 8% em relação a 2020 e 23% face a 2019. A leitura daquela que é a maior plataforma online que junta agências imobiliárias e compradores é clara: "Muitas empresas optaram por manter os mesmos escritórios ou adotar a 100% o trabalho remoto e abandonaram instalações físicas, além de que não surgiram novas empresas ou que as que surgiram não procuraram necessariamente um espaço, numa fase em que o teletrabalho se generalizou". Coimbra (-45%), Lisboa (-43%), e Porto e Braga (ambas com -32%) foram as cidades onde se testemunhou uma queda maior na procura.
Os tempos continuam a ser de incertezas que teimam não sair do horizonte e que fazem recuar as intenções dos que ainda têm dúvidas em partir para outros desafios. "Há que esperar pela reação futura do mercado, das empresas e das pessoas. A pandemia trouxe diversas alterações no próprio modo de trabalhar, de que o teletrabalho é o maior exemplo, e é cedo para perceber como será o modelo depois de a normalidade regressar em pleno", acredita Ricardo Feferbaum, diretor-geral da Imovirtual. "As mudanças de comportamento existem, sim, mas os dados disponíveis são, para já, pouco claros para que se possa dizer que são significativas no impacto que têm no modelo de funcionamento dos escritórios e no próprio mercado", aponta.
Valores ainda negativos
Mas há dados encorajadores. De 1 de janeiro a 15 de fevereiro deste ano, de acordo com dados recolhidos pela mesma Imovirtual, a procura mais do que triplicou (-11,7%) na comparação com os totais de 2021 (-36,7%) e de 2020 (-34,4%) em relação a 2019, o último ano em que o mercado funcionou sem os condicionalismos trazidos pela pandemia, o que ajuda a explicar que os valores sejam ainda negativos em comparação com esse período.
Olhando apenas para os mesmos meses, janeiro e fevereiro, de 2022, 2021 e 2020, as diferenças batem exatamente nos valores globais: respetivamente -11%, -37% e -34,3%.
Em Lisboa, onde o comparativo entre 2022 e 2019 chegou a uma diferença negativa de 68%, o saldo desde janeiro é de apenas -11,2%. E no Porto, que viu o mercado cair 62,6% em dois anos, a recuperação já vai nos -15,9%. "Os números são ainda negativos, daí que ainda não se possa falar de uma reversão clara", diz Ricardo Feferbaum.
As perspetivas são mais otimistas, suportadas numa expectativa de maior controlo da pandemia
Otimismo embrulhado em doses seguras de precaução foi o que também pediu Eric van Leuven, diretor-geral da Cushman & Wakefield em Portugal, no relatório para 2022 que a consultora internacional elaborou para o mercado nacional. "As perspetivas são mais otimistas, suportadas numa expectativa de maior controlo da pandemia e consequente consolidação da retoma da economia mundial. Embora os primeiros meses do ano possam ser uma vez mais caracterizados por uma cautela acrescida no mercado ocupacional, antecipa-se que os indicadores de final de ano ultrapassem de forma transversal os registados no ano anterior", assinalou o responsável.
A Cushman & Wakefield tem prevista para 2022 a comercialização de dois dos maiores projetos de escritórios de Lisboa, o edifício Lumnia e o World Trade Center, enquanto que no Porto está em marcha o Porto Business Plaza, que vai ocupar as antigas instalações do Centro Comercial Central Shopping, na Rua de Santos Pousada.
Também no Porto foi anunciada na última semana pela Sonae Sierra e o Grupo Ferreira uma parceria que vai resultar num complexo de escritórios considerado de última geração a nascer na Zona Industrial. Com um investimento de 42 milhões de euros, tem conclusão prevista para o final de 2023 e é composto por um edifício de nove andares.
Multinacionais procuram espaços em Lisboa para daqui a dois ou três anos
"Enquadra-se no objetivo estratégico da Sonae Sierra de ser uma "chave" na reconversão urbana e no desenvolvimento das cidades do futuro", explica Alexandre Fernandes, administrador da empresa.
Já em Lisboa, outro exemplo de que o mercado já mexe é "a busca de empresas multinacionais por espaços para se instalarem apenas daqui a dois ou três anos", conforme revela Frederico Leitão de Sousa, da Savills.
Pequenos sinais de que os escritórios começaram a recuperar o fôlego perdido em 2020 e 2021. E de que o mercado, embora timidamente, tende a regressar aos bons indicadores do passado recente destruídos pela pandemia.