Administração pública tem quotas desde 2001, meta de 5% está longe de ser atingida. Quem tenha 100 ou mais trabalhadores passa a estar obrigado a empregar 1% de pessoas com deficiência.
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A partir deste mês, as empresas com 100 ou mais trabalhadores são obrigadas a ter nos seus quadros pelo menos 1% de pessoas com deficiência. O período de adaptação à lei, aprovada em janeiro de 2019, prolonga-se até fevereiro do próximo ano para as empresas com entre 75 e 100 funcionários. Na administração pública, as quotas existem desde 2001, mas o Estado continua longe de atingir os 5% fixados como referência.
De acordo com o relatório "Pessoas com Deficiência em Portugal - Indicadores de Direitos Humanos 2022" do Observatório da Deficiência e dos Direitos Humanos, só 0,59% das pessoas empregadas no privado têm deficiência (13 882) e esta percentagem só aumentou residualmente: era 0,51% há cinco anos. No Estado, a percentagem de pessoas com deficiência é de 2,8%, num total de 20 389. Contudo, também aqui a evolução tem sido muito ligeira, com uma subida de apenas 0,4% nos últimos cinco anos.
Não se conhecem avaliações
13 mil pessoas com deficiência estão inscritas nos centros de emprego do Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP), menos 4,6% do que em 2021. Contudo, na população em geral o número de inscritos baixou 17%.
A Associação Portuguesa de Deficientes (APD) está cética quanto à preparação das empresas para cumprir a lei e alerta para a dificuldade de avaliar o seu cumprimento. "O próprio texto da lei diz que ela será objeto de uma avaliação a cada três anos pelo INR e pelo IEFP mas, até agora, não se conhece qualquer avaliação", queixa-se Gisela Valente, presidente da APD. "A legislação devia prever a obrigatoriedade de tornar público o número de pessoas com deficiência que se candidatam à administração pública e as que acedem", diz esta dirigente associativa, apontando a dificuldade de avaliar o cumprimento da lei.
O gabinete jurídico da APD tem dado apoio a deficientes que impugnam concursos públicos, nomeadamente por, alegadamente, o Estado dividir as ofertas de trabalho para não ter que cumprir as quotas (a função pública é obrigada a reservar 5% das vagas para pessoas com deficiência em concursos com 10 ou mais vagas).
Para a CGTP-IN, "os dados existentes revelam a pouca apetência das empresas para a contratação de pessoas com deficiência". A central sindical afirma ao JN que tem havido pouca divulgação e "a cultura dominante não parece ser muito favorável à aplicação de quotas".
Empresas procuram ajuda
A violação da lei prevê coimas entre 612 e 9690 euros. A não adequação do processo de recrutamento aos candidatos com deficiência constitui contraordenação leve, correspondendo a uma coima entre 204 e 1530 euros.
A APD nota que há um aumento de empresas interessadas em obter informações sobre esta lei. A associação criou o gabinete (IN)tegra, com o objetivo de dar apoio individualizado aos candidatos e às empresas na integração destas pessoas.
"As dúvidas mais frequentes estão relacionadas com a linguagem a usar nas propostas e na realização de entrevistas. Mas também há pedidos de avaliação de espaços para a adaptação do posto de trabalho e de ações de sensibilização para os outros trabalhadores", refere Gisela Valente.
Para a Confederação Empresarial de Portugal (CIP), esta é uma "legislação complexa e difícil de executar, cuja preparação devia ter envolvido os parceiros da Concertação Social". Os patrões defendem que "a mera alteração da realidade por decreto não é a opção mais realista e eficaz".
Luís Roque, dirigente da CERCIFAFE desde 1978, já colocou mais de 180 pessoas com deficiência no mercado de trabalho e também não vê nas quotas a melhor solução. "As empresas vão contratar para cumprir a lei, não vai haver efetiva integração", prevê. Para o psicólogo, "o acompanhamento contínuo do funcionário e da empresa é fundamental para o sucesso". Manuel Guimarães, gerente da Jopedois, que há 30 anos emprega pessoas com deficiência, alerta para a importância deste apoio. "Vão sempre surgir situações que nem o funcionário nem a empresa conseguem resolver sem ajuda", diz.
Perguntas e Respostas
O que diz a lei?
A norma da lei n.º 4/2019, de 10 de janeiro, estabelece o sistema de quotas de emprego para pessoas com deficiência, com um grau de incapacidade igual ou superior a 60%. Neste momento abarca as empresas com 75 ou mais trabalhadores e as grandes empresas, com 250 ou mais colaboradores.
Quais são as quotas em vigor?
Para as médias empresas (com um número de funcionários igual ou superior a 75) a quota é de 1% e de 2% para as grandes empresas (com 250 ou mais trabalhadores).
A partir de quando é que é obrigatório?
Desde 1 de fevereiro deste ano para empresas com 100 ou mais funcionários e a partir de fevereiro de 2024 para as restantes.
As empresas podem não contratar?
Sim. As empresas podem alegar a "efetiva impossibilidade da sua aplicação aos seus postos de trabalho" ou a inexistência de candidatos que reúnam os requisitos.