Comissão Europeia avança com plano para retirar 15 milhões de europeus da exclusão social. Rede Europeia Anti-Pobreza avisa que pobres têm que ser ouvidos na definição de políticas.
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Numa União com 94,6 milhões de pessoas em risco de exclusão social, a Comissão Europeia (CE) vai lançar, pela primeira vez, no início do próximo ano, a tão reivindicada Estratégia Europeia de Combate à Pobreza. Para acelerar o desígnio de retirar daquela condição 15 milhões de cidadãos. O anúncio foi feito, na manhã desta sexta-feira, pela diretora para os Direitos Sociais e Inclusão da CE durante a Cimeira das Pessoas que, no Porto, discutiu a pobreza com quem nela vive.
Reconhecendo que, nos últimos anos, fizeram-se “progressos muito, muito modestos”, Katarina Ivankovic Knezevic vincou que os “objetivos para 2030 mantêm-se”. Traçados, em 2021, na Cimeira Social do Porto: 78% da população empregada, 60% dos adultos em formação todos os anos e menos 15 milhões de pobres, cinco milhões do quais crianças.
Numa estratégia, revelou a responsável de Bruxelas, multidimensional, com abordagem ao longo da vida e atenta a grupos específicos como as mulheres e os sem-abrigo. Com a consulta pública a dar o pontapé de saída nesta Primavera, durante três meses. E com o Porto, mais uma vez, a acolher a Cimeira Social, em meados de maio, para discutir o futuro do plano de ação para o Pilar Europeu dos Direitos Sociais e a tão ambicionada estratégia de combate à pobreza.
Que, nas palavras do relator especial das Nações Unidas sobre a pobreza extrema e direitos humanos, Olivier De Schutter, “tem que incluir as pessoas em pobreza na definição de políticas”. Considerando crucial uma “economia mais inclusiva e investimento na educação infantil”, nomeadamente acesso a creche e pré-escolar.
Para segundo plano?
Receando-se que com o atual contexto geopolítico, e de reforço do investimento europeu em Defesa, se perca o foco. E a prioridade. “Depois das eleições europeias, com o aumento da retórica da extrema-direita, a pobreza virou uma pauta acessória”. Mas a “comissária Roxana [responsável pelos direitos sociais] tem tentado que o combate à pobreza não seja esquecido”, afirma, ao JN, a diretora da Rede Europeia Anti-Pobreza (EAPN) Europa.
Mas sempre, vinca Juliana Wahlgren, “na dualidade pobreza versus defesa, pobreza versus competitividade”. Numa “narrativa muito complicada”. No entanto, o lançamento de uma estratégia europeia “é um momento muito importante” e uma oportunidade para definir “elementos mínimos” em termos de plano nacionais. Desde logo, incluir “um capítulo com referência a planos nacionais”. Que Portugal tem, mas vários países não têm.
Ouvir as pessoas
Considerando o processo de construção de uma estratégia europeia “emocionante”, mas não desprovido de riscos, o presidente da EAPN Europa alertou, também, que o momento presente, “centrado no tema da segurança”, não pode ser feito “à custa da redução dos recursos para o bem-estar social”. Para Carlos Susias Rodado, não podemos permitir que “as pessoas que têm sido sempre as últimas sejam agora as primeiras a sofrer cortes”.
Depois? Depois está o foco da Cimeira das Pessoas. Porque se temos “um problema na agricultura, chamamos os agricultores”. Então, se vamos falar de pobreza, sublinha o responsável da organização europeia, “temos que chamar as pessoas que a experienciam e que trabalham com elas; não é uma coisa rara”. Carla Teixeira, do Concelho Local de Cidadãos do Porto da EAPN estava lá. E avisou: “Temos que ser sérios naquilo que prometemos”. E no profundo silêncio de uma plateia embargada ouviu-se, tão simplesmente: “Yes!”.