Elvira Fortunato diz que universidades não podem ser coniventes com relatos de abuso. Faculdade de Direito de Lisboa vai criar gabinete de apoio a vítimas.
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Um dia depois de se tornar público que a Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa recebeu, em 11 dias, 50 queixas de assédio e de discriminação, a ministra do Ensino Superior, Elvira Fortunato, deu indicações às universidades e politécnicos para tratarem todas as denúncias que lhes cheguem. Na quinta-feira, estudantes do ensino superior vão concentrar-se à porta da Reitoria da Universidade de Lisboa em protesto contra o machismo e o assédio sexual nas instituições de ensino.
Preocupada com os relatos de assédio moral e sexual no contexto académico, a ministra do Ensino Superior deixou claro, em comunicado, que as instituições de ensino superior "não devem ser coniventes" com situações que violem os princípios da liberdade e da promoção dos valores de igualdade e do respeito, ao garantir que não existem discriminações de género, de orientação sexual, de nacionalidade ou outra.
"Apesar destas situações existirem em diversos contextos, as universidades e os politécnicos devem ser exemplares nesta matéria e tratar todas as denúncias no contexto da autonomia disciplinar de que dispõem", sublinha Elvira Fortunato. Compromete-se ainda a "remeter de imediato eventuais denúncias" dirigidas ao Ministério, ou outras entidades sob a sua direção, à Inspeção-Geral da Educação e Ciência, para que sejam averiguadas.
abusos são "regra"
A indignação é partilhada por jovens estudantes, que convocaram uma concentração para quinta-feira, às 18 horas, em frente à Reitoria da Universidade de Lisboa, contra o machismo e o assédio sexual nas instituições de ensino. Em comunicado, dizem que a situação da Faculdade de Direito "é a regra, e não uma exceção".
Os estudantes garantem que "o problema de assédio sexual e da discriminação nas faculdades está enraizado desde sempre" e consideram urgente acabar com a impunidade de quem comete estes crimes, por se encontrar numa posição de poder, e "não perpetuar um ambiente de medo, hostil e perverso".
Empenhados em desmistificar as circunstâncias em que ocorre o assédio e em quebrar os estereótipos sociais, os jovens defendem o debate público sobre este assunto e prometem recolher informação para apresentar propostas de combate a este crime. "As instituições de ensino não podem simplesmente ignorar o problema sistemático de que são alvo. Abafar e silenciar a questão é coadjuvar em práticas reiteradas de discriminação, e é ignorar o sofrimento de quem sofre em silêncio".
ordens vão colaborar
Esta terça-feira, a Faculdade de Direito de Lisboa anunciou a abertura de um gabinete de apoio e aconselhamento jurídico a vítimas de assédio e de discriminação dentro da comunidade académica.
"O objetivo é apoiar as vítimas desde o primeiro momento. E, depois, aconselhá-las de forma objetiva e independente, no caso de quererem prosseguir com queixas disciplinares ou criminais", esclarece, em comunicado. Informa ainda que serão as Ordens dos Advogados e dos Psicólogos a indicar os profissionais a acompanhar os estudantes, os funcionários ou os docentes que apresentarem denúncias. Tem ainda como objetivo dissuadir estas práticas. Paula Vaz Freire, diretora da faculdade, lembrou que há dois anos abriu um processo disciplinar por assédio sexual, e que apoiou a criação de um canal para denúncias anónimas.
Posição
Marcelo conheceu poucos problemas de indisciplina
O presidente da República afirmou, esta terça-feira, que, quando exerceu funções diretivas na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, conheceu "casos de indisciplina ou de problemas entre docentes e discentes", mas foram "poucos" e "pontuais". À data, a única dificuldade foi "determinar quem exercia o poder disciplinar", porque "não havia nenhum órgão da faculdade" nem na universidade. "O juízo que eu posso formular é o de que todas as instituições estão submetidas à Constituição e à lei e aos valores de que são portadoras e, portanto, é bem-vindo tudo aquilo que significa a aplicação da Constituição e da lei", frisa Marcelo.