Eurodeputados portugueses apreensivos com eventuais alterações a indemnizações nos voos
Os ministros de Transportes da União Europeia vão tentar chegar a acordo, esta quinta-feira, sobre a revisão do regulamento que estabelece os direitos dos passageiros aéreos. Em causa está o alargamento do número mínimo de horas de atraso dos voos para se ter direito a compensação financeira.
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A revisão do regulamento 261/2004 da União Europeia (UE) esteve parada durante mais de dez anos. O primeiro debate do Conselho da UE sobre o assunto ocorreu a 10 de outubro de 2013, depois de a Comissão Europeia ter proposto no mesmo ano uma alteração ao regulamento.
O diploma tem sido negociado com o Parlamento Europeu, mas a falta de consenso e gestão de interesses aparentemente antagónicos - passageiros e companhias aéreas - não tem permitido que o processo legislativo avance com celeridade. Uma das medidas estabelece que o acesso a indemnizações por voos atrasados passe de um mínimo de três horas para cinco horas.
A presidência polaca do Conselho da UE, que dura até ao final de junho, fez da revisão do regulamento 261/2004 uma prioridade. Esta quinta-feira, 5 de junho, os ministros de Transportes da UE deverão tentar chegar a um "acordo político" sobre o tema, lê-se no site do Conselho da UE. Além das indemnizações nos voos, o diploma poderá também trazer mudanças nos procedimentos de reclamação dos passageiros, assim como clarificar expressões na legislação, nomeadamente as "circunstâncias extraordinárias" e os voos de ligação.
Parlamento Europeu contesta intenção do Conselho da UE
Portugal tem quatro eurodeputados na Comissão dos Transportes e do Turismo do Parlamento Europeu: dois membros efetivos, um do PSD (Sérgio Humberto) e um do PS (Sérgio Gonçalves), e dois membros suplentes, um da IL (Ana Vasconcelos) e um do PS (André Rodrigues). O JN contactou os respetivos grupos parlamentares, que se mostraram apreensivos sobre as possíveis alterações nas indemnizações dos voos.
Ana Vasconcelos, da IL, afirma que a Comissão Europeia "tem a legítima missão de corrigir limitações da lei atual que geram incerteza e litigância excessiva". Contudo, a eurodeputada liberal diz não ser "claro", porque é que o "aumento da clareza legal" e o "cumprimento atempado dos reembolsos" deverá ser feito mediante um "limiar para compensação" que passa de três para cinco horas de atraso. "A Iniciativa Liberal quer certificar-se que os direitos dos passageiros mantêm-se protegidos, pois sem confiança no mercado todos perdem", acrescentou.
Também Sérgio Gonçalves, do PS, aponta que os "socialistas estão do lado dos passageiros". "Defendemos que os consumidores devem continuar a ter direito a compensação sempre que o seu voo atrase três horas ou mais. Essa é a posição do Parlamento Europeu, aprovada em 2014 com o nosso apoio (Socialistas & Democratas). Ao contrário do Conselho da UE — que está a discutir aumentar esse limite para cinco horas —, nós acreditamos que não se pode recuar nos direitos dos passageiros", defende ao JN.
Numa carta a que o JN teve acesso, enviada ao ministro polaco dos Transportes, a porta-voz da Comissão dos Transportes e do Turismo do Parlamento Europeu, a eurodeputada grega Elissavet Vozemberg-Vrionidi, mostrou-se preocupada com a intenção do Conselho da UE de concluir a primeira leitura do dossiê da revisão do regulamento 261/2004 e, assim, terminar as negociações.
"O Parlamento Europeu adotou a sua posição numa primeira leitura sobre este dossiê em fevereiro de 2014, em linha com a prática habitual de finalizar os mandatos antes do final de uma legislatura quando os dossiês permanecem sem solução. Essa etapa processual, habitual em vários dossiês, nunca teve a intenção de impedir ou antecipar negociações futuras e não exerce qualquer pressão processual sobre o Conselho. Desde o início, esperava-se que este dossiê fosse negociado em segunda leitura, dentro de um prazo mutuamente acordado", escreveu Elissavet Vozemberg-Vrionidi, a 29 de abril.
Maioria dos europeus opõem-se a novo regulamento
Sérgio Humberto, do PSD, adianta que o entendimento dos sociais-democratas é continuar a defender as três horas de atraso dos voos como limite mínimo para os passageiros serem indemnizados. Sobre potenciais impactos da eventual legislação no turismo português, o eurodeputado afirma ser necessário atrair investimento e projetar Portugal como um "destino de qualidade e atrativo para todos".
Um estudo da AirAdvisor, empresa de gestão de reclamações na área da aviação, aponta que 92% dos europeus se opõem à revisão do regulamento sobre os direitos dos passageiros. A mesma empresa estima que sejam excluídos até 75% dos casos de cancelamento e atrasos de voos atualmente cobertos por indemnizações.