São 28 andares de habitação, 90 metros de altura, 286 apartamentos, 200 garagens, mais de mil moradores no verão. Quem vive no Edifício Nova Póvoa, na Póvoa de Varzim, diz que é como habitar numa "minicidade, mas em altura". A dois passos do mar e com uma vista de cortar a respiração. O JN Urbano mostra-lhe como é viver neste "mundo" residencial.
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O"orgulho" de viver no prédio de habitação mais alto da Península Ibérica era, nos anos 80, slogan de vendas. O edifício Nova Póvoa é, ainda hoje, a imagem de marca do "boom" da construção na Póvoa de Varzim, da cidade que crescia "em altura", cosmopolita, urbana, na moda. No verão, com o mar aos pés, vivem ali mais de mil pessoas, naquela que é, ainda hoje, a maior "aldeia em altura" do país, com o triplo dos moradores de freguesias vizinhas como Parada ou Outeiro Maior. No inverno, são pouco mais de 200. É o espelho de uma cidade turística que ainda vive muito a duas velocidades, dependente do sol e do mar.
Para Jorge Fernando Silva, o Nova Póvoa - ou prédio de 28 andares, como é por ali mais conhecido - não tem segredos. Vem buscar-nos à porta, ansioso por contar tudo. O "gigante" é "casa e família" há 41 anos. Começou ali, ainda na construção do edifício, como manobrador de gruas, numa altura em que trocou "as obras" por um emprego incerto, aos fins de semana, a servir francesinhas, no mítico Guarda-Sol.
A construção começou em 1973 e foi "um filme": ora não havia ferro, ora faltava betão, faliu o empreiteiro, mudou-se o projeto, a Póvoa foi elevada a cidade, veio a Revolução, a Câmara mudou seis vezes de mãos e, entre avanços e recuos, os primeiros moradores entraram em 1982, ainda com o prédio a ser erguido. Jorge fez parte da equipa que acabou as obras. Ficou como porteiro.
A fama das propriedades curativas do mar da Póvoa
Naquela época, o edifício era "notícia" e dividia opiniões: uns chamavam-lhe o "monstro" devido ao volume excessivo para a primeira linha de mar; outros viam nele a afirmação de uma Póvoa moderna. Por ali, no verão, a cidade enchia-se de gente. A fama das propriedades curativas do mar da Póvoa, rico em iodo, vinha de longe, do tempo em que, no início do século XX, os "banhos quentes" traziam à cidade gente de todo o interior do país. A moda foi pegando e, de Chaves a Guimarães, da Régua a Viseu, de Santo Tirso, da Trofa, de Barcelos ou do Vale do Sousa encontrava-se de tudo. O Nova Póvoa reflete essa realidade.
"Este é de um casal da Régua. Aquele, de uma família de Guimarães. Estes estão na França", explica Jorge, apontando as portas, à medida que avança pelo amplo corredor. Conhece todos os moradores pelo nome, a história de cada um, os que entram e os que saem. Para ele, o Nova Póvoa não tem segredos. Caminha sem pressas, que os 73 anos já não lhe permitem correrias. O prédio é grande e, "baixo e cima", "faz-se muitos quilómetros". Ele é o "faz-tudo": muda vidros e lâmpadas, é porteiro, recebe correio e encomendas, desencrava elevadores, trata dos pequenos incidentes, da segurança e da limpeza.
Não tenho pai, não tenho mãe, não tenho irmãos, esta gente é a minha família
"Não tenho pai, não tenho mãe, não tenho irmãos, esta gente é a minha família", diz, sem hesitar. "A mulher reclama, mas não há volta a dar", frisa, sorrindo. Viveu ali, na casa do porteiro, no rés do chão do Nova Póvoa, com 28 andares à cabeça, durante mais de 30 anos. Há um ano, decidiu ir para o seu "cantinho", mas, confessa, é ali que continua a sentir-se em casa.
Em 41 anos, coleciona peripécias do "gigante", como naquele dia em que, às sete da manhã, encontrou um morador, controlador de tráfego aéreo, a dormir no elevador, que encravou entre pisos já depois da meia-noite; ou daquela vez em que, suspeitando de uma fuga de gás e, no meio da atrapalhação, um morador se enganou no andar e arrombou a porta do vizinho de baixo. No Nova Póvoa, explica, há gente de todas as classes sociais, de várias idades e proveniências geográficas e até de religiões diferentes.
"Há dias, estacionou aqui à porta um autocarro da Bélgica. Vi uma senhora, com um chapéu, a recolher dinheiro. Depois, veio aqui e queria pagar para eu os deixar subir. Não aceitei o dinheiro, mas subi com eles ao terraço", conta Jorge. A situação não é "virgem". Ali, no topo da Póvoa, a vista é de cortar a respiração. "Vê-se Leça e a Afurada para um lado, as torres de Ofir e Viana para o outro e, se o céu estiver muito limpo, é possível ver o Monte de Santa Tecla na Galiza. O pôr do sol aqui é magnífico!", diz o administrador do condomínio, Lopes Machado.
Cada piso tem dez frações
A vista e a localização seduziram, há 17 anos, António Salgado. Natural de Guimarães, diz que o sítio é "pacato" e só no verão há por ali muito movimento. De resto, garante, "nem se sente" que ali mora tanta gente: "os corredores e as áreas comuns são amplos, há cinco elevadores... não é nada confuso", explica o morador. Uma coisa é certa: sempre que alguém lá vai a casa, é fácil explicar. O prédio vê-se logo à entrada da cidade e, por ali, goste-se ou não, todos o conhecem.
O edifício Nova Póvoa é o prédio com mais habitantes em Portugal. O estudo recente é da Urbiwise, que analisou mais de seis milhões de moradas e 650 mil imóveis no país. O prédio foi construído entre 1973 e 1982, com projeto do arquiteto Carlos Garcia, depois de muita discussão em torno dos seus 28 andares e dos seus 90 metros de altura, erguidos ali a 50 metros do mar, na Avenida Repatriamento dos Poveiros, a 200 metros da Praça de Touros e do campo do Varzim SC. Cada piso tem 10 frações (à exceção do rés do chão com seis), nove T2 e um T1. É o nono prédio mais alto do país, numa lista liderada pelas torres Vasco da Gama (Lisboa) e de Monsanto (Oeiras)
