Longas filas de espera, desacatos e pessoas a dormir à entrada das conservatórias centrais são alguns dos relatos de quem, ao longo dos últimos dias, procurou conseguir senhas para ser atendido e tratar dos processos de naturalização, antes da entrada em vigor das alterações a 1 de setembro à lei da nacionalidade. O Sindicato Nacional dos Registos e Notariado diz que a razão dos atrasos deve-se a "falta de recursos humanos" para tratar de processos.
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A alteração à lei da nacionalidade portuguesa vai pôr fim ao estatuto de descendente de judeu sefardita, o que levou a um aumento exponencial da afluência às conservatórias. Esta subida no número de pedidos, aliada à greve decretada pelo Sindicato Nacional dos Registos (SNR), que decorreu todas as segundas e sextas-feiras do mês de agosto, têm gerado longas filas e até desacatos na Conservatória do Registo Central de Lisboa e no Arquivo Central do Porto.
As testemunhas relatam episódios de agressões na fila de espera, desacatos com moradores, pessoas e advogados a dormirem à porta das instalações para conseguirem obter as poucas senhas disponíveis, situações que são igualmente confirmadas pelo SNR.
Richard Santos, advogado, esteve esta terça-feira de manhã na Conservatória dos Registos Centrais em Lisboa e foi testemunha de alguns episódios de agressões, confusões e desacatos durante este período de maior afluência e lamenta a falta de atenção da Ordem dos Advogados a este assunto.
Culpabiliza ainda a falta de eficácia dos postos de atendimento rápido, criados pelo Governo para dar resposta ao maior número de pedidos dos últimos dias. Estes postos, explica Rui Rodrigues, presidente do SNR, apenas diferem dos postos de atendimento normais porque permitem entregar a documentação em papel, sem esperar por dar entrada no sistema informático.
No entanto, estes processos não conseguem dar entrada no sistema online por falta de recursos humanos, impedindo as pessoas de terem acesso à senha digital que lhes permite aceder ao processo. A obtenção desta senha no momento, só se consegue caso o processo seja submetido presencialmente nos postos de atendimento regular.
Um outro advogado, que preferiu não ser citado, afirma que "é inútil escolher outra conservatória para dar entrada no processo, dado que todos são remetidos para a Conservatória dos Registos Centrais, ou para o Arquivo Central do Porto, levando inevitavelmente a constrangimentos" e acredita que "por este andar e quantidade, alguns processos levarão anos a estar concluídos".
Várias pessoas presentes nas filas - algumas desde madrugada ou até mesmo do dia anterior - queixavam-se de falta de informação, dificuldade em conseguir acesso a senhas (limitadas e rapidamente esgotadas) e faziam acusações de má gestão do processo de abertura de postos de atendimento rápido.
Rui Rodrigues, presidente do SNR, atribui as dificuldades no atendimento "à falta de tempo e recursos humanos para inserir os processos no sistema online".
Cerca de 3 mil submissões diárias
O JN apurou que diariamente dão entrada nas conservatórias cerca de 3 mil processos de naturalização e contam-se mais de 100 mil os que estão pendentes de aprovação.
Apesar da crise vivenciada na Conservatória dos Registos Centrais em Lisboa e no Arquivo Central do Porto, o secretário de Estado da Justiça Pedro Tavares anunciou ontem, segunda-feira, a abertura da Plataforma da Justiça a partir do mês de setembro a pedidos de nacionalidade submetidos online. De acordo com a Secretaria de Estado, o alargamento das funções da plataforma visa "aliviar a pressão do atendimento presencial no momento da submissão do pedido" e "aumentar a celeridade no tratamento e tramitação dos processos associados a esta dimensão registal".
Recorde-se que a alteração à lei da nacionalidade para descendentes de judeus sefarditas entra em vigor no dia 1 de setembro, altura em que se espera que a situação nas conservatórias regresse ao habitual.