Os deputados do Parlamento Europeu vão votar, na próxima terça-feira, uma proposta de resolução que extingue o atual regime de "vistos gold" em todos os países da União Europeia e transforma-o numa autorização de residência com controlos muito apertados. O impacto em Portugal vai ser maior do que nos restantes Estados-membros, uma vez que este é o país que mais lucra com o regime.
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A proposta de resolução prevê que a troca de autorizações de residência por investimento (vistos gold) passe a funcionar com um regime de quotas máximo que reduza gradualmente, "atingindo zero em 2025". Prevê ainda a criação de um regulamento que fiscaliza todos os requerentes a vários níveis, desde a origem do dinheiro ao registo criminal, proibindo-se a extensão do visto aos familiares.
Se a proposta for aprovada, cada visto tem de ser validado por todos os Estados-membros e, caso o seja, o requerente tem de prestar informação semestral que pode implicar "visitas 'in situ' no domicílio das pessoas em causa", propõem.
O investimento no imobiliário, em fundos de investimento, fundos fiduciários, obrigações do Estado ou pagamentos diretos ao orçamento do Estado-membro "devem limitar-se a uma pequena parte do montante investido", dizem ainda. Já o lucro de cada país também passa a ser repartido com os restantes numa "percentagem significativa" a definir. Os intermediários terão de ser legalizados e passarão por processos de certificação onde se inclui a verificação de antecedentes e a proibição de práticas comerciais.
Lucros vs riscos
Os subscritores da proposta entendem que "a cidadania europeia não é um bem que possa ser comercializado ou vendido" e, embora reconheçam que o regime já rendeu 21,4 mil milhões de euros à UE, os prejuízos são maiores que os lucros.
Em causa estão "riscos de corrupção, branqueamento de capitais, ameaças à segurança, evasão fiscal, desequilíbrios macroeconómicos, pressão sobre o setor imobiliário - que reduz o acesso à habitação - e erosão da integridade do mercado interno", apontam.
O caso português é usado como exemplo no relatório que acompanha a proposta. Portugal foi o país que mais lucrou com os vistos gold, mas este regime "tem sido apontado como potenciador de desigualdades entre o poder de compra interno e externo no mercado do centro histórico de Lisboa", refere o Gabinete de Estudos do Parlamento Europeu.
Para além disso, são citados dois casos de corrupção e um deles é português. Trata-se do julgamento que levou à demissão, em 2014, do ministro da Administração Interna, Miguel Macedo. O social-democrata acabou absolvido, mas foram condenados dois cidadãos chineses, mais o ex-presidente do Instituto de Registo e Notariado e a ex-secretária-geral do Ministério da Justiça, por corrupção. O outro caso foi na Grécia.
A discussão do fim dos vistos gold acontece em Estrasburgo esta segunda-feira e, no dia seguinte, é votada. Se for aprovada, segue para a Comissão Europeia adotar ou rejeitar, sendo que a rejeição tem de ser justificada. Se for adotada, cada país tem de repercutir a decisão na respetiva lei nacional.
Votos portugueses
Na comissão especializada, a proposta teve 61 votos a favor, três contra e cinco abstenções. Nuno Melo votou a favor e Paulo Rangel absteve-se. Com exceção da abstenção do social-democrata, todas as abstenções e votos contra foram da ID, de extrema-direita.
Recorde-se que os milionários e oligarcas russos conotados com o regime de Vladimir Putin estão proibidos de aceder aos vistos gold na UE desde a terceira vaga de sanções.
Na UE, há 12 países que trocam residência por investimento: Bulgária, Chipre, Estónia, Grécia, Irlanda, Itália, Letónia, Luxemburgo, Malta, Países Baixos, Portugal e Espanha. O regime de "venda" de cidadania é ainda praticado na Bulgária, Chipre e Malta.