O Parlamento saudou, esta quarta-feira, a criação de NUTS II e III [Nomenclatura das Unidades Territoriais para Fins Estatísticos] na península de Setúbal, com os partidos a concordarem que a decisão permitirá à região ser analisada de forma separada de Lisboa e, desse modo, receber mais fundos europeus. Ainda assim, o Governo ouviu críticas, da Esquerda à Direita, por só agora tomar esta medida. PSD e Chega lamentaram que autarcas não tenham sido ouvidos.
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"É uma questão de justiça voltarmos a ter estatísticas para a península de Setúbal", afirmou a ministra da Coesão Territorial, Ana Abrunhosa, no Parlamento. A governante frisou que a gestão do território em causa só pode ser feita com recurso a estatística, e nunca com base em "percepções".
"Só com dados é que podemos planear e fazer políticas públicas", reforçou Ana Abrunhosa. Na base da alteração administrativa estiveram as disparidades socio-económicas entre as regiões de Setúbal e Lisboa; encontrando-se, até aqui, integrada na NUT II da Área Metropolitana de Lisboa (AML) - onde se concentra maior riqueza -, a região sadina saía prejudicada no acesso aos fundos europeus.
Nuno Carvalho, do PSD, frisou que a "injustiça" que se verificava em Setúbal foi "finalmente" corrigida, embora tenha lamentado que os primeiros fundos atribuídos tendo em conta a nova realidade só cheguem em 2027. A ministra recordou que foi o último Governo PSD/CDS que, em 2013, integrou Setúbal na AML, com Nuno Carvalho a responder que o PS governou "muito mais tempo" com essa lei sem decidir alterá-la (sete anos contra dois do PSD).
Também Joana Cordeiro, da IL, saudou o culminar de um processo de "avanços e recuos". A parlamentar disse ver "com agrado" que Setúbal "se possa finalmente emancipar" da AML, pondo assim fim a um modo de organização territorial que só servia para "esconder a realidade" da região. Ainda assim, considerou que o processo legislativo foi "apressado".
Paula Santos, do PCP, sustentou que, embora a "responsabilidade" pelo fim das NUT de Setúbal tenha sido do PSD, o PS passou sete anos sem "vontade política" para implementar esta mudança, tendo-o feito agora "à pressa". "Se estamos a fazer hoje este debate foi graças à mobilização da região", frisou, alertando que as "grandes disparidades" entre concelhos também existem na margem Norte do Tejo.
Joana Mortágua, do BE, lembrou que, em 2017, o primeiro-ministro "não se comprometeu" a transmitir a Bruxelas a necessidade da mudança em Setúbal. A bloquista frisou que o então ministro das Infraestruturas, Pedro Marques, disse que as regras europeias tornavam essa alteração "impossível", tendo sido desmentido" pela socialista Elisa Ferreira. "Não é certamente o PS que está de parabéns" após "tantos avanços e recuos", referiu.
Além da alteração da península de Setúbal, o Governo também criará uma nova NUT II de Oeste e Vale do Tejo e novas NUT II e III da Grande Lisboa. Os municípios de Vila de Rei e Sertâ passarão do Médio Tejo para a Beira Baixa (NUT III).
"Regionalização por decreto"
Bruno Nunes, do Chega, acusou o Governo de querer fazer uma "regionalização por decreto". O deputado citou uma nota técnica dos serviços do Parlamento que dá conta de que o diploma do Executivo "não cumpre" as normas necessárias. Assim sendo, "nem sequer devia estar aqui a ser votado", defendeu.
Bruno Nunes alertou que, embora fosse "obrigatório" ouvir a Associação de Municípios (ANMP), esta "não disse absolutamente nada" sobre o tema. Alegou que está a ser dado um "pontapé na legislação", acusando o PS de querer criar "uma trapalhada a nível administrativo".
Luís Gomes, do PSD, também afirmou que o procedimento legislativo "passa por cima" do que está estipulado, uma vez que "não faz sentido não ouvir" a ANMP ou a Anafre. Disse ter recebido uma carta do autarca de Vila de Rei onde este dava conta da sua "incredulidade" por não ter sido ouvido no processo que envolveu o seu município.
Para Luís Gomes, existiu uma "violação" do princípio constitucional da autonomia do poder local. "Não nos habituamos à falta de diálogo", frisou o deputado social-democrata. A liberal Joana Cordeiro lamentou igualmente a ausência de "qualquer parecer de várias entidades".
PAN e Livre mostraram-se favoráveis ao diploma do Governo.