"Os aviadores, de triunfo em triunfo, chegaram ao Rio de Janeiro. Viva Portugal! Viva a Patria!", titulava o JN a 18 de junho de 1922. Um dia antes, Gago Coutinho e Sacadura Cabral tinham concluído a primeira travessia aérea do Atlântico Sul, iniciada três meses antes. Logo abaixo do título apoteótico, lia-se um resumo não menos flamejante: "Na capital do Brazil houve alegria traduzida em pranto. Os portuguezes com saudades da sua Patria e cheios de orgulho da raça abraçavam-se, choravam".
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Os dois oficiais da Marinha que, pela primeira vez na História, cruzaram os ares entre Portugal e o Brasil, foram elevados à condição de semideuses nessa edição do jornal. O JN descreveu-os como "gloriosos aviadores" que alcançaram um "feito gigantesco" e se "imortalisaram", "herois" que usaram o seu "génio" para assegurarem a "continuidade moral das descobertas" e "gigantes que teem a estatura dos herois de Homero ou de Camões".
Doze anos depois da implantação da República e quatro após o fim da Primeira Guerra, o JN quase implorava que este feito da aviação não fosse uma "expressão isolada de heroísmo", mas sim prenúncio de um "movimento colectivo de nobre e poderoso alcance moral": "Este belo acto de audácia será porventura o reacender de novas energias que nos ajudarão a erguer do abatimento e do marasmo em que nos encontramos", lia-se. O país estava, então, a menos de quatro anos da instauração da ditadura militar, antecâmara do salazarismo.
As páginas desta edição não estão totalmente percetíveis, o que impede de ler o relato das primeiras celebrações ocorridas em Lisboa e Porto. Mas o número de dia 20 dava conta de que o clima de festa continuava: sob o título "Por toda a parte os nomes dos aviadores são aclamados", o JN escrevia que "Portugal compreendeu, como o Brazil, a grandeza do momento histórico que passa". Como tal, a população "entôa hinos de amor" em "todos os cantinhos da nossa terra abençoada".
No Porto, a população passou dois dias "a manifestar-se com o maior júbilo". Havia "profusas iluminações por toda a parte" e, logo no dia 18, "de manhã cedo, os morteiros retumbaram festivamente". Depois, rebentaram-se foguetes "pelo dia adeante, dum ponto a outro da cidade".
Por toda a Invicta, "pares dançavam, pernas entrançadas, rodinhas, namoricos. Era a alma popular, o sangue impenitente da raça a pular, a fazer das suas", escrevia o JN. Em Lisboa, as ruas da Baixa também estavam, por aqueles dias, "apinhadas de povo", que se manifestava "estralejando frequentemente os foguetes e os morteiros".