O questionário que os futuros membros do Governo terão de preencher é criticado pelas associações Integridade e Transparência e Frente Cívica, com a primeira a avisar que põe em risco os poderes do presidente da República, e a segunda a denunciar uma "alienação de responsabilidades", defendendo um escrutínio prévio ao convite.
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Questionado pelo JN sobre o mecanismo que inclui um questionário de 36 perguntas e uma declaração de compromisso de honra, Nuno Cunha Rolo, presidente da Integridade e Transparência, alertou para uma eventual "violação da separação de poderes".
"Deveria ser público"
A seu ver, há o "risco de ampliação e de diminuição dos poderes" de Belém. No primeiro caso, Nuno Cunha Rolo afirma que se "amplia a responsabilidade e capacidade de avaliação do presidente da República". "Por outro lado, a haver essa corresponsabilização, como fica a responsabilidade política do Governo perante" Belém?, questiona ainda.
O presidente da Integridade e Transparência defende que o teor do questionário "deveria ser público", pelo risco que representa para Belém. Porque o presidente da República terá conhecimento das respostas, teme uma "desresponsabilização do primeiro-ministro".
"Só vai ser do conhecimento de dois órgãos de soberania. Supostamente, tem de haver separação de poderes", referiu Nuno Cunha Rolo, recordando que "só nos sistemas presidencialistas é que o presidente escolhe os governantes".
Apesar de considerar que qualquer instrumento que reforce o escrutínio "é positivo", diz que "esta medida deveria ser mais estruturada e estudada" e que falta saber "quem vai guardar as respostas e onde". O questionário é também sobre o agregado familiar de quem é convidado para o Governo.
Por sua vez, Paulo Morais, presidente da Frente Cívica, garante que "o questionário não resolve nenhum dos problemas que o Governo tem vindo a ter", como os casos envolvendo Miguel Alves, Carla Alves e Alexandra Reis, entre outros.
"Fingia não saber"
"O problema não era o que o Governo não sabia, mas o que não queria saber" ou "fingia" desconhecer, disse Paulo Morais ao JN. Perante este novo mecanismo, agora "o problema é o que se faz com a informação" recolhida no questionário.
O presidente da Frente Cívica destaca que algumas questões já têm resposta com o atual procedimento, desde logo a entrega da declaração no Tribunal Constitucional. Por outro lado, "aquelas que não são hoje respondidas", e constarão do novo questionário, "não fazem sentido" porque "devem ser esclarecidas previamente ao convite" e não pelos futuros membros do Executivo.
Paulo Morais insiste ainda numa alteração da lei das incompatibilidades que garanta a anulação dos despachos relativos à empresa que contrate o governante antes de passarem três anos.
Politóloga diz que é começar casa pelo telhado
A politóloga Susana Coroado, que já presidiu à Integridade e Transparência, vê com bons olhos "a preocupação do Governo em tentar melhorar a qualidade" da equipa. Mas duvida que esta seja a solução porque "é começar a casa pelo telhado".
Susana Coroado crê que o problema do Executivo não foi falta de informação, que já existia, mas sim "subestimar o seu impacto na opinião pública".
"Não se sabe muito bem o que vai fazer com esta informação", questiona agora, avisando que, por si só, o questionário "resolverá muito pouco". Do mesmo modo, concorda que esta poderá ser uma tentativa de "desresponsabilização" por parte do primeiro-ministro.