Milhares de provas estão pendentes. Governo muda regras para facilitar revalidação de títulos anteriores a 2008.
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Há condutores à espera longos meses para poder fazer a prática que lhes permitirá renovar a carta de condução. De acordo com a lei, quem deixou passar mais de dois anos da data de validade tem de se sujeitar a exame. Há milhares a conduzir com o título caducado e milhares foram multados. O Governo começou por tentar resolver o problema com campanhas de sensibilização. Agora, face à dificuldade em dar resposta, anunciou que haverá um novo regime extraordinário que deixa cair a exigência de exame.
Magda Canas, especialista em assuntos jurídicos da DecoProteste, diz que "muitas pessoas não conhecem os procedimentos". A associação tem registo de condutores que iniciaram a revalidação e esbarraram numa longa espera: um dos casos esperou dois anos para realizar a prova prática, em Lisboa, num centro do Instituto da Mobilidade e dos Transportes (IMT).
Já o presidente da Associação Nacional de Escolas de Condução Automóvel (ANIECA) fala numa espera de "oito meses" para fazer a prova prática em centros públicos de exames em concelhos como Faro e Beja. Que aumenta para "14 meses", caso o condutor reprove no primeiro exame prático.
Chumba e pode conduzir
A 1 de junho, de acordo com o site do IMT, havia 7626 provas práticas pendentes, onde se incluem os novos condutores, os que vão fazer a renovação da carta e as trocas de títulos estrangeiros. O Porto tem mais provas práticas pendentes (1135) do que Lisboa (325). E Beja (833) e Faro (738) têm uma lista de espera maior do que a capital.
Os condutores com processos de revalidação podem continuar a circular nas estradas com uma guia emitida pelo IMT, sujeita a renovação nos balcões.
5113 condutores foram autuados entre 1 de janeiro de 2022 e 2 de novembro do mesmo ano por conduzirem com a carta caducada, de acordo com a Autoridade Nacional da Segurança Rodoviária (ANSR).
O presidente do Automóvel Club de Portugal (ACP) contrapõe e diz que a marcação dos exames é "rápida", mas deixa críticas às revalidações: "É um ato meramente administrativo para dar dinheiro aos cofres do Estado". Para Carlos Barbosa, os exames médicos requeridos na renovação deviam ser mais exigentes e pedidos mais cedo, não apenas a partir dos 60 anos.
António Reis, da ANIECA, refere que a espera nos centros públicos de exames não ocorre nos privados: entre 15 dias a um mês, a prova fica marcada. O JN tem conhecimento do caso de um condutor que, após se ter esquecido durante três anos e meio da revalidação aos 60, foi a exame. Chumbou e esperou "meses" pela segunda prova. Mesmo não tendo passado, possuía uma guia com validade de dois anos, para poder conduzir.
A 1 de junho, o Governo aprovou em Conselho de Ministros um regime extraordinário que vai dispensar a realização de prova prática a quem deixou passar a validade da carta em mais de dois anos. No entanto, não revelou pormenores. O Ministério das Infraestruturas e o IMT remetem esclarecimentos para quando o diploma for publicado em "Diário da República", deixando em expectativa as escolas de condução.
"Muitos problemas"
Sabe-se que o regime vai aplicar-se às cartas de condução emitidas antes de 1 de janeiro de 2008. No entanto, quem ficou habilitado a conduzir entre aquela data e 2 de janeiro de 2013 tem "muitos problemas", diz Magda Canas. Acresce que a data de validade no verso da carta não é a "verdadeira" [ler explicador ao lado].
António Reis, que admite ter recebido um volume de dúvidas "fora do normal", desde o anúncio do diploma, afirma estar "preocupado" com os condutores que iniciaram a renovação, chumbaram no primeiro exame e já pediram a marcação do segundo: "Temo que não sejam abrangidos". Para o presidente da ANIECA, o novo diploma poderá pôr em causa a "igualdade de oportunidades" de quem tentou cumprir a lei.
Caso
Recebeu carta em casa, apesar de diploma não estar em vigor
Apesar de o novo diploma ainda não ter sido publicado nem estar em vigor, já há condutores a ser informados em balcões do IMT de que estão dispensados de fazer a prova prática e, inclusive, receberam a carta. O JN tem conhecimento do caso de um condutor de 52 anos que, após ter confundido os prazos, se apercebeu que devia ter renovado a carta aos 50. Apesar de ser de Sintra, dirigiu-se ao IMT de Santarém para fugir à afluência no balcão de Lisboa. Constatou que tinha de fazer exame e, desde o final de 2022 e até maio, conduziu com uma guia. A 23 de maio, voltou a Santarém para renovar a guia, mas foi informado de que não precisava de fazer o exame prático e a carta ser-lhe-ia enviada. O documento chegou a 5 de junho. Gastou cerca de 105 euros: 30 da renovação, 30 da inscrição para o exame, 15 de emissão da carta e 30 no atestado médico. Por impossibilidade de ter uma consulta com o médico de família, o condutor foi a uma escola de condução com serviço médico. O IMT já lhe disse que irá restituir o valor do exame prático, mas ao JN não comentou o caso.