Empresas e autarquias desconhecem prazos para vigorar contraordenações e pedem moratória. AHRESP teme que autoridades não saibam o que punir.
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O Governo leva seis meses de atraso na criação de campanhas de sensibilização junto dos fumadores e na implementação dos apoios a que estava obrigado a conceder para a adaptação de empresas e autarquias à lei que proíbe as pontas de cigarros no chão. As contraordenações, que chegam a 250 euros e estiveram suspensas no último ano, entram em vigor na sexta-feira, com comerciantes e autarcas a desconhecerem ainda os prazos e as regras.
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Apesar do apelo de vários setores por uma nova moratória da lei, que teve origem numa iniciativa do PAN, o Governo descarta essa possibilidade e acena com 100 mil euros para fazer o que estava obrigado.
Terminaram a 29 de fevereiro os 180 dias que o Ministério do Ambiente tinha para criar o sistema de incentivos, através do Fundo Ambiental, que se destinaria ao comércio, autarquias, empresas de transportes públicos e outras instituições, como universidades. O fundo teria ainda de, com as tabaqueiras, sensibilizar os fumadores.
Ao JN, o Ministério do Ambiente adiantou que estão a ser "preparados o aviso e protocolos" para criar uma linha de 40 mil euros de incentivos e um "prémio de design" , de 60 mil euros, para soluções de "deposição e reciclagem" de tabaco. Mas estes valores podem revelar-se extremamente baixos para as necessidades. Só a Junta de Freguesia do Torrão, em Alcácer do Sal, pagou, há 15 dias, "1500 euros por seis beateiras", revelou Hélder Moutinho, presidente daquela autarquia.
O Ministério do Ambiente assegurou ainda, ao JN, "não ter conhecimento de que esteja a ser ponderada uma prorrogação do prazo de entrada" das sanções.
Segundo Ana Jacinto, secretária-geral da AHRESP - associação da hotelaria, restauração, esta é uma "lei fechada à pressa em 2019, que previa campanhas nunca desenvolvidas". "Questionámos o Governo sobre a aplicação da lei em situações concretas e não houve respostas. Tememos que nem as próprias autoridades saibam o que fiscalizar. Quando parte da restauração e hotelaria equaciona processos de insolvência devido à crise, deveria adiar-se o prazo como se fez com a lei dos plásticos descartáveis", disse.
Há apelos semelhantes. Pela ACIP - Associação do Comércio e da Indústria de Panificação, Pastelaria, o vice-presidente, Luís Gonçalves, admitiu, ao JN, "desconhecer os prazos" e não contar com beateiras no seu espaço. Joel Azevedo, líder da Associação de Comerciantes do Porto, falou num "enorme desconhecimento geral, tendo em conta as preocupações com a crise".
Nas autarquias, o cenário não é diferente. Jorge Veloso, presidente da Associação Nacional de Freguesias, reconheceu que "as finanças do poder local estão muito debilitadas para agora poder comprar beateiras". "Admito que nem sabia que na sexta-feira avançam as contraordenações e que não tenho dinheiro para adaptar uma freguesia de 25 quilómetros quadrados à lei", disse o autarca.
Detalhes
Corrida às compras
O JN identificou junto de vários produtores de beateiras e cinzeiros uma corrida à compra destes materiais nos últimos dias. "Em relação ao mês anterior, não tem comparação", revelou Domingos de Carvalho, CEO da Polinnovate, uma das mais procuradas.
PAN recusar adiar
O PAN está contra o adiamento das contraordenações e critica os empresários e autarquias por "não aproveitarem um ano para se adaptar". "O Governo falhou nos prazos do que lhe cabia. Mas os serviços jurídicos dessas associações comerciais e de autarcas não fizeram o que lhes competia: informar e sensibilizar", disse, ao JN, André Silva, porta-voz do PAN.
Perguntas e respostas
O que dita a lei a partir de 4 de setembro?
Após um ano de vigência da legislação, começam a ser aplicadas as contraordenações a quem atirar beatas para o chão e aos estabelecimentos e empresas de vários setores que não contem com beateiras e que não limpem as áreas que ocupam - até um raio de cinco metros de influência.
Qual é o valor das contraordenações?
Quer para fumadores, quer para empresas, autarquias e instituições, as multas começam nos 25 euros e vão até aos 250 euros. Cabe à ASAE e às autoridades policiais aplicar a lei e receber 20% das coimas. Os processos são instruídos pelas Câmaras e ASAE, que dividirão a receita de 30% das coimas.
Qual a queixa das empresas e autarquias?
Como a lei exige que sejam colocados cinzeiros e recipientes próprios só para as beatas, "nomeadamente recetáculos com tampas basculantes", lamentam não ter havido um apoio do Estado a essa aquisição. O Governo deveria ter criado uma linha de financiamento mas ainda não saiu do papel.