O Governo apresentou esta quinta-feira as alterações ao Código do Trabalho “que vão fazer correr muita tinta”, anteviu o ministro Leitão Amaro, dado que incluem o aumento do prazo máximo dos contratos a termo para três anos, o alargamento dos serviços mínimos da greve, ou o regresso do outsourcing após despedimentos.
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O anteprojeto aprovado de manhã em Conselho de Ministros e apresentado à tarde aos parceiros da Concertação Social altera mais de 100 vezes o Código do Trabalho. É uma reforma “indispensável”, classificou a ministra do Trabalho, Rosário da Palma Ramalho, e o documento é só “um ponto de partida” para as negociações que vão decorrer nos próximos meses.
Na proposta do Governo consta a novidade de alteração aos prazos dos contratos a termo certo. Até agora havia o limite de dois anos, incluindo renovações, para um trabalhador permanecer neste regime. Agora, o Governo quer aumentar para três anos. Além disso, o primeiro contrato pode ser de um ano e não apenas de seis meses. Por fim, o limite máximo dos contratos a termo incerto passa de quatro para cinco anos.
Outra alteração relevante está na lei que regula o direito à greve. O Governo quer que os serviços mínimos sejam alargados aos setores de apoio a crianças, idosos, doentes e deficientes. “Não está ainda definido” se as escolas são abrangidas por este alargamento, frisou a ministra.
Como comprar férias
Especificamente no que respeita aos serviços mínimos, Rosário da Palma Ramalho frisou que a ideia é “ser um bocadinho mais exigente quanto à definição dos serviços mínimos, mas sem riscar o direito à greve”, e tornando-o “apenas combatível com outros direitos fundamentais”, nomeadamente o direito à saúde, ao trabalho ou “a circular”.
Confirma-se ainda o fim dos limites ao outsourcing. O Governo de António Costa criou uma proibição de recurso a trabalhadores externos durante 12 meses para empresas que despedem funcionários e, agora, a proibição deverá ser revogada. “Era uma medida desproporcional que prejudicou a competitividade económica”, disse a ministra.
O tema divide profundamente patrões e sindicatos, pois os primeiros queriam alterações à legislação e os segundos defendem a proibição.
No pacote legislativo consta também a possibilidade dos trabalhadores comprarem dois dias de férias. Na prática, trata-se de faltar ao trabalho “dois dias antes ou depois do período normal de férias, com perda de retribuição, mas sem perda de mais regalias”, explicou a ministra. Estes dois dias serão considerados faltas justificadas. Porém, é pouco provável que o mecanismo possa ser aplicado este ano, dada a natural demora do processo legislativo e de concertação social.
Para favorecer a negociação coletiva, o Governo quer também reduzir a necessidade de publicação de portarias de extensão.
Patrões aplaudem mas sindicatos e Esquerda criticam
A proposta de reforma da legislação laboral apresentada esta quinta-feira pelo Governo foi recebida com elogios das confederações patronais e com críticas dos sindicatos representantes dos trabalhadores. No Parlamento, a Esquerda criticou a intenção, com o PS a acusar o Governo de trazer de volta a agenda da troika.
À saída da reunião da Concertação Social, todos ressalvaram que o anteprojeto aprovado pelo Governo é extenso e precisa de análise. Ainda assim, as confederações patronais estavam inclinadas a aplaudir as medidas. “É uma boa base para a negociação”, disse ao JN João Vieira Lopes, presidente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal.
Para Armindo Monteiro, presidente da Confederação Empresarial de Portugal (CIP), “muitas das medidas anunciadas corrigem o mal que tinha sido introduzido” com a Agenda do Trabalho Digno de António Costa. Em particular, acrescentou, põe fim ao impedimento de recurso a outsourcing.
Do lado dos sindicatos, a UGT desconfia da pressa e avisa que a proposta tem medidas que “fragilizam os direitos dos trabalhadores”, referiu Mário Mourão, secretário-geral. O homólogo da CGTP-IN, Tiago Oliveira, é mais duro nas críticas e considera, em declarações ao JN, que se está perante “um ataque total à classe trabalhadora”. Critica, em particular, as mudanças na lei da greve e a compra de dias de trabalho.
De forma incisiva, a Esquerda parlamentar também se insurgiu contra o anteprojeto do Governo. Miguel Cabrita, do PS, foi o mais enfático: “Portugal pode estar a assistir a um recuo de mais de 10 anos e ao regresso da agenda da troika, agora não por necessidade, mas sim por convicção”. O Livre, o PCP e o PAN também criticaram a proposta laboral.