Governo tem de envolver-se no cumprimento da lei do direito à autodeterminação de género
A Federação Nacional dos Professores (Fenprof) apelou esta sexta-feira a que o Governo se envolva nas mudanças necessárias para as escolas cumprirem o direito à autodeterminação de género das crianças e jovens, quando entrar em vigor a regulamentação da lei que se encontra agora nas mãos do presidente da República.
Corpo do artigo
A Fenprof pronunciou-se esta sexta-feira sobre a regulamentação da lei que define as medidas a adotar pelos estabelecimentos de ensino para garantir o direito das crianças e dos jovens à autodeterminação da identidade de género, defendendo que "a concretização de medidas que venham a ser tomadas" não pode "ficar à responsabilidade exclusiva das escolas", criticando que essa seja a norma quando ocorrem mudanças.
A Federação asseverou, por isso, que a aplicação da lei nas escolas "deve contar com o envolvimento empenhado dos responsáveis do Ministério da Educação, o que raramente acontece, nomeadamente quando está em causa o reforço de recursos", pode ler-se num comunicado enviado às redações.
"A Fenprof reconhece a delicadeza deste quadro legal, mas considera importante que a escola não passe ao lado da problemática e que os profissionais da Educação discutam e recebam informação e formação sobre como lidar com a diversidade, seja de que tipo for", advertiu.
Em dezembro, o Parlamento aprovou o projeto de lei, com vista a regulamentar o diploma de 2018, e entre as medidas - embora não obrigue à criação de espaços mistos - exige que todos os alunos tenham acesso a casas de banho e balneários, pelo que cabe às escolas decidir e proceder às adaptações que se considerem necessárias. No entanto, a fatura das obras pode ficar apenas nas mãos das autarquias, responsáveis pelos edifícios.
Cabe agora ao presidente da República dar luz verde ou não o projeto de lei, que deu entrada em Belém no final de dezembro passado, mas a iniciativa tem sido alvo de críticas por parte de organizações de diretores de escolas públicas e privadas, da Confederação Nacional de Pais (Confap) e Federação de professores de Educação Física (Cnapef) que consideram que a lei pode motivar mais casos de discriminação do que de inclusão e impor uma exigência "desproporcional" às escolas. Apelaram, por isso, ao veto de Belém.
Por outro lado, associações representantes de pais de crianças trans, como a Associação de Pais e Mães pela Liberdade de Orientação Sexual e Identidade de Género (AMPLOS), pediram a Marcelo Rebelo de Sousa que promulgue o diploma para garantir "direitos humanos" nas escolas.
A Frenprof encara a autodeterminação da identidade de género e expressão de género como mais um dos problemas que se vivem na educação em Portugal, atribuindo-o ao "subfinanciamento" e a "políticas que a têm fragilizado, com particular expressão, a escola pública e as condições de trabalho e de carreira dos seus profissionais".
Criar ambientes de sã convivência
"Em Portugal, é sabido que há situações de conflito e bullying nas escolas, que resultam de um inaceitável desrespeito pela identidade de género de alunos e de docentes, quantas vezes calados por vergonha, pela burocracia associada à denúncia ou pela sua inutilidade", alertou a Federação, considerando, por isso, "indispensável que as escolas lidem com estas situações e criem ambientes de sã convivência, promotores de respeito pela diferença".
A Fenprof apelou ainda que se aprofunde a discussão "sobre medidas inclusivas contra a violência e a discriminação, a par da sensibilização, compreensão, aceitação e respeito pela diversidade de género, em contexto escolar e na sociedade em geral".
Perante às críticas que têm vindo a público sobre a nova lei, a Fenprof asseverou também que reduzir a questão às casas de banho e balneários "é caricaturá-la e desvalorizá-la", apontando ainda que "misturá-la com resultados menos positivos no âmbito do PISA [Programa Internacional de Avaliação de Alunos] ou das provas de aferição é demagogia". A federação diz ainda compreender que, "por razões ideológicas de natureza distinta (política, religiosa ou outra) haja quem se oponha", relembrando, no entanto, que a regulamentação em causa diz respeito a uma lei que data de agosto de 2018 e que, na altura, deveria ter sido regulamentada no prazo de 180 dias.
Entre outras medidas, a lei prevê que em documentos como o registo biográfico, pautas ou testes, ou nas atividades escolares e extraescolares os alunos trans possam ser chamados pelo nome autoatribuído. As mudanças dependem da vontade expressa pelos pais, encarregados de educação ou representates legais da criança ou jovem.